Temos muito o que celebrar em Contagem se queremos uma cidade do futuro. Aqui, consigo listar várias urgências para melhorar a vida da nossa cidade, mas escolho lembrar de uma política essencial na garantia de uma cidade democrática, viva, sustentável e justa: o nosso Plano Diretor. Se queremos uma cidade diferente, uma cidade inclusiva, precisamos pensar em estratégias de legislação e regulamentação que garantam o direito à cidade, previsto inclusive na nossa Constituição.

Desde os anos 1980, um grande movimento nacional por reformas urbanas ganhou força no período da redemocratização e a partir de sua incidência na constituinte, em 1988,  do que chamamos a época de “Emenda Popular Pela Reforma Urbana”, passa a constar em nossa constituição um capítulo de política urbana que deu papel central e estratégico para os Planos Diretores das nossas cidades. Passa-se, a partir desse poderoso instrumento, a existir a garantia da função social da propriedade urbana e a sua existência como instrumento básico para o desenvolvimento e a expansão urbana. Grandes vitórias que ressoam até hoje. Contagem foi vanguarda ao criar e aprovar durante as primeiras gestões da prefeita Marília Campos, um plano diretor inovador e que garantia políticas essenciais como a da preservação da Vargem das Flores e mecanismos de controle para uma cidade que cresceu de forma desordenada e baseada em uma urbanização industrial.

Fomos uma das primeiras cidades mineiras a ter um plano tão robusto. Plano esse que nos anos seguintes foi sendo alterado de forma desrespeitosa com a vontade do povo e do que de fato representa uma política urbana eficaz. Agora, conseguimos mais uma vitória ao colocar o plano na centralidade do nosso debate político. Com ampla participação social, escuta, diálogo e respeitando não só a vontade da maioria, como diretrizes mundiais para cidades sustentáveis, aprovamos o Novo Plano Diretor de Contagem. Isso foi uma grande vitória política, com aprovação na Câmara com ampla maioria e mostrando a força de uma proposta para melhorar a cidade.

Como líder de governo,  achei todo o processo da comissão da Câmara Municipal e todas as escutas populares, trabalhando ao lado da prefeita Marília Campos para garantir que todo o processo de participação e construção do plano fosse respeitado. Com dias de galeria cheia na Câmara, chegamos a essa importante vitória.

Para ampliar esse debate sobre nossas políticas urbanas, recorro aqui à arquiteta e urbanista Joice Berth, que coloca como fundamental a compreensão da cidade também como espaço de convicções, ideias, práticas e, ainda, de articulações das tecnologias de opressões usadas e aprimoradas no decorrer do tempo. Se falamos de um espaço que reforça tecnologias opressoras, é necessário que as nossas políticas públicas considerem essa dinâmica dos espaços. Exemplo disso temos ao olhar para as áreas rurais, para os locais mais atingidos por tragédias ambientais como chuvas e enchentes. Em sua maioria, são lugares ocupados por pessoas de baixa renda, pela população negra e, em cidades desordenadas, relegadas às margens. Essas são também as estruturas que precisam ser corrigidas.

Nenhuma luta que visa a transformações coletivas eficientes pode ser bem-sucedida se as dinâmicas espaciais consolidadas não forem compreendidas. Antes, ou simultaneamente, é necessário alterar também os cenários em que os atores sociais se constituem e se apresentam. (BERTH, Joice. 2023, p. 21)

Mudar os cenários requer debate, participação e pensar na cidade de forma ampla, mas sempre considerando distorções sociais em seu uso, como no caso da distribuição de renda, de investimentos, de acesso a equipamentos públicos e direitos básicos. Se historicamente ao olhar para o urbanismo nos deparamos com reproduções coloniais em nossas metrópoles, como pensar cidades que vão na contramão da história?

Em Contagem queremos começar justamente com o nosso plano diretor. Quando falamos da cidade, também falamos de territórios em disputa e cabe ao poder público olhar para os atores nessa disputa e se esforçar para corrigir distorções estruturais de classe, raça e gênero.

Nosso sonho é uma cidade sem déficit de moradia, uma cidade em que as pessoas acessem com facilidade os serviços públicos, saúde, educação e mobilidade. Nosso sonho é uma cidade segura para nossas mulheres e crianças. Uma cidade segura para a juventude negra. Uma cidade que não se torne refém da especulação imobiliária e das grandes construtoras. Construir é preciso, mas de forma ordenada, regulada e com impostos que possam ser revertidos em políticas urbanas e de moradia.

Queremos regularização fundiária, água e luz nas periferias e ocupações urbanas. Queremos a Vargem das Flores preservada, sem Rodominério e com seu uso social, ambiental e turístico garantido. Queremos bairros independentes do centro, cultura em todas as regionais, acessibilidade e ocupação dos nossos espaços públicos.

Se queremos uma Contagem diferente e que olha para o futuro, esse futuro começa agora com a aprovação do Novo Plano Diretor. Vitória da nossa prefeita, mas também de todos nós que fizemos a defesa incansável do plano, que trabalhamos pela garantia de suas diretrizes básicas e que ao legislar, aprimoramos ainda mais esse trabalho.

Se para Lélia Gonzalez, em nossas cidades seguimos vendo uma divisão social do espaço que reproduz a lógica da Casa Grande e da Senzala, nossa missão é exatamente ruir com essas estruturas e reconstruir nossa política urbana.

Conheça outros colunistas e suas opiniões!

Colunista NINJA

Memória, verdade e justiça

FODA

Qual a relação entre a expressão de gênero e a violência no Carnaval?

Márcio Santilli

Guerras e polarização política bloqueiam avanços na conferência do clima

Colunista NINJA

Vitória de Milei: é preciso compor uma nova canção

Márcio Santilli

Ponto de não retorno

Renata Souza

Abril Verde: mês dedicado a luta contra o racismo religioso

Jorgetânia Ferreira

Carta a Mani – sobre Davi, amor e patriarcado

Moara Saboia

Na defesa das estatais: A Luta pela Soberania Popular em Minas Gerais

Dríade Aguiar

'Rivais' mostra que tênis a três é bom

Andréia de Jesus

PEC das drogas aprofunda racismo e violência contra juventude negra

André Menezes

“O que me move são as utopias”, diz a multiartista Elisa Lucinda

Ivana Bentes

O gosto do vivo e as vidas marrons no filme “A paixão segundo G.H.”

Márcio Santilli

Agência nacional de resolução fundiária

Márcio Santilli

Mineradora estrangeira força a barra com o povo indígena Mura

Jade Beatriz

Combater o Cyberbullyng: esforços coletivos