Lideranças indígenas e de povos tradicionais defendem protocolos próprios de consulta
Uma carta foi elaborada para ser apresentada na COP30: lideranças querem ser ouvidas nos espaços de decisões
Daryl Hannah, da Cobertura Colaborativa NINJA na COP30
O Quilombo do Abacatal, em Ananindeua (PA), foi palco, nos dias 10 e 11 de novembro, do V Encontro do Observatório de Protocolos Autônomos de Consulta e Consentimento Prévio Livre e Informado. O evento reuniu lideranças quilombolas, indígenas, ribeirinhas, pesquisadores, estudantes e representantes de organizações sociais em um espaço de partilha, aprendizado e fortalecimento das lutas dos povos e comunidades tradicionais.
A partir de muito debate, construíram coletivamente uma carta em defesa dos protocolos autônomos de consulta e consentimento, instrumentos fundamentais para garantir que as decisões que impactam esses povos sejam tomadas com respeito à sua autonomia, cultura e modo de vida. O documento reúne as principais reflexões, denúncias e proposições apresentadas ao longo das rodas de conversa e reafirma o compromisso dos povos e comunidades tradicionais com a defesa dos seus territórios, do meio ambiente e do direito à consulta e ao consentimento livre, prévio e informado.
Agora, o documento será apresentado em espaços de debate sobre o tema, na COP30, a fim de garantir que os povos da floresta, das águas e dos quilombos sejam ouvidos e respeitados nos espaços de decisão internacional sobre o clima e a transição energética. O texto reforça que não é possível discutir sustentabilidade e mitigação climática sem reconhecer o papel histórico dos povos tradicionais na preservação dos biomas e no enfrentamento das mudanças climáticas.

Vozes dos territórios e saberes compartilhados
Durante as falas, as lideranças destacaram a necessidade de fortalecer os instrumentos de autodeterminação.
Para Vanuza Cardoso, liderança do Quilombo do Abacatal, anfitriã do encontro, o evento simboliza a união entre diferentes vozes e saberes. “Participaram diversas lideranças, não só quilombolas, como também indígenas, extrativistas, ribeirinhas, das águas e das florestas. Esse momento reafirma a importância da autodenominação dos povos e do direito à consulta prévia, livre e informada. É uma forma de apresentarmos, de maneira coletiva, as ferramentas que temos construído com os nossos protocolos autônomos”, destacou.

Debates sobre consulta prévia, transição energética e mercado de carbono
Ao longo dos dois dias de atividades, o V Encontro do Observatório de Protocolos Autônomos foi marcado por intensas trocas de experiências e reflexões coletivas sobre os desafios e conquistas na criação dos protocolos comunitários de consulta e consentimento. As discussões se concentraram em torno de três grandes momentos: a Roda de Saberes, que abordou as conquistas e desafios da construção dos protocolos autônomos; a Roda de Conversa sobre Consulta Prévia, Livre e Informada; e o debate sobre Transição Energética e Mercado de Carbono, temas que têm impactado diretamente os territórios tradicionais e suas formas de organização.
A coordenadora do Observatório de Protocolos Autônomos, Liana Lima, reforçou o caráter estratégico e político desses instrumentos comunitários “A importância dos protocolos autônomos comunitários de consulta e consentimento livre, prévio e informado é justamente permitir que os próprios povos elaborem suas regras e procedimentos para os processos de consulta, conforme previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A consulta prévia é um direito fundamental, mas o que a gente vê historicamente são inúmeras violações por parte do Estado quanto à forma como esses povos são consultados. Os protocolos servem para que os povos se estabeleçam como sujeitos de direito, com voz própria e poder de decisão sobre seus territórios”, afirmou.

Encerramento com união e esperança
O encerramento do encontro foi marcado por um clima de união e esperança. Representantes das comunidades participantes reafirmaram que o fortalecimento dos protocolos autônomos de consulta e consentimento é uma forma concreta de resistência frente às violações de direitos e às pressões sobre os territórios tradicionais.
“Um encontro como este reafirma que nossos saberes, nossas crenças e nossos modos de vida são fundamentais para o futuro do planeta. Somos guardiões de uma sabedoria ancestral que ensina a viver em equilíbrio com a natureza e com o outro. Seguimos firmes, fortalecendo nossas vozes e caminhando lado a lado, porque o respeito aos nossos direitos é o primeiro passo para a justiça climática, ambiental e social. Que nossas palavras ecoem longe, lembrando que não há futuro possível sem a presença e o protagonismo dos povos tradicionais”, afirma Babá Edvaldo, representante do Coletivo Povos e Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA).

O encontro encerrou-se com cânticos, gestos de agradecimento e a leitura coletiva da carta final, simbolizando o compromisso conjunto em dar continuidade ao processo de articulação e defesa dos direitos dos povos.



