A articulação política envolvendo anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 e a tentativa de limitar o poder do Supremo Tribunal Federal (STF) está ganhando corpo no Congresso Nacional. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados pode votar nesta terça-feira (10) um projeto de lei que concede anistia ampla a manifestantes, caminhoneiros e financiadores que participaram de ações contra o resultado da eleição presidencial de 2022. Paralelamente, a CCJ analisará uma série de propostas que buscam enfraquecer a atuação do STF, em uma manobra coordenada por parlamentares ligados à extrema direita.

O projeto de anistia e suas implicações

O texto em análise propõe perdão a todos os que participaram de bloqueios de rodovias, acampamentos em frente a quartéis, e às manifestações que culminaram com a invasão das sedes dos Três Poderes, em Brasília. Proposto pelo deputado Major Vitor Hugo (PL/GO), aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, o projeto argumenta que os atos foram conduzidos por cidadãos inconformados com o resultado eleitoral e que a anistia seria uma forma de pacificar o país.

No entanto, críticos apontam que a medida abre um precedente perigoso. Para o deputado Orlando Silva (PCdoB/SP), membro da CCJ, a proposta “é uma provocação e uma afronta à democracia”. Ele destaca que a aprovação dessa matéria representaria a mensagem de que o crime compensa, enfraquecendo o Estado Democrático de Direito.

Além de perdoar os manifestantes, o projeto também abrange aqueles que financiaram ou apoiaram as ações de forma direta ou indireta, inclusive por meio de publicações nas redes sociais. A medida também revoga sanções impostas pela Justiça Eleitoral e Comum, o que, na prática, impede punições para aqueles que violaram a lei ao incitar e apoiar tentativas de golpe de Estado.

Ofensiva contra o STF

Enquanto a proposta de anistia toma forma, o Congresso se prepara para votar projetos que podem limitar drasticamente o poder do STF. A pauta inclui medidas que facilitariam o impeachment de ministros da Suprema Corte, restringiriam as decisões monocráticas (aquelas tomadas por um único ministro) e permitiriam ao Congresso suspender decisões do Tribunal.

Essas propostas são vistas por analistas como uma reação direta ao ativismo judicial do STF, que, sob a liderança do ministro Alexandre de Moraes, tem sido duro na repressão de tentativas de golpe e na proteção da ordem democrática. O Supremo suspendeu recentemente o pagamento de emendas parlamentares por falta de transparência, o que enfureceu alguns parlamentares. Para os apoiadores dessas medidas, o objetivo é frear a “usurpação de competência” do Legislativo pela Suprema Corte, em uma clara tentativa de criar barreiras ao controle judicial sobre as atividades do Parlamento.

A tática da extrema direita

Especialistas em ciência política apontam que a ofensiva contra o STF e a tentativa de anistiar os golpistas de 8 de janeiro fazem parte de uma estratégia mais ampla da extrema direita. A movimentação busca desestabilizar as instituições democráticas, enfraquecer o Judiciário e consolidar um espaço político que permita ações autoritárias no futuro.

Nos bastidores, aliados do bolsonarismo se organizam para dar forma a um novo ciclo de poder, utilizando a narrativa de “perseguição política” e “censura judicial” como combustível para mobilizar sua base. Para eles, limitar o poder do STF é um passo essencial para impedir que futuras decisões da Corte possam barrar iniciativas de interesse da extrema direita.

O futuro da democracia em jogo

As votações desta semana na CCJ são um termômetro importante para medir a força dessas articulações dentro do Congresso. Ainda que a oposição já tenha anunciado a intenção de obstruir a votação da anistia, o clima é tenso, e a base bolsonarista promete continuar pressionando para aprovação dessas pautas.

O risco de tais medidas, se aprovadas, é o enfraquecimento do sistema de freios e contrapesos que sustenta a democracia brasileira. A anistia aos golpistas e as limitações ao STF podem abrir caminho para a escalada de movimentos antidemocráticos e uma maior polarização política.