Justiça inglesa condena BHP por tragédia de Mariana, dez anos após o rompimento
A Justiça britânica condenou nesta sexta-feira (14) a BHP Billiton Brasil — uma das acionistas da Samarco — pela tragédia do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), que completa dez anos em novembro
por Pedro Madeira
A Justiça britânica condenou nesta sexta-feira (14) a BHP Billiton Brasil — uma das acionistas da Samarco — e responsabilizou a empresa pelo crime ambiental do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), que completa dez anos em novembro. O desastre deixou 19 mortos, destruiu comunidades inteiras ao longo do Rio Doce e gerou um passivo humano e ambiental ainda não reparado.
Com a decisão desta sexta-feira, a corte afirmou que a BHP é responsável pelos danos — ambientais e sociais — decorrentes do colapso da barragem e reconheceu falhas e omissões que contribuíram diretamente para o rompimento. Detalhes referentes às indenizações ainda não foram definidos.
A ação coletiva buscava reparação para cerca de 600 mil vítimas e atingidos, incluindo pescadores, indígenas, quilombolas, ribeirinhos e moradores que perderam casas, trabalho, renda e vínculos comunitários. Trata-se da maior ação coletiva já analisada na história da Justiça inglesa.
Três vítimas acompanharam a divulgação do resultado direto de Belém, sede da COP30: Thatiele Monique Estevão, representante do Quilombo de Santa Efigênia; Mônica Santos, liderança comunitária que perdeu a casa no rompimento; e Yrerewá, liderança indígena da comunidade Krenak.
https://www.instagram.com/p/DRCVMzCgW9q
Thatiele, que esteve presente junto aos advogados no momento da publicação da sentença, classificou o resultado como “simbólico”, sobretudo por ocorrer durante a COP30.
“Após 10 anos de luta e sofrimento, esse momento na COP vai chegar no meu território de uma maneira avassaladora”, disse Thatiele, que ponderou: “Mas [a decisão] é o início de mais uma luta, porque a gente sabe que esse processo vai continuar nos atravessando.”
O processo foi movido pelo escritório internacional Pogust Goodhead, em parceria com o Hotta Advocacia, responsável por representar parte dos atingidos no Brasil. Uma nova audiência está prevista para dezembro, quando as partes discutirão os próximos passos.
A Mídia NINJA acompanhou em Belém o momento da divulgação — recebido com forte reação no apartamento onde estavam hospedados as vítimas e os advogados.
“Nos disseram que seria uma ‘aventura jurídica’ entrar neste processo, mas agora é inédito: em 10 anos, as mães e os atingidos pela tragédia vão poder dizer quem são os culpados”, afirmou Felipe Hotta, advogado e sócio do escritório que representou as partes brasileiras.
A decisão assinada pela juíza O’Farrell, da High Court inglesa, concluiu que a BHP é responsável pelos danos ambientais e sociais causados pelo rompimento da barragem — segundo a legislação brasileira aplicada ao caso.
A sentença diz que a empresa responde de forma objetiva como “poluidora”, nos termos dos artigos 3 e 14 da Lei Ambiental, e também por negligência, por falhas que permitiram o agravamento da instabilidade da barragem.
A decisão destaca que a BHP tinha conhecimento da saturação do barramento, da drenagem inadequada e dos sinais de deformação que antecederam o rompimento, e que o colapso poderia ter sido evitado.

Em um dos trechos centrais, a juíza afirma que “a BHP é estritamente responsável como ‘poluidora’ pelos danos causados pelo colapso” e que a empresa “é responsável por culpa pelos danos decorrentes do colapso, nos termos do Artigo 186 do Código Civil”.
A decisão também reconhece que o risco de ruptura era previsível e que a falta de medidas adequadas contribuiu diretamente para o desastre.
Mônica dos Santos, de 40 anos, também falou à reportagem. Moradora de Bento Rodrigues à época do desastre — o primeiro distrito arrasado pela lama — ela considera a decisão inglesa um marco histórico: “Essa decisão é um tapa na cara da Justiça brasileira.”
https://www.instagram.com/p/DRCYcm6gZ2n
Mônica relembra as perdas de sua comunidade: “Seis pessoas morreram naquele dia 5 de novembro: duas crianças, um nascituro e três adultos.”
Ela cobra a postura das instituições brasileiras e critica a absolvição dos réus no ano passado, quando a Justiça brasileira decidiu não responsabilizar ninguém criminalmente pelo crime ambiental.
“A gente viu todo mundo sendo absolvido no Brasil. E agora é a Justiça britânica que está dizendo que a BHP — uma das donas da Samarco — é responsável pela maior tragédia socioambiental da nossa história”, afirma Mônica, em tom de indignação.



