Jogadoras australianas já tiveram que pagar para defender seleção
Carta de convocação chegou acompanhada dos custos da viagem em 1982
Por Kelly de Conti
A família reunida em frente à televisão esperando, ansiosamente, ouvir a lista de convocadas da seleção. Essa é uma cena comum hoje. Mas, em 1982, aconteceu de modo muito diferente para as atletas selecionadas para integrar a seleção australiana.
A carta de convocação começava por parabenizar as atletas pelo feito. Mas a parte curiosa vinha na observação final: “Você está disposta a pagar este valor e estará disponível nos horários acima?”.
O valor em questão referia-se à passagem de avião para participar da turnê internacional com as Matildas, como é conhecida a seleção feminina da Austrália. Além desse problema, havia a necessidade de confirmar a disponibilidade das datas, pois muitas jogadoras conciliavam a vida de atletas com outras profissões.
Então com 18 anos, a atacante Leanne Priestley relembrou a dificuldade para conseguir o valor necessário para a viagem.
“Passei muitos fins de semana vendendo bilhetes de rifa em postos de gasolina, muitas vezes segurando a mangueira enquanto as pessoas encontravam o troco ou escolhiam seus bilhetes”, detalhou em entrevista ao site da Federação de Futebol da Austrália (FFA).
O então técnico, Jim Selby, também recorda as diferenças estruturais em comparação ao que existe hoje. “Foi um momento pioneiro em que o ciclo precisava ser quebrado para mostrar que, com melhor treinamento e mais oportunidades, as meninas poderiam jogar em um padrão mais alto”, afirmou.
O início do futebol feminino na Austrália
Há relatos de times femininos australianos formados em Nova Gales do Sul, no sudeste da Austrália, em 1903. Mas a primeira partida oficial que se tem registro entre duas equipes femininas ocorreu quando o North Brisbane derrotou o South Brisbane por 2 a 0 em 24 de setembro de 1921. Foram 10 mil espectadores acompanhando o duelo no Brisbane Cricket Ground.
O jornal local Queensland Times descreveu as jogadoras que participaram da partida como hábeis e fortes. Os elogios iam de “o tratamento hábil do jogo por essas jovens” até “as meninas mostraram resistência notável”, o que evidenciava “treinamento apurado”.
Depois desse duelo, outras mulheres se entusiasmaram com o esporte. Mas houve resistência. A principal delas aconteceu após a Associação de Futebol da Inglaterra (FA) proibir o futebol feminino. Como antiga colônia britânica, a decisão repercutiu na Austrália. Um comitê foi formado no país, que alegou que o futebol seria impróprio para a saúde das mulheres. Ao invés disso, elas deveriam receber incentivo para participarem de atividades como natação, remo e ciclismo.
Apesar de existirem algumas iniciativas esporádicas de organizar partidas femininas, muitas mulheres tinham medo da opinião pública. Esse cenário começou a mudar apenas na década de 1970, quando algumas ligas regulares começaram a aparecer no país.
Hoje, a Austrália, juntamente com a Nova Zelândia, é o país sede da maior competição feminina de futebol do planeta. Nesta segunda (31), a seleção enfrenta o Canadá, às 7h, em partida válida pelo Grupo B da Copa do Mundo.
As Matildas precisam de uma vitória para conquistarem a classificação. Em caso de empate, devem torcer pela derrota da Nigéria contra a Irlanda e, ainda, tirarem a diferença de saldo de gols em relação às africanas. Hoje, as Matildas estão zeradas, enquanto a Nigéria tem um gol de saldo.
Texto produzido em cobertura colaborativa da NINJA Esporte Clube