Margarida, Borboleta e Bianca: os primeiros árbitros gays do futebol brasileiro que marcaram a história
Eles não tinham vergonha de desmunhecar, empinar o corpo ou correr como gazelas dentro das quatro linhas.
Por Victoria Amaro
Eles não tinham vergonha de desmunhecar, empinar o corpo ou correr como gazelas dentro das quatro linhas. Os primeiros árbitros assumidamente gays no futebol, Jorge Emiliano dos Santos, o Margarida; Walter Senra, o Bianca; e Paulino Rodrigues da Silva, o Borboleta, roubaram a cena no fim dos anos 80 e início dos 90.
Com muito profissionalismo, o trio de amigos superou preconceitos, driblou a violência e ficou conhecido pela irreverência e o apito honesto. Uma história que foi eternizada no livro ‘Parada Dura, Memórias de um Juiz Gay do Futebol Carioca’, escrito pelos jornalistas Anna Davies e Carlos Nobre (1953-2019).
“Conheci primeiro o Margarida, que foi meu bandeira em um jogo. Daí nasceu uma grande amizade. Depois conheci o Bianca e também ficamos muito amigos. Foi o Margarida que revelou a nossa homossexualidade em um entrevista ao ‘Jornal dos Sports’. Na época, eu era juiz classista do tribunal e queria processá-lo de qualquer jeito”, conta às gargalhadas Borboleta para em seguida cair em lágrimas ao lembrar da perda dos amigos. Margarida morreu em 95 e Bianca, em 2002.
De bem com a vida e consigo mesmo, Borboleta fez questão de mandar um recado para quem não teve coragem de sair do armário: “Quem nunca se assumiu que se assuma. Que se dane o preconceito. Ninguém pode lutar contra a própria natureza”.
Além de sofrer muito com homofobia, Borboleta conviveu de perto com a violência do futebol. Ele chegou a perder dois dentes após receber vários socos dos jogadores do Campo Grande na derrota por 2 a 0 para o Vasco em 1992. E em 1990 teve uma arma apontada para sua cabeça por um torcedor do América, que não se conformava com a derrota por 3 a 2 para o Fluminense, em Três Rios.
Violência à parte, foi a incrível história de Borboleta que chamou a atenção da jornalista Anna Davies. “Depois que o conheci tive o ‘insight’ de escrever o livro para resgatar a história dele. Só não tinha a noção da sua importância. Quem meu deu essa dimensão foi o Carlos Nobre”, ressalta Anna.