Indicado em 5 categorias no Oscar 2024, filme com protagonismo negro não retrata a escravidão
Ficção Americana longa-metragem baseado no livro Erasure do autor Percival Everett, uma comédia dramática bem dramática
Por Milene de Souza de Espindula
American Fiction é uma produção que inicialmente pode parecer uma comédia à moda Família Wayans, mas surpreende quando trás uma pegada mais tragicômica do que um filme pastelão cheio de piadas soltas. A sátira, é bastante inteligente e muito cirúrgica em algumas cenas. Bem como na cena em que Monk (Jeffrey Wright) busca referências no filme “Fique Rico ou Morra Tentando” do diretor irlandês Jim Sheridan.
A produção foi adaptação do livro “Erasure” lançado em 2001 pelo tão aclamado Percival Everett, considerado pelos leitores e amantes de literatura norte-americana como mestre quando se trata do assunto “sátiras sobre raça e política da arte”. O nome do protagonista também trás representatividade mas desta vez na cena musical, com Thelonious Monk, que foi um grande pianista e compositor de jazz entre os anos 50 e 80.
Monk (Jeffrey Wright) é um escritor e professor de literatura que enfrenta a questão de não se encaixar nos estereótipos impostos pela sociedade norte-americana como homem preto. Contudo, ele acaba enfrentando muitas adversidades após passar 10 anos sem publicar um livro que agrade o grande público. Monk (Jeffrey Wright) viaja para Boston, sua cidade natal, para ficar mais próximo da família e participar da feira literária sediada na cidade, quando toma conhecimento da obra de uma autora negra Sintara Golden estrelada por Issa Rea. Um livro 100% estereotipado, usando a gravidez solitária de jovens negras, gírias e dialetos considerados “chulos”.
Thelonious (Jeffrey Wright) acaba se adaptando aos padrões que os brancos norte-americanos estão acostumados, quando entra numa corrida desenfreada para escrever um novo livro que chegue aos pés do “Nós vive lá no gueto” da então famosa autora Sintara Golden.
Dentro do contexto familiar, além de Lisa Monk tem outro irmão, Cliff (Sterling K.Brown), médico e recém divorciado, que durante a meia idade descobre-se um homem gay, que vive maior parte do tempo sob o uso de substâncias, álcool e drogas, se mostra indisponível para os cuidados da mãe que apresenta o diagnóstico de alzheimer. Ficando a cargo de Monk resolver sua escrita e o destino de sua mãe. Thelonious finalmente consegue destravar a imaginação mas prefere publicar o livro no anonimato. O que Thelonious não imaginava era que o livro intitulado “Porra” seria um estouro de vendas e agradaria tanto a branquitude norte-americana a ponto de ser indicado a importantes premiações literárias. Enquanto seus livros com temática rebuscada e cheia de referências enchem de poeira nas prateleiras. Tendo em prova que o estereótipo deixa os brancos mais confortáveis quando se trata de qualquer conteúdo vindo da população negra.
MENSAGEM PRINCIPAL
American Fiction é um filme que precisa ser degustado por aqueles que amam cinema e estão sedentos por produções com protagonismo negro, que conte nossas histórias como elas realmente precisam ser contadas, através da verdade e das nossas vivências, não expressando somente nossas dores e estereótipos.
Ficção Americana trás a perspectiva do quão difícil é ser negro e intelectual em qualquer esfera. Nosso conhecimento sempre será colocado a prova e cada vez que nos afastamos dos estereótipos e da marginalização somos menos respeitados pois os brancos não estão acostumados com um negro letrado que frequenta universidade, ou mora fora do “gueto”. Os brancos estão acostumados a nos inferiorizar para se sentir bem consigo mesmos dentro da sua bolha de privilégios. Negros intelectuais são colocados na caixinha da arrogância e prepotência. Quando na realidade estamos tentando fugir daquilo que nos mata, desde de olhares à armas de fogo. American Fiction ou Ficção Americana, é uma boa produção para o incentivo da reflexão sobre o negro e a intelectualidade. De como somos vistos e tratados quando decidimos não nos render a imagem que eles criaram.
Texto produzido em cobertura colaborativa da Cine NINJA – Especial Oscar 2024