Estudante autista da UNEB acusa instituição de capacitismo; universitário estuda sem adaptações
Ignorado pela UNEB e sem as adaptações necessárias, Anthony Levy acumula prejuízos em sua saúde mental
Por Rodrígo Olivêira
Um aluno do curso de Direito da UNEB (Universidade do Estado da Bahia) do Campus de Juazeiro, interior da Bahia, acusa a instituição de capacitismo. O estudante Anthony Levy entrou na instituição em 2023 e afirma que desde seu ingresso apresentou todos os laudos e atestados médicos que comprovam estar no Nível 2 de Suporte do Espectro do Autismo.
A UNEB foi procurada pela reportagem para comentar o caso, mas até o momento da publicação dessa matéria não houve resposta.
“Desde o início, apresentei todos os laudos e atestados médicos que comprovam minha condição de autista. Mesmo com essa documentação, a universidade não tomou nenhuma medida para adaptar o ambiente acadêmico às minhas necessidades. Não foram fornecidos materiais didáticos adaptados, nem houve qualquer flexibilização nos prazos de provas e entrega de trabalhos e sequer suporte dos professores. Essa falta de consideração já seria grave por si só, mas a situação se agrava com a atitude discriminatória dos professores e da administração, a partir do momento que tinham ciência da minha condição e negligenciaram.”
Com todo esse tratamento que ignora as necessidades do aluno, tornando-se uma barreira para o bom andamento de seus estudos, Anthony precisou de licença médica em duas oportunidades durante o seu primeiro semestre de 2024.
“Toda essa situação me deixou doente e passei por dois períodos de afastamento por motivos de saúde mental, fiz diversos requerimentos solicitando adaptações, suporte pedagógico e atividades domiciliares. Todos esses pedidos foram ignorados, embora a UNEB tenha DEFERIDO o pedido. Quando retornei do primeiro afastamento, fui forçado a fazer as mesmas provas que os demais alunos, que estiveram acompanhando as aulas presencialmente. Não houve qualquer tentativa de adaptação ou de oferecer suporte acadêmico.”
De acordo com ele, toda essa situação tem lhe causado prejuízos em sua saúde, e que ele nunca havia enfrentado antes, como: fobia social e piora clínica. Além disso, o aluno teve que arcar com um gasto de mais de R$1.500,00 (hum mil e quinhentos reais) em terapias e consultas médicas, como forma de lidar com o impacto negativo da negligência da UNEB em sua vida.
Reunião com o colegiado
Recentemente Anthony afirma ter tido reunião com o Colegiado e a Gestão da Universidade. Segundo o estudante, ficou evidente a resistência dos professores em adotarem medidas de inclusão necessárias.
“Descobri que meu relatório, detalhando minhas necessidades e solicitações, foi lido por apenas um professor. Esse descaso é uma clara demonstração de preconceito e discriminação, evidenciando a falta de comprometimento da instituição com a inclusão e o respeito aos direitos dos estudantes com deficiência. Inclusive, me comunicando com alguns professores, vi que eles não tinham ciência dos meus requerimentos, uma inclusive disse que nunca teve acesso aos meus relatórios, por isso não fez NADA.”
Conversas com a coordenação
Em conversas entre Anthony e a Coordenação do Curso, obtidas com exclusividade pela Mídia NINJA para o Estudantes NINJA, há o reconhecimento da Coordenação, de que essa situação vivida pelo universitário e a estrutura da UNEB não é a ideal. E que, mesmo assim, a Coordenação irá convocar os professores para trabalhar com o que têm em mãos.
Além disso, pelas conversas trocadas com a Coordenação, há o reconhecimento de que todos os professores estavam cientes do relatório assim que Anthony se matriculou.
Confira prints da conversa:
Outros casos
A situação de Anthony Levy não é a única da UNEB. Em junho de 2023 foi noticiado no G1 Bahia que o estudante Diego Reis Martins, do curso de Medicina e também Autista, acusou a instituição de falta de inclusão. De acordo com a mãe Denise Reis, ainda pro G1 Bahia, ela desabafa dizendo que:
“Um professor falou em sala que aquele não era um lugar para pessoas que não falam, e que um médico tem que falar. Uma professora não deixou ele usar um aparelho e disse que ele só usaria se tivesse um monitor na sala. Como não tinha esse monitor, todo mundo usou e ele não”, desabafou a mãe.
Diante da situação, a reportagem do G1 Bahia ainda diz que, à época, o MPBA (Ministério Público do Estado da Bahia) apurava a denúncia desde setembro de 2022. No entanto, em março deste ano, em reportagem do Jornal Atarde, o MPBA recomendou que fossem feitos ajustes para que o aluno Diego fosse reintegrado ao curso de medicina em 30 dias.
Direitos
De acordo com o art. 3º, inciso IV, alínea “a” da Lei 12.764/2012 (Lei Berenice Piana), que trata da Política Nacional de Proteção de Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, estabelece que a Pessoa Autista tem Direito ao acesso à educação e ensino profissionalizante.
Além disso, na mesma lei, em seu art.1º, parágrafo 2º, a Pessoa Autista é considerada Pessoa com Deficiência para todos os efeitos legais. Portanto, em virtude desse dispositivo legal da Lei 12.764/2012, há mais uma Lei que ampara as Pessoas com Deficiência, logo, estendida aos autistas: a Lei 13.146/2015 (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência).
Em seu art.28, inciso III e XIII, do Estatuto da Pessoa com Deficiência, é estabelecido que haja:
III – projeto pedagógico que institucionalize o atendimento educacional especializado, assim como os demais serviços e adaptações razoáveis, para atender às características dos estudantes com deficiência e garantir o seu pleno acesso ao currículo em condições de igualdade, promovendo a conquista e o exercício de sua autonomia;
(…)
XIII – acesso à educação superior e à educação profissional e tecnológica em igualdade de oportunidades e condições com as demais pessoas.