Renée Nader Messora, codiretora do longa, falou à Cine NINJA sobre a importância de levar o filme e sua temática ao evento francês

“A Flor do Buriti”. Foto: Divulgação

Por Lilianna Bernartt

O Festival de Cannes é um dos maiores festivais de cinema do mundo e este ano conta com diversos eventos e produções que colocam as comunidades indígenas em destaque.

O evento “Marché du Film” garantiu destaque às produções que estão sendo realizadas na Amazônia, contando com palestra do cineasta Sérgio de Carvalho, diretor do filme vencedor do Festival de Gramado em 2022, “Noites Alienígenas”.

Adanilo, ator amazonense, teve papel de destaque em “Noites Alienígenas” e em diversas outras produções, também está representando com força o cinema da Amazônia, além de divulgar o filme “Eureka”.

Esta semana também tivemos a presença de diversas lideranças indígenas no tapete vermelho do Festival para o lançamento da Aliança Fundo Amazônica, que tem como o objetivo a criação de uma renda fixa para as comunidades indígenas que habitam a Amazônia, além de projetos de reflorestamento e preservação ambiental.

Este fim de semana ainda estreia em Cannes o filme “A Flor do Buriti”, de Renée Nader Messora e João Salaviza, que será exibido na mostra “Un Certain Regard”. A dupla de cineastas continua o trabalho iniciado em “Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos”, premiado em Cannes em 2018, e volta a colocar em foco a comunidade Krahô, no norte do Tocantins, abordando a luta pela terra e as formas de resistência adotadas pela comunidade.

 

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Sobre a importância de levar a temática indígena em Festivais de grande destaque internacional como Cannes, a cineasta Renée diz: “Hoje filmes são produzidos de norte a sul do país, em aldeias próximas a grandes centros urbanos e em aldeias isoladas do mundo. Mostras de cinema indígena acontecem dentro e fora do Brasil. Vemos que esse movimento acompanha também o crescimento das diversas artes indígenas contemporâneas, que finalmente começam a ser reconhecidas e a ocupar salas enormes em importantes museus no Brasil e fora dele. A moda produzida por estilistas indígenas também passa a ser vista como alta costura”, diz a diretora.

“Temos uma ministra Indígena de um recém criado Ministério dos Povos indígenas, a Sonia Guajajara. Temos finalmente uma FUNAI gerida pelos próprios indígenas, e parlamentares indígenas na linha de frente da luta. São muitas conquistas. Tudo isso se deve á mobilização e esforço dos próprios povos para que houvesse esse reconhecimento.”

Renné segue: “É um movimento que não vai parar e está intrinsicamente relacionado às questões que hoje são uma pauta de relevância mundial, que é o aquecimento global, a poluição e as reflexões e mudanças que nós como sociedade devemos emplacar para termos um planeta habitável daqui a muito pouco tempo. Temos uma pistola apontada para as nossas cabeças e os povos indígenas tem muito a nos ensinar, eles praticam ecologia desde sempre, muito antes do termo ser criando. Eles entenderam desde sempre que as coisas todas estão conectadas e que humanidade e natureza pertencem a um organismo só. Não é por acaso que apesar de serem um por cento da população brasileira, os indígenas protegem oitenta por cento da biodiversidade do Brasil. Quando se sobrevoa o país, ou se vê um mapa do Brasil, os grandes pulmões verdes são precisamente áreas indígenas demarcadas. Isso não é pouco.”

“A gente precisa se engajar nessa luta também, precisamos ser responsáveis por isso. Precisamos cobrar que todas as terras indígenas sejam demarcadas, como garantiu a Constituição Federal. Precisamos cobrar que a decisão sobre a tese do Marco Temporal seja favorável aos indígenas. Essa é a próxima luta, porque a votação está pautada para dia 7 de junho, e é fundamental que os ministros e as ministras do STF tenham posição favorável aos povos indígenas. A gente precisa mobilizar e sensibilizar as pessoas para essa pauta, que irá impactar todos os processos demarcatórios no futuro.”

Sobre levar o filme e estas questões ao grande evento cinematográfico francês, a cineasta ressalta que: “Ter um palco como Cannes, que é uma vitrine pro mundo todo, se configura também como um espaço para trazer essas questões todas e tecer novas alianças. Ali podem ser produzidas imagens que se tornarão parte desse “arsenal” simbólico e ainda não podemos vislumbrar todas as possibilidades futuras que lançamos quando passamos pelo tapete vermelho. É uma economia complexa e misteriosa que vai se articulando com o passar do tempo. São muitas brechas que podem se abrir para encontros e novas possibilidades. Isso aconteceu em 2018 e esperamos que aconteça novamente agora em 2023”, conclui.

O cinema é ferramenta essencial para visibilidade das causas indígenas às grandes lideranças e além de abrir novos diálogos, apoiadores e parcerias, ainda ajuda a fomentar e incentivar também a produção autoral de cineastas indígenas, que vem cada vez mais (re)ocupando seus espaços.

É o Brasil mostrando a força e diversidade do cinema nacional. Momento para se celebrar.

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