Homem negro preso injustamente por mais de 730 dias vai receber R$150 mil de indenização em SP
A juíza Patrícia Persicano, em sua análise do caso, destacou os inúmeros erros presentes no processo e suas graves consequências para a vida de Vinicius
Vinicius Vilas Boas, de 37 anos, foi preso injustamente por mais de dois anos sob falsa acusação de assalto. A polícia e a justiça usaram fotografias para condenar o trabalhador, analista de pricing. A vitória de Vilas Boas foi publicada pela Ponte Jornalismo, que acompanha o caso desde 2019.
Além da indenização de R$ 150 mil, Vinicius vai receber um salário mínimo pelo tempo em que ficou preso ilegalmente.
“A gota d’água foi quando meu filho chegou da escola e perguntou ‘mãe, por que o papai roubou um posto de gasolina?’ e eu perguntei ‘quem te falou isso?’ e ele respondeu ‘foi a professora’. Eu falei ‘não, o papai é trabalhador, a gente vai resolver essa situação’, contou Vinícius para a jornalista da Ponte Jeniffer Mendonça.
O ano era 2017 quando Vinícius foi detido sob a suspeita de participação em um assalto a uma residência na cidade de José Bonifácio, em São Paulo, ocorrido em 2006. As acusações foram embasadas em imagens de câmeras de segurança, datadas após a data do crime, onde Vinicius foi erroneamente identificado. Apesar das divergências na identificação da pessoa nas fotos e dos esforços de sua defesa em questionar as evidências, ele foi mantido sob custódia.
Durante seu período de detenção, os advogados de Vinicius buscaram incansavelmente provar sua inocência, além de identificar o verdadeiro autor do crime. Graças à revisão criminal, foi apresentado o depoimento de uma testemunha que apontava outro indivíduo como o verdadeiro culpado.
A juíza Patrícia Persicano, em sua análise do caso, destacou os inúmeros erros presentes no processo e suas consequências devastadoras para a vida de Vinicius. Mesmo após sua libertação, ele enfrentou dificuldades para conseguir emprego, sendo rejeitado até mesmo em aplicativos de entrega e transporte devido ao registro criminal injustamente atribuído a seu nome.
O relator Marcelo Semer apontou “insegurança” nos depoimentos dos policiais civis que se referiam às imagens e a informações de policiais militares não identificados e nunca ouvidos no inquérito de que Vinicius teria relação com os outros três suspeitos porque seria “conhecido nos meios policiais”, apesar de não ter nenhum registro criminal anterior, conforme a decisão que a Ponte teve acesso.
Reconhecimento facial e o viés racista
A utilização do reconhecimento facial como prova para incriminar pessoas negras levanta uma série de preocupações éticas e sociais profundas que merecem uma crítica rigorosa. Esta prática, muitas vezes, reflete e perpetua preconceitos e injustiças existentes em nossa sociedade, em vez de promover a justiça e a equidade.
Para o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, é importante reconhecer que os algoritmos de reconhecimento facial tendem a apresentar viés racial, devido à forma como são treinados. Muitos desses algoritmos são desenvolvidos com conjuntos de dados desproporcionalmente compostos por imagens de indivíduos brancos, o que resulta em taxas mais altas de falsos positivos quando aplicados a pessoas negras. Isso significa que pessoas inocentes correm o risco de serem erroneamente identificadas como criminosas simplesmente por causa de sua raça.