
‘Eu Sei o Que Vocês Fizeram no Verão Passado’: o legado continua em um retorno morno
O slasher volta com fôlego novo e reverência ao passado, mas com alguns tropeços pelo caminho
Por Hyader Epaminondas
Com o mesmo nome do primeiro filme, Eu Sei o Que Vocês Fizeram no Verão Passado começa com o pé direito ao reconhecer o valor das obras anteriores e reutilizar com inteligência os personagens clássicos na construção de uma nova trama, em vez de recomeçar do zero, descartando todo o histórico da franquia.
No entanto, essa escolha acaba ofuscando o novo elenco, cuja presença se dissolve diante do carisma esmagador dos personagens de legado, com o retorno de Jennifer Love Hewitt e Freddie Prinze Jr.
Apesar da excelente trilha sonora, que resgata o espírito dos anos 90 sem soar anacrônica ao transitar entre o inquietante e o emocional, é difícil lembrar o nome de qualquer um dos novatos. Ainda assim, a dupla principal, Chase Sui Wonders e Madelyn Cline, consegue se destacar dentro dos estereótipos que representa, especialmente Chase, que vem construindo uma carreira cada vez mais sólida e brilhou recentemente em O Estúdio, da Apple TV+.
A proposta dessa sequência parece seguir a mesma lógica dos filmes de terror que marcaram o final dos anos 90, uma geração de slashers que surgiu com o objetivo claro de renovar um gênero esgotado. Na época, franquias como Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo haviam se tornado reféns de continuações cada vez mais absurdas, que afastaram o público com repetições desgastadas e vilões caricatos. Foi nesse cenário que surgiram títulos como Pânico e o próprio Eu Sei o Que Vocês Fizeram no Verão Passado, com um olhar mais metalinguístico, jovem e autoconsciente.
Vivemos uma era em que o terror psicológico domina as telas, investindo em atmosferas densas, personagens fragmentados e tramas repletas de camadas simbólicas, em um cinema de horror que prefere a inquietação maximizada à violência explícita. O retorno do slasher clássico soa quase como um respiro, uma tentativa de diversificar o paladar do público com algo mais divertido, direto e sangrento, ao colocar adolescentes correndo do perigo como baratas tontas.
E nisso o filme acerta, ao não ceder espaço a um drama desnecessário, porém também não tenta em momento algum reinventar a roda ou ter um incentivo vanguardista para conferir qualquer tipo de identidade a essa nova sequência, que investe num argumento sobre saúde mental, culpa e memória coletiva, ainda que tratados de maneira superficial. A metáfora do “verão passado” como uma ferida aberta funciona bem como ponto de partida, mas carece de profundidade narrativa.
Apesar de um início promissor, a sequência acaba tropeçando nos mesmos erros que as produções anteriores buscavam superar. A trama começa bem, introduz os novos personagens e contextualiza as mudanças ocorridas na cidade 27 anos após os assassinatos de Southport. No entanto, logo se perde em reviravoltas pouco convincentes, sustos previsíveis, mortes sem criatividade ou construção cênica e um ritmo irregular, o que compromete seu potencial de renovação no miolo do filme.
Talvez o ponto mais negativo fique por conta de seu antagonista. O assassino do gancho aparece completamente anêmico de representação e carece de qualquer presença ameaçadora ao longo do filme. Suas aparições são espaçadas e sua motivação, embora conectada ao legado da história original, surge de forma medíocre, o que enfraquece o impacto dos assassinatos.
A direção de Jennifer Kaytin Robinson consegue recuperar parte do fôlego no desfecho, quando a revelação do assassino surpreende ao equilibrar o cômico e o trágico. É um mérito das ideias propostas dentro da própria narrativa, que equilibra o novo e o velho com certa harmonia, resgata o interesse e confere força ao clímax, não de forma genial, mas de forma competente o suficiente para instigar a curiosidade por uma possível próxima aventura.
Este terceiro capítulo de Eu Sei o Que Vocês Fizeram no Verão Passado não brilha como um novo clássico, mas acena para um possível futuro em que o slasher pode, mais uma vez, encontrar seu lugar entre os horrores contemporâneos, ou pelo menos como mais uma opção descompromissada nos catálogos do streaming.