Por maioria de votos, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (25) descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal. O julgamento, que se arrastava por nove anos devido a sucessivas suspensões, finalmente chegou ao fim, embora o número exato de juízes que votaram a favor e contra ainda não tenha sido oficialmente divulgado.

O que muda com a decisão

Apesar da descriminalização, o porte de maconha continua sendo considerado um comportamento ilícito. Isso significa que fumar em público permanece proibido. No entanto, as punições para os usuários passam a ter natureza administrativa, e não criminal. Isso elimina a possibilidade de registro de reincidência penal e o cumprimento de prestação de serviços comunitários.

A quantidade de maconha que deve caracterizar uso pessoal e diferenciar usuários de traficantes será definida na sessão de hoje (26). Os votos já proferidos sugerem que a medida ficará entre 25 e 60 gramas ou seis plantas fêmeas de cannabis.

Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Entenda o julgamento

O Supremo julgou a constitucionalidade do Artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006). A norma prevê penas alternativas, como prestação de serviços à comunidade, advertência sobre os efeitos das drogas e comparecimento obrigatório a curso educativo, mas deixou de prever a pena de prisão, mantendo a criminalização. Usuários de drogas ainda eram alvos de inquérito policial e processos judiciais para cumprimento das penas alternativas.

A maioria dos ministros decidiu manter a validade da lei, mas entendeu que as punições previstas contra usuários não possuem natureza criminal.

Não é legalização

Durante a sessão, o presidente do Supremo, ministro Luís Roberto Barroso, ressaltou que a decisão não trata da legalização da maconha, e que o consumo continua sendo uma conduta ilícita.

“Em nenhum momento estamos legalizando ou dizendo que o consumo de drogas é uma coisa positiva. Pelo contrário, nós estamos apenas deliberando a melhor forma de enfrentar essa epidemia que existe no Brasil e que as estratégias que temos adotado não estão funcionando porque o consumo só faz aumentar e o poder do tráfico também”, afirmou Barroso.

Votos

O julgamento começou em 2015, quando o relator, ministro Gilmar Mendes, votou pela descriminalização do porte de qualquer tipo de droga. No entanto, após os votos dos demais ministros, Mendes restringiu a liberação somente para a maconha, com fixação de medidas para diferenciar consumo próprio e tráfico de drogas.

Em seguida, Luís Roberto Barroso entendeu que a posse de 25 gramas não caracteriza tráfico, ou o cultivo de seis plantas fêmeas de cannabis.

Foto: Gian Martins / Mídia NINJA Credit: Foto: Gian Martins / Mídia NINJA

Após pedidos de vista que suspenderam o julgamento, em agosto do ano passado, o ministro Alexandre de Moraes propôs a quantidade de 60 gramas ou seis plantas fêmeas. A descriminalização também foi aceita pelo voto da ministra Rosa Weber, que está aposentada.

Em março deste ano, os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça e Nunes Marques defenderam a fixação de uma quantidade para diferenciar usuários e traficantes, mas mantiveram a conduta criminalizada, conforme a Lei de Drogas. Novamente, o julgamento foi suspenso por um pedido de vista do ministro Dias Toffoli.

Na semana passada, o julgamento foi retomado com o voto de Toffoli, que abriu uma terceira via. Para o ministro, a Lei de Drogas é constitucional e já descriminalizou o porte. No entanto, Toffoli sugeriu dar prazo para o Congresso definir a quantidade para diferenciar usuário e traficante.

Na sessão de ontem, Toffoli esclareceu seu voto e disse que está com a maioria contra a descriminalização. Em seguida, Luiz Fux e a ministra Cármen Lúcia também votaram pelo reconhecimento da descriminalização.

Repercussão entre especialistas e organizações de direitos humanos

Especialistas e organizações de direitos humanos têm expressado diferentes opiniões sobre a decisão. Muitos veem a descriminalização como um avanço significativo para reduzir a superlotação das prisões e combater a discriminação racial. Por exemplo, a Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ) defendeu a necessidade de critérios objetivos para diferenciar uso pessoal de tráfico, destacando as variações significativas nas interpretações de diferentes autoridades policiais​.

Próximos passos

A definição sobre a quantidade de maconha que deve caracterizar uso pessoal será essencial para a implementação prática da decisão. A expectativa é que o STF conclua essa parte do julgamento hoje, estabelecendo parâmetros claros que diferenciem usuários de traficantes.