Foto: Marcelo Mucida

A noite da quarta-feira, 23, marcou o encerramento da programação da primeira edição do Festival AudioTransVisual, já em clima de saudade.

De 21 a 23 de setembro, o público pôde conferir 17 curtas-metragens de diversos gêneros e linguagens artísticas, no canal do YouTube e na página do Facebook da Mídia Ninja. Os filmes são resultado de um curso online gratuito que possibilitou a formação no audiovisual para 30 alunes trans de todo o Brasil.

Esta foi a turma pioneira do projeto mas, após 3 dias de festival, permanece o desejo coletivo para que a iniciativa possa seguir gerando novos desdobramentos, e para que mais pessoas possam ter acesso a esta experiência, que estimula o empoderamento através da capacitação artística.

Protagonismo, visibilidade e representatividade foram tópicos que permaneceram sendo abordados em todos os dias de programação. Após a exibição dos curtas, ocorreram debates a cada noite que convidaram todes artistas realizadores a dialogar sobre o projeto e sobre as suas respectivas experiências durante o processo de criação dos filmes.

Na quarta, foram exibidos os curtas:

“Café com Rebu”, ficção, de Danny Barbosa, que conta a história de Vanessa, uma travesti que trabalha como manicure atendendo em domicílio e que, há algum temp,o conseguiu deixar a vida de prostituição nas ruas da cidade onde vive.

“Lugar de Origens”, documentário com direção de Luca Andrade, que se propôs a falar sobre um grupo de pessoas transvestigêneres que vive na Casa Nem, para enaltecer as suas potências.

“Amei-a”, animação stop motion de Vinicius Cassano, inspirada no conto “Pêra, uva ou maçã?” de Caio Fernando Abreu, e proposta com o objetivo de retratar a solidão vivida durante a quarentena.

“Como nenhuma inteligência já amou”, ficção científica de Sophi Saphirah, que lança o questionamento: em um mundo onde são naturais a automação das coisas e as desigualdades sociais, seria possível seres humanos desfrutarem de relações afetivas com as máquinas?

“Femininação”, arte vídeo documental, de Victoria Helena, que traz relatos da ativista Solange Revoredo sobre episódios de violência doméstica que ela sofreu e a sua superação, que resultou na fundação do GRAM (Grupo de Apoio à Mulher).

“Iauaraete”, videoarte de Xan Marçall que apresenta ELA – mulher trans de aproximadamente 35 anos, que prepara o espaço para uma cerimônia religiosa, Noite de Iauara Etê, entidade encantada das matas virgens, que ELA recebe nas noites de Lua cheia, como conta a sinopse do curta.

Foto: Mídia NINJA

Como aconteceu nos outros debates, a apresentação da conversa desta noite ficou por conta de Danny Barbosa e Bernardo de Assis, e Layla Sah trouxe intervenções a partir de comentários e questionamentos feitos pelo público durante a transmissão.

Danny iniciou o diálogo afirmando que “a arte é necessária, e viver sem ela seria impossível”. Ela também refletiu sobre o futuro, a partir de uma pergunta do público e disse que apesar dele ser “incerto, o que eu quero é que outras pessoas trans possam tomar este momento que nós estamos vivendo agora como exemplo.”

Luca Andrade seguiu na conversa falando sobre como foi importante para ele fazer um filme que contasse um pouco sobre a Casa Nem e disse que a sua intenção foi “enaltecer as potências que são essas pessoas, reafirmá-las, porque isso ainda é necessário, para que elas sejam vistas.”

Victoria Helena também pontuou sobre o processo de construção do seu documentário e inclusive disse que pretende gerar novos produtos a partir do que pôde começar a criar com este primeiro filme. Ela comentou: “Poder contar a história de uma mulher cis que foi violentada durante anos, de várias formas, foi muito importante para mim. Me ajudou a evoluir como ser humano”.

Xan Marçall falou um pouco sobre o Coletivo das Liliths, do qual ela faz parte, e contou sobre o seu interesse por pesquisar e contribuir para o compartilhamento de mitologias e imaginários que fazem parte da história de nosso povo. No início da sua fala, ela afirmou: “falo a partir de um território geopoliticamente organizado para que imaginários desapareçam, e eu falo de um lugar que é Amazônia, mas que também é Nordeste. Cresci com essas mitologias, que agora estão sendo exterminadas”. Xan também disse que acredita que “a gente precisa pensar uma ética a partir do afrocentrismo e também de uma epistemologia indígena.”

Na conclusão do debate, Vinicius Cassano fez uma fala que se relaciona com muito do que foi conversado nos 03 dias de programação: “Acho que o mais difícil é abrir a porta e ficar segurando enquanto todo mundo entra. Agora que todo mundo já entrou, é só escancarar essa porta, deixar aberta e continuar fazendo audiovisual, teatro e todas as artes… A gente tem que ocupar mesmo!”

E Sophi Saphirah compartilhou um apelo, durante os seus agradecimentos: “Quero fazer um apelo pensando em nós enquanto pessoas que atuam: chamem a gente para atuar quando quiserem personagens diversos, e não só quando quiserem personagens trans”.

Após 03 dias intensos, fica a vontade para que o projeto possa seguir se desenvolvendo, e também o agradecimento para todes que puderam acompanhar. Todos os filmes exibidos seguirão disponíveis no YouTube da Mídia Ninja durante o período de 48h.

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