Estudo aponta 94 discursos racistas de autoridades públicas nos 3 anos de governo Bolsonaro
Levantamento da Conaq e Terra de Direitos revela que somente um caso teve responsabilização dos envolvidos até o fim de 2021
O levantamento “Quilombolas contra Racistas” aponta que desde 2019 – início da gestão de Jair Bolsonaro (PL) – 94 discursos racistas foram proferidos por autoridades públicas das três esferas da administração pública. O estudo analisou casos expostos pela imprensa e redes sociais de discursos racistas proferidos por autoridades públicas até 31 de dezembro de 2021. Entre os cargos com o maior número de ocorrências estão os representantes de cargos de direção e assessoramento do governo federal (ministros, secretários e presidentes de autarquias).
Até dezembro de 2021, somente um caso teve responsabilização do autor do discurso racista. Sérgio Camargo, atual presidente da Fundação Cultural Palmares, e o presidente Jair Bolsonaro lideram o número de discursos registrados nos três anos do levantamento.
Casos emblemáticos como o do antigo assessor especial para assuntos internacionais do Governo Bolsonaro, Filipe Martins, que durante uma sessão do Senado, em março de 2021, fez um gesto onde buscou reproduzir as letras “W” e “P”, em referência à expressão “White Power” (“Poder Branco”, em inglês), e o do vereador Gilvan da Federal (Patriota-ES) que em novembro de 2021 levou uma Bíblia, detergente e uma esponja à Câmara para limpar o espaço após a benção de mãos de santo, estão no levantamento.
Para a pesquisadora e co-fundadora da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Givânia Silva, os dados representam uma realidade alarmante sobre como tem se manifestado o discurso de ódio racial no Brasil.
“Esses números representam práticas constantes de governos autoritários, racistas e excludentes que usam as instituições públicas para manifestar suas patologias, tipo racismo, homofobia, entre outras. Não podemos mais permitir que tais práticas passem e fiquem impunes. É dever de todo cidadão e cidadã se manifestar contra esses males. Quem se cala colabora e até financia práticas como essas”, destaca a pesquisadora.
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Dados de 2021
Ao todo em 2021 foram registrados 36 discursos racistas proferidos por autoridades públicas. Desse número, 41% dos discursos foram voltados ao reforço de estereótipos racistas – que é quando as falas se baseiam em estereótipos negativos, utilizados historicamente para inferiorizar povos ou justificar processos violentos como a escravidão. Em comparação com 2020, esse tipo de discurso cresceu 33%, ano em que foram identificados 15 casos.
Logo em seguida estão os discursos que negam a existência do racismo com 25% das ocorrências em 2021. Mesmo diante da regressão do número de manifestações racistas do s entre 2020 e 2021 (-14%), todos os meses desde o início do governo de Jair Bolsonaro, em 2019, são registrados casos de autoridades públicas que proferiram discursos racistas.
Para a coordenadora do Programa Quilombola da Terra de Direitos, Vercilene Dias, “além da ação nociva dos discursos das autoridades, práticas racistas têm avançado também no desmonte das políticas públicas da população negra e quilombola no país. A exemplo a baixa execução da política de titulação quilombola e a diminuição de recursos para escolas nos quilombos”.
Os dados completos do levantamento serão divulgados nesta terça-feira, 22 de março, às 18h no canal do Youtube da Terra de Direitos e da Conaq por meio de um debate virtual. Serão discutidos os impactos do discurso racista por autoridades públicas.
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Baixa responsabilização
O vereador Jonathas Gomes de Azevedo (PROS-BA) foi a única autoridade pública responsabilizada por seu discurso. Na ocasião de 30/08/2021 o vereador atacou o deputado estadual Carlos Robson Rodrigues da Silva, o popular “Robinho” (PP) o chamando de “Canalha”, “Bandido”, “Imoral”, “Picareta” e “Desavergonhado em suas redes sociais. Por decisão judicial, Jonathas Gomes foi obrigado a retirar todas suas postagens nas redes sociais com as ofensas expostas sob pena de multa de R$ 1.000,00 por dia e a pagar a quantia de R$ 20 mil reais a título de indenização por danos morais.
A avaliação do estudo é de que a baixa apuração e responsabilização dos fatos tem sido um motivador a mais para a continuidade de práticas racistas nos discursos das autoridades públicas brasileiras. Do total de ocorrências em 2021, 33% delas tiveram algum pedido de apuração dos fatos e/ou responsabilização, seja por meio de abertura de inquérito, ação ou procedimento administrativo contra as autoridades envolvidas; e desses pedidos de providência, somente 1 deles teve algum tipo de responsabilização.
Sobre o Levantamento
O levantamento “Quilombolas contra Racistas” é uma proposta da Terra de Direitos em parceria com a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) idealizada em 2020 a fim de medir o crescimento do fenômeno do discurso racista enquanto ferramenta adotada pelas autoridades públicas. A partir disso, são levantados através de notícias dos principais meios de comunicação, notícias publicadas na internet e redes sociais casos de discursos racistas praticados pelas autoridades públicas. Neste ano, o levantamento recebe uma nova atualização do período de 2021.
Texto via assessorias Terra de Direitos e Conaq. Saiba mais em: www.quilombolascontraracistas.org.br