Indígenas resistem a projeto de extermínio que se equipara ao dos tempos da invasão colonial
Mesmo alvo de constantes ataques, seguem na resistência. Confira documento final do ATL, onde elencam ações necessárias para a reconstrução do Brasil
Anunciando que resistirão a projetos de devastação de seus territórios e por consequência, de ameaça às vidas de indígenas, documento final do Acampamento Terra Livre reforça que a mobilização é permanente. Entre as principais bandeiras estão a exigência de demarcações e a luta contra leis e julgamentos que visam legalizar invasões e exploração de recursos naturais em territórios preservados. A ocupação de espaços políticos e exigência de reinserção em conselhos representativos das causas indígenas e de órgãos ambientais também é estratégia para seguir na luta.
“Precisamos interromper esses processos de destruição e morte. Nossa luta é por nossos povos, sim, mas também pelo futuro de todos e todas as brasileiras e pela humanidade inteira! Lutamos por um projeto baseado nos princípios do respeito à democracia, aos direitos humanos, à justiça, ao cuidado com o meio ambiente e com a Mãe Natureza; um projeto que respeite a diversidade étnica e cultural do país do qual fazemos parte, com mais de 305 povos diferentes e 284 línguas indígenas, sem racismo, preconceitos e discriminações de nenhum tipo”, diz trecho do documento divulgado no site da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
Neste, lembram que a resistência pela garantia de suas vidas e preservação ambiental – afinal, são os guardiões da floresta -, remonta 522 anos. “Assim como aprendemos com nossos ancestrais, seguimos e seguiremos juntos, resistindo contra os distintos projetos de extermínio que as elites, donos ou representantes do capital e seus sucessivos governantes e aliados no Poder Legislativo têm articulado contra nós”.
Eles alertam sobre a gravidade da situação, que se equipara à dos tempos de invasão colonial, acentuada pelo governo de Bolsonaro.
“Como nos tempos da invasão colonial, enfrentamos um declarado plano de morte, etnocídio, ecocídio e genocídio, nunca visto nos últimos 34 anos de Democracia no nosso país. Bolsonaro, desde sua campanha eleitoral e já no primeiro dia de seu mandato, proferiu discursos racistas e de ódio contra os Povos Indígenas, elegendo-nos como inimigos preferenciais e promovendo o desmonte do Estado, principalmente das instituições, políticas e programas que conquistamos ao longo das últimas três décadas, voltadas a atender nossas necessidades, interesses e aspirações, em linha com os direitos que nos assegura a Constituição Federal de 1988”.
E para resistir, esperam apoio da sociedade, para que haja resistência coletiva.
“E assim iremos removendo com o tempo e a ação coletiva o atual cenário de barbárie do capital, do ódio fascista e do racismo estrutural deste sistema, males implantados que atingem não só a nós os indígenas mas também a outros setores vulnerabilizados como os quilombolas, comunidades tradicionais, agricultores familiares e pobres, principalmente negros e negras, que vivem nas periferias das cidades brasileiras.”.
O documento divulgado pela Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil (APIB) apresentou propostas que organizações indígenas entendem ser ponto de partida para a reconstrução do Brasil. Confira as propostas apresentadas à plenária final do 18º Acampamento Terra Livre, elencadas em cinco eixos:
EIXO 1 – DIREITOS TERRITORIAIS INDÍGENAS – DEMARCAÇÃO E PROTEÇÃO AOS TERRITÓRIOS INDÍGENAS JÁ!
1 – Garantia de recursos suficientes para a identificação, delimitação, declaração, demarcação e homologação imediata de todas as Terras Indígenas,; – Elaboração de Plano factível para imediata desintrusão de todas as terras indígenas, invadidas por fazendeiros, grileiros, madeireiros, garimpeiros e outros invasores;
2 – Constituição de uma Força Tarefa Interministerial para criar Planos Permanentes de Proteção das Terras Indígenas bem como assegurar recursos e condições necessários para a sua manutenção e a participação direta das comunidades indígenas.
3 – Fortalecimento da política especial de proteção e de não contato aos povos indígenas isolados e de recente contato;
EIXO 2 – RETOMADA DOS ESPAÇOS DE PARTICIPAÇÃO E CONTROLE SOCIAL INDÍGENAS
1 – Assegurar o exercício do direito de consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas em conformidade com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT); quando medidas administrativas e legislativas impactem seus territórios e direitos, respeitando os protocolos autônomos de consulta e consentimento elaborado pelos povos e comunidades
2 – Reativação de todos os dispositivos de participação e social, em que os nossos povos tinham representação: Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI); Conselho de Segurança Alimentar (CONSEA); Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), Conselho Nacional de Saúde (CNS), Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)
3 – Fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) e o Subsistema de Saúde Indígena (SESAI/SUS), bem como implementação da Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial das Terras Indígenas (PNGTI).
EIXO 3 – RECONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS E INSTITUIÇÕES INDIGENISTAS
1 – Reestruturação das instituições responsáveis pela implementação das políticas públicas voltadas aos nossos povos, em especial, a FUNAI e a SESAI, garantindo autonomia, rigor técnico, servidores públicos e dotação orçamentária condizente com as necessidades das ações necessárias à promoção dos direitos indígenas, com respeito à diversidade de povos, gêneros, e gerações;
2 – Criação de mecanismos específicos de proteção a indígenas defensores de direitos humanos, com recursos financeiros e estrutura administrativa condizente
3 – Garantir a assistência integral à saúde indígena e à educação escolar intercultural e bilíngue respeitando as especificidades culturais e sociais de cada povo indígena
EIXO 4 – INTERRUPÇÃO DA AGENDA ANTI-INDÍGENA NO CONGRESSO FEDERAL
1 – Impedir o avanço de medidas legislativas que atentam contra os direitos territoriais indígenas, e com urgência, os PL 490/2007, do Marco Temporal e o PL 191/2020 da Mineração em Terras Indígenas
EIXO 5 – AGENDA AMBIENTAL
1 – Propor medidas legislativas e administrativas que estabeleçam mecanismos de rastreabilidade de produtos, em respeito à devida diligência, para garantir que não sejam resultantes de conflitos territoriais, explorações ilegais de TIs, e áreas ilegalmente degradadas;
2- Retomar os compromissos e ambições ambientais assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris e em outros acordos internacionais do clima e meio ambiente;
3 – Reestruturar o ICMBio e o IBAMA, garantindo autonomia funcional, rigor técnico, servidores públicos e orçamento adequado para que cumpram suas missões institucionais de defesa dos biomas brasileiros;
4 – Reconhecer a contribuição dos Povos Indígena, Quilombolas e Comunidades Tradicionais na preservação da biodiversidade brasileira, criando mecanismos de reconhecimento pelo serviço ambiental prestado e incentivando iniciativas indígenas, como as brigadas indígenas anti-incêndio;
5 – Retomar as políticas de preservação de nossas fontes de água doce, reconhecendo o papel dos Povos Indígenas na gestão de grande parte de nossos recursos hídricos.
Confira o documento na íntegra, clicando aqui.