Lanchonete deve indenizar mulher trans em R$ 30 mil por negar acesso a banheiro
“A identidade de gênero é uma escolha pessoa”, disse a Justiça
Uma lanchonete em Santos, no litoral de São Paulo, foi condenada pela justiça a pagar uma indenização de R$ 30 mil para uma mulher transexual que foi impedida de usar o banheiro feminino do estabelecimento.
“As pessoas trans, como sujeitos de direitos que são, estão amparadas pelo princípio da dignidade da pessoa humana e são titulares dos direitos da personalidade (direito à intimidade e ao próprio corpo)”, diz o trecho da decisão da 3ª Turma Cível do Colégio Recursal de Santos.
Para a turma julgadora, a transfobia sofrida pela vítima configurou clara violação à sua honra, imagem, privacidade e intimidade, o que justifica a indenização por dano moral, sobretudo pelo dever constitucional de reprimir todo tipo de discriminação.
“A identidade de gênero é uma escolha pessoal, que se dá no âmbito da subjetividade habitada e que deriva da autonomia privada dos indivíduos, o que os tornam aptos a decidir o que de fato é melhor para cada um, função essa que não é de mais ninguém além do próprio sujeito”, disse o relator, juiz Orlando Gonçalves de Castro Neto.
Constrangimento e danos morais
A vítima estava no local com familiares e amigos e perguntou onde se encontrava o banheiro feminino a um dos funcionários, mas este proibiu o acesso e disse que ela deveria usar o banheiro masculino, conduta reiterada pelo gerente da lanchonete.
Assim, por unanimidade, o colegiado reformou a sentença de primeira instância, que havia julgado a ação improcedente. O juízo de origem considerou o episódio um “mal-entendido”, mas o relator na Turma Recursal destacou que a transfobia ficou devidamente comprovada e deve ser repreendida pelo Judiciário.
“Além do direito fundamental à liberdade de escolha, corolário da autodeterminação, é importante ainda ressaltar que um dos fundamentos da República expressamente previsto no artigo 3, inciso IV do texto da constituição brasileira de 1988, é reprimir todo tipo de discriminação, especialmente aquelas advindas da origem, raça, sexo, cor e idade”, diz trecho da decisão.
Conforme o magistrado, o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto constitucionalmente, deve ser respeitado por todos, o que implica a necessária coibição de qualquer ato de transfobia, violência ou discriminação, ostensiva ou velada, em todos os ambientes.
Neto ainda destacou a necessidade de um novo olhar sobre homens e mulheres trans: “À sociedade, resta a função de romper com o paradigma da patologia, estruturada sob a doutrina binária, e transmutar-se para o plano de construções de identidade de gênero por meio da cultura e do meio social, com o fito de permitir ao sujeito expor o seu ser, externar suas escolhas, sem receio de ser excluído, discriminado ou violentado.”
*Com informações do JOTA