Fogo devasta refúgio de vida silvestre no Pará
Unidade de conservação não tem nem um ano; foi criada justamente para tentar proteger fauna e flora
Criadas para proteger ecossistemas ameaçados, formando um escudo de proteção, as unidades de conservação na Amazônia estão sob ataque. E em chamas. Caso da UC Refúgio de Vida Silvestre Rios São Benedito e Azul, que fica em Jacareacanga, no Pará.
Grande porção de verde da unidade criada há menos de um ano, deu lugar a um cinza desconcertante. Muitos bichos, que ali deveriam encontrar abrigo, morreram nos incêndios que devastaram a área nos últimos dias. Mais de 6 mil hectares – de 30 mil no total – foram destruídos. A fumaça, também chegou à sede do município nesta quinta-feira (8).
Nos últimos dias, imagens de animais atordoados fugindo dos incêndios, repercutiram nas redes sociais. A unidade de conservação é morada de muitas espécies endêmicas, como o cachorro-vinagre, o papagaio careca, o mico munduruku e o macaco aranha da cara branca, além da onça pintada.
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Segundo o Instituto de Pesquisas Espaciais, Inpe, só nos primeiros sete dias de setembro, a Amazônia já registrou 18.374 focos de incêndio, sendo que no mês todo no ano passado, foram 16.742.
A diretora-executiva da Rede Nacional Pró Unidades de Conservação (Rede Pró-UC), Angela Kuczach sobrevoou a unidade de conservação e relata que o cenário lembra um armagedon. Junto ao fotógrafo Gustavo Figueirôa, ela saiu do Parque Cristalino II, na Amazônia mato-grossense, rumo à recém-criada unidade de conservação no Pará.
A rede atua na defesa e fortalecimento das unidades de conservação e segundo ela, tem monitorado a situação crítica de 30 unidades em todo o país que estão sob forte pressão de desmatamento, grilagem, mineração e incêndios. Dentre elas, o Cristalino e o Refúgio de Vida Silvestre, além de unidades em Rondônia, que também registram alto índice de devastação.
“Se essas unidades são ameaçadas, todo o sistema nacional é impactado. O Parque Cristalino, em Mato Grosso e o Refúgio de Vida Silvestre, no Pará, estão localizados em uma área muito especial, do ponto de vista, de serem hotspot de biodiversidade. Abrigam espécies endêmicas ameaçadas de extinção”, alerta.
Angela ressalta ainda que o cordão de proteção formado por unidades de conservação na Amazônia está fragilizado por conta dos altos índices de desmatamento. “É na região que se formam os rios voadores, tão importantes para fazer chover no Centro-Oeste e Sudeste. Mas, por falarmos de regiões distantes das capitais, muita gente ignora”, lamenta.
Seguindo rumo à área de fronteira dos dois estados, Pará e Mato Grosso, a partir de Sinop (MT), viu uma fumaça densa durante todo o trajeto de carro até chegar a Alta Floresta (MT). “Era irrespirável. O sol estava encoberto pela fumaça”, relata. Depois de passar por Alta Floresta, a equipe da Rede Pró-UC sobrevoou a região do Cristalino, onde foram vistos muitos focos de incêndio e então, o cenário desolador da Gleba São Benedito.
“Não parece que ela queimou, mas que derreteu. Porque você não vê os troncos, a árvores sumiu por inteiro. Eu vi um desenho de um tronco feito de cinza, que logo caiu no chão e virou pó. A gente encontrou muitos animais queimados. Muitos bichos tentando fugir, mas que debilitados, não se sabe se sobreviverão. É triste demais”.
O Corpo de Bombeiros do Pará já deixou a área, rumo a Novo Progresso (PA), onde a situação também é crítica.
“Sem efetivo, eles têm que fazer escolhas. Está pegando fogo no Pará inteiro. E demorou demais para chegar ajuda. Então, vieram até bombeiros de Mato Grosso. O que é bem peculiar, pois fizemos campanha pedindo por umas duas semanas para que atuassem no combate ao fogo no Parque Cristalino II, em Novo Mundo (MT), mas a resposta demorou a vir”. No Cristalino II, estima-se que o fogo consumiu uma área de mais de 4 mil hectares.
A Rede Pró-UC também monitora ações do Legislativo e Executivo, atuando na defesa jurídica de unidades, alertando o Ministério Público ou acionando a Justiça, dentre outras iniciativas. Também realiza campanhas de comunicação e mobilização de parceiros que fortalecem redes de proteção. .
“O Cristalino tem permanecido em nosso foco, porque é alvo do ataque de ‘gafanhotos’, são muitas as ameaças”. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso decidiu pela extinção da unidade de conservação em favor de uma empresa privada. Por sorte do acaso, o tribunal não notificou o Ministério Público e ainda cabe recurso. Dessa forma, o parque permanece ativo no banco de unidades de conservação estaduais de Mato Grosso.
Mato Grosso e Pará registram o maior número de áreas queimadas neste ano, mas a situação ficou ainda mais grave neste mês. De 1º a 7 de setembro, 20.933 focos de incêndio foram registrados em Mato Grosso, enquanto no Pará, foram 20.693. Em todo o país, os focos de incêndio aumentaram 10% em relação ao ano passado, segundo o Inpe. De 1º de janeiro até o dia 7 de setembro foram 107.957 focos, enquanto no ano passado, no mesmo período, foram 98.017 focos registrados.