O Brasil, desde 2021, lidera o ranking global de consumo de agrotóxicos, despejando 719,5 milhões de toneladas dessas substâncias anualmente, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Por trás desses números, surge uma preocupação mais urgente: os danos diretos à saúde humana. Em apenas três décadas, o aumento de 1.300% no uso dessas substâncias coloca o país como um dos maiores consumidores e importadores mundiais, expondo a população a riscos crescentes de intoxicação.

Um relatório da Friends of the Earth Europe revela que, a cada dois dias, uma pessoa perde a vida no Brasil devido à exposição a esses venenos, sendo uma em cada cinco vítimas crianças ou adolescentes com até 19 anos. Este é o preço trágico que o país paga por liderar esse preocupante ranking global.

A exposição aos agrotóxicos pode causar uma série de doenças, que vão de irritações na pele ao câncer, dependendo do produto, tempo de exposição e quantidade absorvida pelo organismo. As consequências mais graves são sentidas por pelo menos 20 mil pessoas por ano – número de registros de mortes por consumo de agrotóxicos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

O Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas notificou que mais de 40 mil casos de intoxicação aguda por agrotóxicos foram registrados no Brasil na última década. Os casos são mais recorrentes entre os trabalhadores rurais, que estão em contato direto com os produtos nocivos à saúde.

Mas nem sempre esses efeitos são percebidos a curto prazo. Um estudo feito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) chama os agrotóxicos de “veneno invisível”, isso porque os efeitos na saúde podem demorar anos para serem sentidos. De acordo com a professora do Departamento de Bioquímica e Imunologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, Eliane Novato, casos crônicos – que ocorrem após exposições repetidas a pequenas quantidades de agrotóxicos por um período prolongado – podem se manifestar somente em gerações seguintes.

De acordo com o relatório “Atlas dos Agrotóxicos”, publicada em 2023 pela Fundação Heinrich Böll, o Brasil se destaca como um dos maiores consumidores e importadores mundiais desses produtos, sendo responsável por 18% da aquisição mundial. Além disso, 87% dos fertilizantes utilizados na agricultura nacional são importados, conforme a Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda). O país permite níveis mais elevados de resíduos desses produtos em águas e alimentos, agravando ainda mais os impactos na saúde da população.

O envenenamento tem sua origem na venda desenfreada desses produtos para países do Sul Global, onde a falta de regulamentação torna essas nações alvos principais. O “Atlas dos Agrotóxicos” ressalta que a União Europeia (UE), o maior mercado de exportação de agrotóxicos global, investe crescentemente em processos e exporta produtos proibidos em seu próprio território devido aos seus efeitos nocivos à saúde humana e ao meio ambiente. No Brasil, infelizmente, tais malefícios são ignorados.

A relação direta entre o aumento do uso de agrotóxicos e a expansão das áreas cultivadas com organismos geneticamente modificados é inegável. O Brasil, como maior exportador mundial de soja, carne bovina, carne de frango e açúcar, além de segundo maior exportador de grãos, viu um aumento de 70% na área cultivada com cana-de-açúcar e 75,6% na área cultivada com soja entre 2005 e 2022. Essa expansão abrange proporções preocupantes, ultrapassando os territórios combinados da Alemanha e da Bélgica.

Diante desse cenário, é evidente a dependência crescente da agricultura nacional em relação aos agrotóxicos, enquanto soluções ecológicas para preservação da saúde humana são negligenciadas. A necessidade urgente de regulamentação é clara. Chega de expor a população a esses venenos prejudiciais à saúde.

Texto: Iasmim Moreira
Fonte: Brasil de Fato, FAO, Atlas dos Agrotóxicos e Friends of the Earth Europe, OMS, UFMG.