Em um encontro com deputados e senadores da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), mais conhecida como a Bancada do Agro, Jair Bolsonaro declarou “o governo é de vocês”, referindo-se aos congressistas presentes. A frase foi dita durante um café da manhã, realizado no Palácio do Planalto, ainda no começo de seu mandato como presidente, e resumiu bem como seriam seus anos de governo. 

Peça fundamental na base de sustentação do governo Bolsonaro, a FPA consegue, com facilidade, impor suas pautas, acelerando o desmonte de políticas socioambientais consagradas nas últimas três décadas.

O poder do Agro 

De acordo com relatório feito pelo observatório De Olho nos Ruralistas, chamado “Os Financiadores da Boiada: como as multinacionais do agronegócio sustentam a bancada ruralista e patrocinam o desmonte socioambiental”, foi criado, em 2011, o IPA (Instituto Pensar Agro), com o propósito de prestar assessoria técnica na formulação de pautas legislativas para a FPA.

O IPA é mantido com verbas mensais pagas por 48 entidades de classe do agronegócio. Somando os associados de todas as entidades financiadoras, são 1.078 empresas e mais de 69 mil associados individuais, entre sojicultores, pecuaristas, usineiros e algodoeiros.

Com as contribuições, o Instituto organiza as demandas da cadeia agropecuária brasileira junto ao Legislativo, Executivo e Judiciário, intermediando o contato de empresas e associações com parlamentares e representantes do governo.

Apesar de não ser ilegal no país, a história do lobby do agronegócio no Brasil é, sobretudo, uma história de privilégio no acesso aos espaços de poder. Enquanto indígenas, camponeses e quilombolas são excluídos das discussões que impactam seu direito à vida e ao território, o poder econômico, por trás do agronegócio, segue impondo pautas que poderão acentuar a grave crise socioambiental enfrentada pelo Brasil na atualidade.

Para se ter uma ideia da disparidade, no dossiê feito pelo De Olho nos Ruralistas, foi apontado que, durante o governo de Jair Bolsonaro, empresas e políticos do Agro se reuniram, pelo menos, 160 vezes com servidores do Ministério da Agricultura, incluindo 20 audiências com a ministra Tereza Cristina, ex-presidente da FPA.

De acordo com o relatório, além do Ministério da Agricultura, executivos do IPA e parlamentares da FPA estiveram em reuniões oficiais com as pastas de Economia (33), de Meio Ambiente (4), de Justiça e Segurança Pública (1) e de Educação (1).

Também, foram realizados três encontros com o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, e um com o presidente Jair Bolsonaro, em 4 de julho de 2019.

Bolsonaro se reuniu, pelo menos, 160 vezes com empresas do Agro, enquanto movimentos sociais do campo foram recebidos em apenas duas oportunidades pelo ex-presidente

Nesse mesmo período, movimentos sociais do campo foram recebidos em apenas duas oportunidades, enquanto os movimentos indígenas, como a Associação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), não foram ouvidos nenhuma vez.

Foto: Mídia NINJA

Tereza Cristina (PP-MS) pertence a uma longa linhagem de latifundiários da região Centro-Oeste e possui relações diretas com a JBS, com a qual possuía uma dívida de R$14 milhões, oriunda do arrendamento de uma propriedade. Durante sua passagem pela Secretaria de Desenvolvimento Agrário e Produção de Mato Grosso do Sul, ela concedeu incentivos fiscais ao frigorífico. Sob a gestão de Tereza Cristina, lobistas do IPA tornaram-se presença constante no Ministério.

Outro nome que merece destaque, na pasta “ambientalista” de Bolsonaro, é o de Ricardo Salles. O autor da famosa frase “Precisa ir passando a boiada” foi ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro e proferiu essas palavras a portas fechadas, em Brasília, no ano de 2020, durante uma reunião entre o presidente e seus ministros.

A frase referia-se à retirada de obrigações socioambientais, usando a pandemia do COVID-19 como distração para aprovar o “Combo da Morte”, um conjunto de Projetos de Leis defendido pelos ruralistas, na época, como PLs 2.633/20 e 510/21, da Grilagem, o PL 2.159/21, que flexibiliza as regras de licenciamento ambiental ou o PL 6.299/02, do Veneno, que foi aprovado em 2022.

No comando do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ricardo Salles foi um dos responsáveis por alguns dos piores índices de desmatamento e queimadas da história do país. Em 2019 e 2020, o Brasil registrou as piores taxas de destruição da Floresta Amazônica, desde 2008. Ao todo, quase 21 mil quilômetros quadrados de mata desapareceram enquanto Salles esteve no cargo.

No Brasil, não é ilegal que políticos se reúnam com empresas, para ouvir as demandas do setor privado. Entretanto, a diferença entre o número de oportunidades dadas a esse setor em comparação às que são oferecidas aos movimentos da sociedade é destoante.

Enquanto o poder privado, graças à vantagem econômica, tem facilidade de acesso, movimentos sociais – em especial os do campo – dificilmente são ouvidos, e isso se acentuou, ainda mais, quando Bolsonaro foi eleito, visto que seu discurso e posicionamentos sempre foram a favor das empresas e empresários, enquanto indígenas, camponeses, quilombolas e ambientalistas, sempre, foram vistos como inimigos.

O relatório completo você encontra aqui: Os-Financiadores-da-Destruicao-2022-ptbr.pdf 

Com informações do De Olho nos Ruralistas.