Foi lançada ontem, 05 a pesquisa ‘Teto e Trabalho’, que destrincha o perfil dos moradores do acampamento, que conta atualmente com mais de 12 mil famílias. O trabalho foi organizada pelo DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), CUT (Central Única dos Trabalhadores), Fundação Friedrich-Ebert-Stiftung (FES) e pelo próprio MTST.

“O objetivo dessa pesquisa é mostrar para a sociedade quais são de fato qual os perfis dessas pessoas, porque essas pessoas estão indo para uma ocupação, porque no maior polo industrial do estado a gente consegue produzir tanta riqueza e ao mesmo tempo tanta pobreza e como é que em um mês, de 250 famílias, a ocupação chega a 7.500, e depois, a mais de 12 mil”, explicou a coordenadora da pesquisa e membro do DIEESE, Adriana Marcolino.

“Famílias tipicamente brasileiras”

Foto: Mídia NINJA

O perfil dos moradores da Ocupação não destoa da maior parte da população brasileira, aponta Marcolino em sua análise. Os dados destacam isso: 53% são mulheres, e 62% se declararam pretos e pardos.

A pesquisadora chamou atenção para o constrangimento das pessoas quando questionadas sobre a sua raça. “Elas muitas vezes ficavam incomodadas, até mais do que para falar da sua renda”, comentou. Sobre a idade dos ocupantes, constatou-se que há um número grande de crianças e jovens no local, sendo 26% com até 14 anos, 20% de 15 a 24 anos e 29% de 31 a 50 anos de idade.

A escolaridade, por sua vez, retratou a alta frequência nas escolas até os 15 anos de idade, quando a evasão torna-se mais comum, ligada principalmente à necessidade de trabalhar para manutenção do lar. 94% das crianças entre 4 e 5 anos frequentam a escola, 98% de 6 a 14 anos, enquanto 83% de 15 a 17 e apenas 25% de 18 a 24 anos. Um dado alarmante é o de que 4,7% das crianças com menos de 4 anos nunca terem frequentado uma escola.

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A maioria dos imigrantes são do nordeste, 37,6%, sendo que 19% deles vieram nos últimos 10 anos. Para Marcolino, esse é um dado importante, que revela que mesmo com as conquistas sociais e o aumento da renda da população, a migração para o sudeste permanece forte, sem que as oportunidades sonhadas sejam concretizadas.

Quando olhamos para as famílias, a média é de 2,9 pessoas, menor que a taxa nacional, de 3,4 pessoas. Além disso, 30% delas são formadas por apenas 2 pessoas, em geral casais jovens que tinha dificuldades para permanecer morando com as suas famílias, e 18% por apenas uma família.

Os chamados “chefes de família” são 52% homens e 48% mulheres, dessas 32% são mães solo. Confrontando essa realidade com população economicamente ativa, percebemos que, aqueles que são maioria na ocupação são os mais atingidos com o desemprego. 57% dos desempregados são mulheres, e 64% negros e negras, que em média permanecem 1 ano à procura de um trabalho fixo.

Apesar disso, a taxa de ocupação da população do acampamento é de 73%, seja empregada ou à procura de um emprego. A taxa é maior do que a da Região Metropolitana, que registra 63%.

As profissões mais comuns são diarista, emprego doméstico, ajudante geral, auxiliar de limpeza, garçom, motorista, auxiliar administrativo, operador de máquina, telemarketing, pedreiro, porteiro, vendedor ambulante, cozinheiro e vigilante. O rendimento médio é de 1.137,00 reais.

As moradias dos ocupantes em sua grande maioria, 70% dos casos, são alugadas, e 21% são cedidas, sejam por familiares ou de favor.

Instabilidade de renda é instabilidade na moradia

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“A instabilidade da questão de renda para uma parcela importante da classe trabalhadora, que paga aluguel nas periferias desse país, também é a instabilidade da moradia. E é exatamente agora que o estado deveria intervir mais para garantir acolhimento de políticas públicas para essas famílias. Mas o que está acontecendo é o inverso. É o aumento da crise social e uma redação das políticas públicas, em particular no tema habitação”, avalia o coordenador nacional do MTST, Guilherme Boulos.

Boulos questiona a política habitacional implantada pelo governo de Michel Temer, que reduziu o investimento para casas populares, para famílias de até 3 salários mínimos, a chamada faixa 1 do programa Minha Casa Minha Vida, e a prioridade para famílias com 4 a 5 salários mínimos, o que a liderança chama de “linha de crédito popular”.

“Mesmo depois de toda a luta que o movimento social fez para conseguir a contratação das 35 mil casas do Minha Casa Minha Vida Entidades, sabe quantas eles construíram? Zero. Só com as emendas parlamentares que eles soltaram para continuar no governo, conseguiriam bancar tudo isso”, diz Boulos.

Foto: Mídia NINJA

“Muitos nos apontam como vagabundos, como pessoas que não tem o que fazer. Mas o que falta são oportunidades, de morar bem, de trabalhar e para estudar. A gente que é do acampamento sabe como é essa realidade”, conta Andréia Barbosa, coordenadora da ocupação de São Bernardo.

“É um enfrentamento, é um choque. De um lado aumenta a demanda por moradia popular, do outro lado diminui a oferta do estado de políticas públicas para isso. Qual é o resultado disso? Milhares de famílias que não tem outra alternativa a não ser ir para a lona preta e fazer ocupação. É por isso que que a Ocupação Povo Sem Medo de São Bernardo saiu com 500 famílias e em uma semana tinha 5 mil, e logo depois 8 mil famílias. Não é nenhum acaso. É o símbolo do agravamento da crise social no nosso país”, argumenta o coordenador do Movimento.

“Antes de apontar e chamar a gente de vagabundo, vá, pise o pé na lama e sinta o que as pessoas sentem lá. Porque lá é um lugar em que as pessoas são solidárias uma com as outras. Ter um olhar mais humanitário para quem está lá”, reclama Barbosa, ao lembrar atentado à tiros na ocupação, disparado de um condomínio de alto padrão localizado ao lado do acampamento.

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