Brasil é essencial para o mundo atingir meta de frear aquecimento global (Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real)

 

Por Miles Lajcák, da Cobertura Colaborativa NINJA na COP26

O título do livro que virou epíteto nacional, muitas vezes perversamente subvertido pela ganância dos capitalistas nacionais que visam a exploração das riquezas naturais e do povo, mais uma vez se faz presente frente os desafios que a humanidade tem que encarar a fim de evitar um cataclisma climático que pode causar sua extinção.

Escrito pelo judeu austríaco Stefan Zweig refugiado dos horrores da Segunda Guerra Mundial em Petrópolis (RJ),o livro “Brasil, Um País do Futuro” narra com o olhar critico e encantado de um imigrante em seus últimos anos de vida, o retrato de um país que mesmo sob o julgo da ditadura fascista do Estado Novo possui um grande potencial humano, natural e harmonioso.

É bem verdade que o livro foi recebido com duras críticas quando publicado, em 1941. Foi acusado de ser ufanista ou mesmo mero objeto de troca diabólica com a ditadura Vargas. Segundo o jornalista e autor do livro “Morte no Paraíso – A tragédia de Stefan Zweig”, Alberto Dines, “País do Futuro pode ser lido como elegia ao potencial humano e econômico do país, mas também como um canto ao nunca, o paraíso, como todos inviável.”.

Oitenta anos depois da publicação de um dos mais famosos escritos sobre o país, o Brasil volta a ser o centro das atenções mundiais durante a COP26.

Quarto maior poluidor do mundo desde 1850 segundo uma pesquisa atualizada da Think Tank International Carbon Brief, põe por terra a velha crença de que apenas países desenvolvidos e industrializados contribuíram para o lançamento de gases do efeito estufa na atmosfera.

Segundo o Observatório do Clima, somente em 2020, durante a pandemia de Covid-19 enquanto as emissões de dióxido de carbono (CO2) caíram 6,7% em todo mundo, o Brasil aumentou em 9,5% as emissões de gases do efeito estufa, o maior número desde 2006 (1,38 milhões de toneladas apenas em 2019).

É verdade que desde os acordos de Paris, assinados na COP21 em 2015, o país vem aumentando a quantidade de emissões na atmosfera em 4,7% ao invés de reduzir como foi acordado em 2015. A grande questão é que o desgoverno negacionista e genocida de Jair Bolsonaro aliado a um congresso e um senado com pautas antiambientalistas e que protegem os grandes latifúndios, a pecuária e o garimpo ilegal, hoje não são apenas ameaças apenas para o próprio Brasil mas o mundo e toda a vida.

O desmatamento é o maior responsável pela grande quantidade de emissões de CO2 do país na atmosfera, assim como a principal preocupação em relação ao Brasil e a Amazônia vistos pela comunidade internacional como pilares vitais para alcançar a meta de manter o aquecimento do planeta abaixo de 2ºC.

Já é sabido e de conhecimento público que um aumento maior que 1,5ºC tornaria diversas áreas do planeta inabitáveis, além de  agravar períodos de seca e provocar ainda mais o acontecimento de eventos climáticos extremos. Tanto a Amazônia quanto as geleiras do Ártico podem derrubar todas as metas de controle climático caso sofram ainda mais degradação ou deixarem de existir. A floresta tropical é uma das principais responsáveis pela captura e armazenagem de CO2 do mundo, além de ser de onde vem 70% das chuvas que irrigam áreas agricultáveis das regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil. 

A quantidade de CO2 armazenado por uma árvore pode ser medido pela espessura de seu tronco. Por este motivo uma árvore muito antiga ou milenar quando é derrubada ou queimada, acaba liberando na atmosfera uma grande quantidade de dióxido de carbono, entretanto a lógica inversa também se aplica, quanto mais antiga uma árvore e maior seu tronco, mais carbono ela retira da atmosfera.

A Amazônia apresenta um grande risco de deixar de ser “o pulmão do mundo” [os mares são o pulmão do mundo] e passar a ser o “carburador do planeta” acelerando ainda mais a quantidade de carbono despejada na atmosfera caso sua degradação não seja contida. Isto já ocorre em regiões muito afetadas pelas queimadas e pelo desmatamento, em entrevista à BBC Brasil, Luciana Gatti do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial afirma que: “A parte leste da Amazônia, que está cerca de 30% desmatada, emitiu 10 vezes mais carbono que a região oeste, que está 11% desmatada”. A pesquisadora-chefe de um estudo publicado pela revista “Nature” aponta ainda que entre 2010 e 2019 a floresta emitiu 20% mais carbono na atmosfera do que absorveu.

Atualmente 18% da floresta original já foi desmatada. A pressão sobre o Brasil na COP26 se dá pelo motivo de que se a devastação da Amazônia chegar a 20% entraremos no chamado “Tipping Point” ou ponto sem retorno, onde aliado às mudanças climáticas já em andamento mudarão de forma irreversível o ecossistema tropical amazônico, transformando o bioma em uma espécie de savana sem biodiversidade.

Já que as árvores começarão a morrer de maneira acelerada devido às secas e ao aumento de temperatura, o que afetará não apenas a região amazônica, mas o Brasil como um todo. Parte do norte e do nordeste de Minas Gerais já sofre com temperaturas muito acima do habitual, além de secas prolongadas.

Atualmente enfrentamos um grande evento de seca a cada 5 anos, caso o cenário atual de destruição não mude o país irá lidar com grandes processos de desertificação por todo o território nacional. O Brasil é um dos países mais vulneráveis às mudanças climáticas e aos processos de desertificação, a preservação e recuperação da Amazônia é vital para evitar problemas ainda mais sérios. Caso o aumento da temperatura do planeta chegue a 4ºC enfrentaremos cinco eventos de grande seca a cada 10 anos.

Isto afeta diretamente a produção de alimentos no Brasil já que a agronomia do país é completamente clima-dependente, ou seja, os períodos de plantação e irrigação são co-dependentes das temporadas de chuva e estiagem. Caso haja mudança no clima e períodos de chuva toda a atividade agrícola será afetada, causando grandes perdas sócio-culturais-econômicas.

O vácuo de poder deixado pelo desgoverno negacionista e eco-genocida de Jair Bolsonaro complica muito a situação e o protagonismo brasileiro frente a necessidade de ações tão urgentes e drásticas a serem tomadas neste momento. Mesmo que haja presença de Governadores em Glasgow, assim como durante a pandemia de COVID-19, o necessário é que houvesse um governo forte com planos concretos aliado a ministros da economia e do meio ambiente que fossem capazes de não apenas estar sentados a uma mesa de negociação, mas que liderassem as pautas mundiais e não fossem apenas pressionados pelas grandes economias globais.

Caso a população brasileira não se dê conta dos riscos eminentes relacionados aos acontecimentos atuais, o legado macabro de Jair Bolsonaro e seus asseclas será ainda mais duradouro, sombrio e carregado de fome e sangue. Sem justiça climática não há vida e sem a preservação e recuperação de nossos biomas já ameaçados não haverá chance de futuro para ninguém. Isto não pode ser pauta para eleição de 2022 e não pode ser assunto apenas durante a COP26 é necessário que as mudanças ocorram agora, não por pressão internacional mas por interesse próprio do povo brasileiro.

 

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