Aprovação da PEC da Transição não serviu apenas para Lula conseguir atender sua promessa de campanha de retomar benefícios sociais, mas também para mostrar a força do novo governo no Congresso Nacional

Foto: Ricardo Stuckert

Por Mauro Utida

A votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição chegou ao fim na noite desta quarta-feira (21) com a promulgação do projeto pelo Congresso Nacional. No Senado, a PEC foi aprovada com um placar amplamente favorável ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva: 63 votos a favor e apenas 11 contrários, quando eram necessários apenas 49 votos. Mais cedo, a PEC já havia sido analisada na Câmara dos Deputados.

Fruto de um acordo entre lideranças partidárias e representantes do governo eleito, a mudança constitucional permite ao novo governo deixar o valor de R$ 145 bilhões do Orçamento de 2023 de fora do teto de gastos. Esses recursos são para bancar despesas como o Bolsa Família, o Auxílio Gás, a Farmácia Popular e o reajuste da merenda escolar. Com isso, Lula consegue honrar o seu compromisso de campanha para atender a população com os benefícios sociais prometidos.

Assim, a PEC da Transição não serviu apenas para deixar R$ 145 bilhões fora do teto de gastos (R$ 168 bilhões, se contadas as receitas extraordinárias) pelo prazo de um ano – a proposta dos deputados encurta de dois para um ano o prazo de validade da ampliação do teto de gastos – também serviu para mostrar a força do novo governo, diante de um Congresso que, diziam, seria mais conservador e frearia as medidas mais “radicais” dos petistas.

Além da abertura no teto de gastos, o novo governo também deverá apresentar uma nova proposta de âncora fiscal para substituir o teto de gastos a partir de 2023. Esta terá a forma de lei complementar, e não mais de emenda constitucional, como ocorre com o teto de gastos. O prazo para essa proposta também é o prazo de validade da PEC, principal mudança feita pela Câmara.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AC) destacou que a aprovação da PEC é um mecanismo para enfrentar a desigualdade social aprofundada no governo de Jair Bolsonaro (PL). “Temos mais de 60 milhões de brasileiros com insegurança alimentar e 33 milhões passando fome. Isso não pode e nem vai continuar!”.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, lembrou que em 2014 o Brasil saiu do Mapa da Fome das Nações Unidas, mas voltou a figurar no mapa a partir de 2015. Por isso, disse, são importantes iniciativas legislativas com foco no combate à fome e a à miséria.

“Ignorar essas pessoas e as urgências de suas necessidades é, no mínimo, uma falta de humanidade. Por isso é importante ter políticas de amparo aos necessitados e de combate à miséria”, afirmou Pacheco, que assinou a emenda que promulgou a proposta.

Derrota de Lira e do bolsonarismo

A aprovação da PEC da Transição também teve um valor simbólico em retirar o poder do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que foi afetado diretamente por duas decisões do Supremo Tribunal Federal à véspera da votação do projeto na Casa Legislativa: a inconstitucionalidade do orçamento secreto e a decisão do ministro Gilmar Mendes que retirou o Bolsa Família da regra do teto de gastos.

As duas decisões do STF tiraram o poder de barganha de Lira e favoreceram o governo Lula para votar o projeto sem depender das chantagens do cacique do Centrão por ministérios e espaços no futuro governo.

A única resposta que a Câmara conseguiu dar à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que tornou inconstitucional o orçamento secreto, foi aprovar uma mudança no texto-base da PEC que incluiu um artigo para realocar no Orçamento de 2023 os R$ 19,4 bilhões do orçamento secreto. Desse total, R$ 9,85 bilhões serão transferidos para despesas discricionárias do Poder Executivo (RP2) e outros R$ 9,55 bilhões em emendas individuais impositivas do Poder Legislativo (RP6).

Agora, o Congresso tem o compromisso de votar a proposta orçamentária de 2023. O projeto, relatado pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI), deve ser votado na manhã desta quinta-feira (22) na Comissão Mista de Orçamento e, em seguida, pelo plenário do Congresso. Depois disso não há os parlamentares entrarão em recesso.

Com informações da Agência Senado e Congresso em Foco

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