(Mídia Ninja)

 

Lívia de Mello Trindade @liviamtrindade para a Cobertura Colaborativa NINJA na COP26

A Cúpula do Clima da ONU está reunindo diversos públicos para pensarem soluções para combater as mudanças climáticas, e para além, debater as causas e consequências dos eventos que estão prejudicando o Planeta. Na tarde do dia 08, em um dos eventos da Cúpula das Pessoas pela Justiça Climática – People’s Summit for Climate Justice, jornalistas ambientais, representando seus países, expuseram como funciona a cobertura de pautas sobre a crise climática.

Kátia Brasil, jornalista fundadora do Amazônia Real, falou sobre a importância da criação da agência de jornalismo independente e investigativo, para dar voz aos povos e comunidades tradicionais que sofrem com as consequências das mudanças climáticas.

“Existe um preconceito sobre os povos indígenas, principalmente porque as empresas de comunicação estão envolvidas com recursos públicos além de recursos de empresas. Essas pessoas que possuem poder, impedem que os povos tradicionais sejam livres, essa é a realidade, por isso criamos a Amazônia Real, porque não podíamos de qualquer maneira permitir que os nossos jornalistas que cobriam acontecimentos na região da Amazônia sofressem violações na liberdade de expressão”, relatou Kátia.

Jhesset Thrina, jornalista das Filipinas, falou sobre a importância da cobertura ambiental e apontou a importância dos meios de comunicação se dedicarem mais ao tema. 

“O último trabalho grande trabalho foi sobre as mudanças climáticas, e eu consegui entender como as grandes empresas estão prevenindo os jornalistas de reportarem as questões que estão acontecendo e foi isso que percebi aqui no meu país, aqui não estamos dando a notícia e mostrando como mudar a situação. Só a parte feia e confusa desse evento. […] Precisamos de uma onda de mudanças, percebemos isso em algumas empresas de mídia. Quando percebemos que possuímos mais recursos, também notamos que tem mais editores e repórteres interessados em fazer reportagens sobre mudanças climáticas”. Ela defende mais apoio para que esses diretores de grandes empresas de mídia coloquem a pauta como prioritária. “E não apenas como uma história que será contada depois que um desastre atingir uma determinada comunidade”, diz Jhesset.

A pauta indígena esteve em destaque, durante a conversa. Jornalistas apontaram que são os que mais sofrem com as mudanças climáticas. No entanto, não são reportadas com visibilidade. É preciso que o assunto seja mais explorada. Kátia ressaltou a precariedade do ser indígena em tempos pandêmicos no Brasil.

“O indígenas no Brasil são os que mais sofrem com as mudanças climáticas e os principais causadores são garimpeiros e  madeireiros, eles entram no território sem pedir permissão, o que se torna uma invasão concreta, e eles destroem o meio ambiente derrubando a floresta, grandes árvores são destruídas, além de fauna, plantas medicinais, conhecimento tradicional e cultura indígena é destruído e o que não caiu ainda, está em perigo muito grande”.

Ela realça que é certo que a pandemia foi muito dolorida para todo o povo brasileiro, mas principalmente para os povos indígenas. “Não receberam suporte e informações devidas, nem sabão eles tinham para lavar a mão. Muitos anciãos morreram entre 2020 e 2021, mais de 1.000 indígenas foram mortos durante a pandemia por consequência do vírus da COVID-19”.

Para Kátia, é preciso que os governos, especialmente do Brasil – que possui um governo anti-indígena e antiambiental – ajam urgentemente para que esse desmatamento desacelere. “Para que os povos possam viver tranquilos. A situação é muito grave hoje em dia. A imprensa nesse momento, principalmente, os que sabem o que passamos, precisam vir cobrir a situação da Amazônia, mas não venham somente uma vez, venham e cubram o que realmente está acontecendo”.

Pautas ambientais são urgentes

A jornalista ambiental canadense Sarah Lawrynuik, expõe sobre a necessidade de irmos rápido e além em pautas que envolvem o futuro do planeta.

“Eventos críticos são cobertos de uma maneira pobre, estamos sempre começando tudo de um começo lento, não realizamos jornalismo ambiental de uma forma apropriada e não conseguimos atravessar essas barreiras, são questões elementares que precisamos atravessar, eu imagino que exista interesse nisso e que todos estamos reconhecendo a justiça social, ainda não chegamos lá, é uma prioridade principal por décadas, mas ainda parece que estamos começando”. 

Em complemento, a jornalista filipina Jhesset pontuou sobre a importância de viver a pauta na qual se está trabalhando.

“Há um interesse renovado nessa área, existe algo novo para nós jornalistas, é uma história que precisava ser contada.  Até mesmo antes disso, eu acredito que é a consistência nas reportagens sobre crise climática que fará a diferença, percebi durante meus anos como repórter que não existe neutralidade nessa cobertura, por todos esses anos também estava cobrindo as vivências, é sobre as pessoas também, o que se torna muito triste por ver onde as comunidades chegaram pela ação do homem. Todas as redações teriam que abordar a crise climática”.

O papel do jornalista ambiental é ultrapassar muitas barreiras e requer consistência e determinação. Sarah relata sua jornada na qual buscou especialização para entregar seu melhor diante das coberturas jornalísticas.

“Em uma época em que vivia em uma área do Canadá que tinha exploração de gás, e sempre me diziam que minhas reportagens estavam incorretas e eu sofria preconceito em relação a isso, então decidi receber isso e me especializar na área. Fiz um mestrado na área climática, porque eu estava justamente ouvindo de alguns gerentes e chefes que eu não tinha capacidade necessária para efetuar meu trabalho de cobertura ambiental”, relata a jornalista canadense.

Os interesses que silenciam pautas

A jornalista Kátia,que realiza cobertura no norte brasileiro, também falou sobre chefes e gerentes que muitas vezes controlam a veiculação de notícias.

“Essas pessoas estão muito envolvidas com os donos dos poderes, principalmente aqui no norte, onde por exemplo uma empresa mineradora financia o veículo de imprensa, caso essa empresa cause um grande impacto ambiental em uma área indígena por exemplo, essa notícia só vai sair de um lado oficial. Existe muito o jornalismo de interesse, e algumas notícias podem atingir o judiciário, ou da área empresarial e principalmente político”

Sarah também falou sobre essa questão, além da dificuldade de empresas cooperarem com os jornalistas.

”Existem pontos cegos nessa questão, principalmente pela indústria da mineração e do petróleo, eles sabem que os jornalistas não compreendem algumas coisas, então eles justamente miram nesses pontos cegos. Ao redor do mundo empresas aumentam emissões e os jornalistas até tentam espalhar e contar isso para o mundo , mas o que deveria ser algo para checagem acaba não acontecendo” 

Seres humanos antes de tudo

Jhesset abordou que é necessária e urgente a humanização do jornalista, pois são cidadãos como qualquer outro.

“Jornalistas são seres humanos, são afetados também pela crise climática, creio que o jornalismo em si é um exercício doloroso, porque mesmo que não seja um tópico difícil ele pode afetar nossa saúde mental, sendo ainda um tópico tão sensível uma crise existencial planetária. Então existem outros tipos de impacto no jornalismo que dizem a respeito à ansiedade, porque a forma a qual sentimos tudo é difícil, e particularmente cobrindo a ecologia é um luto”.

Recentemente aprendeu que existe um termo de uma sensação de não ter companhia.

“Se você está nessa solidão mesmo, então se o seu chefe ou seu editor não vê aquilo com a mesma visão, você chega em uma solidão climática. As vezes é frustrante, você quer que essa história seja contada, entendida e ouvida o máximo possível, você quer humanizar aquele impacto. Pode ser que o público também não esteja interessado, esteja mais a fim de saber de política ou entretenimento, isso pode gerar uma frustração e ansiedade no jornalista”.

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