(Kiara Worth/UNFCCC)

 

Por Miles Lajcák, da Cobertura Colaborativa NINJA na COP26

“…Do ano 2000 ‘pra frente; Homens do passado pisando no futuro, vivendo no presente; Há três tipos de gente; Os que imaginam o que acontece; Os que não sabem o que acontece…” e quem faz acontecer. (Um Bom Lugar – Sabotage ft. Black Alien)

Após a primeira semana da vigésima sexta Conferência das Partes da ONU sobre as Mudanças Climáticas em Glasgow, os versos eternizados por Black Alien na música em parceria com com o rapper Sabotage (1973 – 2003) se fazem ainda mais atuais quando em seus últimos dias, a COP 26 caminha para se tornar aquilo que muitos temiam antes de começar: um fracasso retumbante com muito discurso e poucas ações em um momento tão crucial para a humanidade frente a um cataclisma ecológico.

A cúpula que começou no dia 1º de novembro, pouco avançou sobre o que havia sido discutido em Paris durante a COP 21 em 2015. A mise-en-scène dos líderes mundiais durante a primeira semana serviu para mostrar que o “novo normal” pós-pandemia é exatamente o mesmo antes da crise sanitária causada pela COVID-19 e que os problemas causados pela eminente hecatombe ambiental, apesar de ser de interesse geral, não é pauta prática para aqueles que atuaram para causá-la.

A ativista ambiental, Greta Thunberg, 18, afirmou durante um discurso após uma manifestação que reuniu mais de 100 mil pessoas de todo mundo pelas ruas de Glasgow: “Não é segredo que a COP 26 é um fracasso. Deveria ser óbvio que não podemos solucionar uma crise com os mesmos métodos que nos levaram a ela em primeiro lugar.”. Um exemplo prático da falta de avanços em relação ao Acordo de Paris e de ações práticas, são as metas apresentadas pelo Brasil.

Greta já havia pedido que líderes deixassem de blá-blá-blá ao avaliar atuação na política ambiental (Mídia Ninja)

Por se tratar de um encontro de lideranças mundiais, Jair Bolsonaro decidiu não participar da COP 26 e em seu lugar foi enviado outro criminoso climático para representar o país, o atual ministro do Meio Ambiente. Um dos mais antigos membros da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Joaquim Leite é ex-conselheiro da entidade diretamente ligada à bancada ruralista (Frente Parlamentar da Agropecuária – FPA) no congresso, ex-produtor de café, ex-diretor de uma empresa de fármacos e ex-secretário da Amazônia e Serviços Ambientais na gestão inescrupulosa e criminosa de Ricardo Salles à frente do Ministério.

Joaquim Alvaro Pereira Leite está presente no desgoverno Bolsonaro desde seu primeiro ano em 2019, era secretário de Florestas e Desenvolvimento Ambiental. Em Agosto daquele ano quando o “dia virou noite” graças às cinzas e a fumaça proveniente das queimadas nos biomas amazônico e pantaneiro que cobriram boa parte do país.

Com um representante à altura da atual postura do Brasil em relação ao meio ambiente e à crise climática, foram apresentadas as “novas” metas de redução das emissões de carbono até 2030. Vale ressaltar que em relação ao que foi apresentado durante a COP 21, já houveram duas alterações de metas relacionadas aos originais do protocolado pelo país no Acordo de Paris. 

Originalmente, em 2015, o Brasil utilizou como base para apresentar as metas de redução de emissão o “Inventário de Emissão de Gases do Efeito Estufa” do Ministério da Ciência e Tecnologia, que apontava que 2,1 bilhões de toneladas de Dióxido de Carbono (CO2) e outros gases eram emitidos por ano pelo país. Nas metas assumidas em Paris, o Brasil deveria reduzir em 37% até 2025 e 43% até 2030, ou seja, respectivamente poderiam ser emitidos até 1,3 bilhão e 1,2 bilhão de toneladas de gases do efeito estufa em 2025 e 2030. 

A primeira revisão das metas ocorreu em 2020, quando os números base do cálculo foram atualizadas e apontavam que o país passou a emitir 2,8 bilhões de toneladas de gases o efeito estufa (um crescimento de 33,33%), com isto o Brasil poderia emitir até 2025 1,8 bilhão de toneladas e até 2030 1,6 bilhão.

Na revisão atual, aprovada pelo congresso e apresentada na conferência por Joaquim Leite como: “…uma nova meta climática, mais ambiciosa, passando de 43% para 50% até 2030; e de neutralidade de carbono até 2050, que será formalizada durante a COP26.” não são apresentados números para uma base de cálculo que permita saber qual a quantidade de gases que o país poderá emitir até 2030. Mesmo que a base para o cálculo sejam os números mais recentes (2,8 bilhões de toneladas), uma redução de 50% das emissões em 2030 significaria um total de 1,4 bilhão de toneladas, valor acima dos 1,2 bilhão previsto e apresentado, durante o governo Dilma, em 2015 na conferência de Paris.

Segundo a coordenadora de clima e justiça do Greenpeace Brasil, Fabiana Alves, para o G1: “o governo não explica como será a base de cálculo da redução de emissões. É importante que isso seja feito para que não haja nova pedalada climática, como houve em dezembro de 2020, na última reformulação das NDCs brasileiras.” ela conclui que: “A mudança da base de cálculo pode fazer com que se permitam mais emissões que nas metas passadas.”.

Joaquim Leite ainda não explicou será a base de cálculo da redução de emissões (MMA)

Outra meta apresentada por Joaquim Leite foi a de neutralidade de carbono até 2050, algo que já havia sido prometido por Bolsonaro em 2020. Apesar disso, não existe nenhuma lei ou política do atual do desgoverno que leve para o alcance destes compromissos firmados perante as lideranças mundiais. A Human Rights Watch afirma que: “Tampouco existem políticas detalhando metas intermediárias e de curto prazo que permitiriam ao Brasil atingir esse objetivo. Em vez disso, suas emissões aumentaram significativamente, de acordo com as estimativas mais recentes.”. 

Entretanto, a falta de atitude e ações práticas não são exclusividade da atual gestão brasileira. A primeira semana da COP 26 foi marcada por muito discurso por parte dos líderes mundiais e poucas propostas de ações imediatas e práticas para o combate do aquecimento global.

Desde a Rio 92 (Eco 92) basicamente todos os assuntos debatidos são os mesmos. Em entrevista ao canal MyNews, Cristina Pecequilo, a professora de relações internacionais da Unifesp disse que: “para nós que estamos acompanhando isso a muito tempo, causa um certo desamparo. Parece que toda vez que vamos ter uma COP, toda vez que vamos fazer uma conferência ambiental de grande porte, os assuntos são os mesmos, os problemas são os mesmos e as questões vêm se agravando. […] O que me parece é que continua havendo um descolamento entre o que os líderes falam, o que eles praticam e o que eles passam para sua população. E o dia a dia? Como vamos resolver isto? […] Falta uma comunicação clara de ‘como’ e afinal construir esse desenvolvimento sustentável que todo mundo discursa, principalmente os líderes dos países desenvolvidos, mas que nunca apresentam”.

Enquanto os holofotes começam a se apagar com a saída de cena dos líderes mundiais, e outros assuntos começam a tomar a atenção nos noticiários. Diplomatas, secretários e ministros iniciam seu balé para costurar acordos a fim de que a COP 26 não se soe como um fracasso absoluto, alguns pontos importantes (e que já vêm desde o acordo de Paris) para essa semana decisiva como a regulamentação do mercado de carbono e ações para que o aquecimento global seja limitado à 1,5ºC como discutido em 2015.

A verdade porém é que enquanto as discussões seguem rolando, a crise climática só piora e mesmo que a cada ano novas medidas e acordos sejam feitos, sem ações efetivas como uma regulamentação para a emissão de poluentes por lançamentos particulares de foguetes, iniciativas socioeducativas para a população geral. Os mais pobres e vulneráveis seguem à mercê dos caprichos e vontades dos mais ricos enquanto caminhamos a passos largos para a extinção da humanidade. 

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