Em 1977, em Rio Branco (AC), a luta contra a ditadura militar levou à criação de “um jornal das selvas”, “rude, caboclo, sem técnica”, como já anunciava seu primeiro editorial. Batizado de Jornal Varadouro, ele chegou a ser vendido por Chico Mendes que, de mão em mão, distribuía um contradiscurso à imprensa local que, na época, chamava os fazendeiros de “grandes empresários”.

 “Varadouro é, pois, um dever de consciência de quem acredita no papel do jornalista”, dizia em seu primeiro editorial.

Em linguagem popular, de forma simples e direta, tocava em inúmeros temas, normalmente referentes às ameaças que sofriam a Amazônia, seus recursos naturais e seu povo.

Em suas 24 edições, Varadouro ampliou as vozes dos trabalhadores do campo ajudando-os a organizar um forte movimento que integrou a luta por melhores condições de vida e a defesa da floresta. Mas em 1981, devido a ameaças e sucateamentos, o jornal fechou.

Hoje, quase 50 anos depois, quando a Amazônia vira palco mundial de discussões socioambientais, enquanto o mundo passa por uma crise climática, o jornal está de volta em novo formato, agora digital.

Elson Martins, um dos fundadores do jornal e Fabio Pontes, atual editor. Foto: Ramon Aquim

“É essencial termos as vozes locais falando sobre jornalismo socioambiental dentro da Amazônia”, disse em entrevista para a Mídia NINJA o jornalista Fábio Pontes, que agora é editor do jornal.

Mesmo com cinquenta anos de diferença entre um período e outro, muitos dos problemas enfrentados naquela época permanecem até hoje: a invisibilidade da região, que continua sendo vista por muitos como um grande vazio a ser explorado, a perseguição contra os povos indígenas que sempre estiveram na linha de defesa da floresta, a luta dos trabalhadores do campo – que agora enfrentam uma indústria de agronegócio fortemente organizada – e a destruição da nossa sociobiodiversidade, que vem sendo perdida diante de recordes de queimadas e desmatamentos.

“Vamos manter o mesmo objetivo de quanto o jornal foi criado lá nos setenta pelo Elson Martins e outros jornalistas aqui do Acre, que é o de ser um porta voz, vanguardista, em defesa da Amazônia e em defesa das populações da floresta”, destacou Pontes.

Ele enfatiza também a importância de despertar a consciência da população local para o debate ambiental. “O que a gente vê muito é que esse é um assunto que fica sendo falado lá fora, vem muito de cima para baixo, de fora para dentro, e eu acho que isso acaba criando uma antipatia”, comentou.

Em uma época em que as notícias chegam quase instantaneamente graças à internet, o jornal Varadouro retorna com o projeto de querer ser um amplificador da identidade amazônica, difundindo um jornalismo da região, que não segue os moldes do Sul e Sudeste, segundo explica Fábio.

Agora, com o mundo voltando os olhos para a Amazônia, um jornalismo que trata justamente dos problemas das pessoas locais pode ser o começo para que as vozes dos povos da floresta sejam ouvidas.

Com informações da InfoAmazonia