Confronto Camarões X Brasil na Copa do Mundo de 2000. Foto: Reuters

Por Hugo Gabriel da Cruz

A partida desta sexta-feira (02/12) entre Brasil e Camarões pela fase de grupos da Copa do Mundo de 2022 será mais um capítulo na história do confronto entre as duas seleções. Em competições profissionais, segundo o site O Gol, brasileiros e camaroneses já se enfrentaram seis vezes, com cinco vitórias do Brasil e uma de Camarões, porém essa estatística não lembra daquela dolorosa derrota brasileira nas quartas de final dos Jogos Olímpicos de Sydney (2000), quando ainda não tínhamos ganhado essa competição e perdemos na prorrogação, com dois jogadores a mais e fomos eliminados da competição, levando a demissão do técnico Vanderlei Luxemburgo do comando da amarelinha.

Se engana quem pensa que a relação histórica entre Brasil e Camarões seja apenas pelo futebol. Além do verde e amarelo na bandeira, os dois países têm ligações históricas muito profundas.

Com mais de 23 milhões de habitantes, Camarões é conhecido como “a mini África” devido a sua grande diversidade cultural que se apresenta nas mais de 250 línguas faladas por mais de 230 grupos étnicos, e têm sua história ligada à brasileira já na coincidência, ou nem tanto, de ambos os países terem sido colonizados (invadidos) por portugueses, os quais também foram os responsáveis por dar o nome aos dois países, sendo que o nome Camarões foi dado ainda no século XV, em 1472, visto que os europeus perceberam uma grande abundância de camarões (o crustáceo) no litoral da costa ocidental da África central.

A partir do século XVI, por volta da década de 1520, os mesmos portugueses foram os responsáveis por estreitar ainda mais os laços entre Brasil e Camarões através do tráfico de escravizados que prosseguiu de forma mais ou menos intensa pelo menos até meados do século XIX, quando começou a ser proibido internacionalmente devido aos interesses comerciais da Inglaterra que decretou a lei conhecida como Bill Aberdeen (1845), a qual declarava que os ingleses teriam o direito e o dever de aprisionar navios que transportavam escravizados pelo Atlântico Sul.

Foi justamente nesse período que se estendeu do século XVI até o século XIX que a história brasileira se une, infelizmente de uma maneira trágica com a história de Camarões, visto que dos cerca de 10 à 12 milhões de pessoas sequestradas de diversas regiões do continente africano pelos europeus e trazidas para as Américas, cerca de metade tiveram como destino os portos brasileiros.

Rota dos escravizados; Fonte: SO história

É praticamente impossível sabermos exatamente quantas pessoas foram trazidas de Camarões para o Brasil como escravizados, mas o atual Estado camaronês está entre os atuais países que faziam parte da rota da Mina a qual alimentava principalmente os mercados de escravizados de Salvador, Rio de Janeiro e São Luís do Maranhão com destaque para pessoas das etnias axanti, fanti, iorubá, hauçá, ibô, fon, ewe-fon, bariba e adjá.

Os números são incertos e revelam uma atrocidade além da escravidão em si, que é o apagamento da memória da ancestralidade de milhares de pessoas que não tem como saber de que povo ou parte da África seus ancestrais saíram em direção ao Brasil. A insuficiência de documentos e outras fontes históricas que nos dê dados mais precisos hoje começa a ser, pelo menos suavizada, com pesquisas que envolvem análises genéticas.

Segundo publicação do site novaescola.org, uma pesquisa liderada pelo médico geneticista Sérgio Danilo Pena (UFMG), analisou os genes de um grupo de negros em São Paulo e apontou que 44,5% tinham uma ancestral no Centro-Oeste da África, exatamente a região onde hoje está localizado o atual Estado de Camarões. Outro exemplo pode ser observado também na série televisiva Brasil: DNA África, pela produtora Cine Group em parceria com a Globo Filmes e que convidou alguns brasileiros para realizarem testes de DNA e visitarem os locais de origem dos seus antepassados. Um desses convidados foi o arquiteto baiano Zulu Araújo, que visitou a terra dos seus antepassados em Camarões e afirmou sobre a viagem ao site da BBC Brasil: “A viagem me completou enquanto cidadão. Se qualquer pessoa me perguntar de onde sou, agora já sei responder. Só quem é negro pode entender a dimensão que isso possui.”

Mais do que adversários em campo, podemos nos orgulhar das ligações históricas, culturais e por que não ancestrais? entre nosso país e nossos irmãos do outro lado do Atlântico.

Texto produzido em cobertura colaborativa da NINJA Esporte Clube