
Encontro Nacional de Agroecologia 2026 será em região marcada por lutas fundiárias e ambientais
Realização do evento em Foz do Iguaçu (PR) joga luz nas experiências agroecológicas e nos conflitos socioambientais do território
O 5° Encontro Nacional de Agroecologia (ENA) acontecerá em Foz do Iguaçu (PR), no primeiro semestre do ano que vem. Será a primeira vez que um ENA é realizado em um estado do Sul do país. A última edição foi há sete anos, em Belo Horizonte (MG). De 2018 para cá, houve mudanças significativas tanto no cenário político como ambiental, e o encontro terá o papel de engajar, realinhar e impulsionar o movimento agroecológico e suas experiências por todo o Brasil.
A intenção é identificar e estimular as estratégias que buscam superar o sistema agroalimentar vigente e fortalecer a perspectiva agroecológica na sociedade. A cada dia, fica mais explícita a capacidade que as iniciativas de agroecologia têm de projetar um futuro melhor, principalmente quando se trata de garantir alimentação saudável à população e gerar renda, ao mesmo tempo em que conservam o solo e o ambiente.
Desde 2002, a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) tem uma história de realização de grandes encontros. Assim como nas quatro edições anteriores, a preparação do 5º ENA será um amplo processo de mobilização, formação e construção de conhecimento no território onde ocorrerá o evento, mas também em todas as outras regiões brasileiras, que participarão da organização, da programação e do envio de delegações estaduais.
O início deste processo em Foz do Iguaçu aconteceu nos dias 13 a 15 de maio, em um encontro nacional que contou com a participação de organizações e redes de agroecologia que fazem parte ANA, incluindo representantes de movimentos sociais, de povos indígenas, de quilombolas e de comunidades tradicionais de diferentes regiões do Brasil. Vale destacar a presença de integrantes de instituições e redes que atuam na região Sul, como a Rede Ecovida de Agroecologia, a Fundação Luterana de Diaconia (FLD), o Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo (Cepagro), a Articulação Paranaense de Agroecologia (APRA), a Rede Sementes da Agroecologia (ReSa), a Terra de Direitos, o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), o Movimento das Mulheres Camponesas (MMC) e o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST).
Uma das missões da primeira reunião preparatória para o 5º ENA foi entender a incidência de ações e temas que estão conectados com a perspectiva agroecológica em toda a região Sul e, em particular, na cidade de Foz do Iguaçu. O território é marcado por conflitos fundiários e violações constantes de direitos dos povos indígenas, com situações agravadas pela presença de fazendeiros e pela omissão do Estado. Por ser um dos maiores polos do agronegócio no Brasil, revela os limites do modelo agrícola baseado na exploração intensiva – com vastas áreas de monocultura de soja e milho, uso excessivo de agrotóxicos e destruição da biodiversidade – que coloca em risco a saúde humana e ambiental.



Para Flavia Londres, integrante da secretaria executiva da ANA, a atuação sólida de redes de agroecologia na região Sul, o histórico de lutas fundiárias e ambientais, os conflitos envolvendo povos indígenas no Oeste do Paraná, assim como a experiência da cidade com a transição energética, tornam o território de Foz do Iguaçu um ambiente não só interessante, como necessário para a realização do próximo ENA.
Jaqueline Andrade, advogada popular da organização Terra de Direitos, acompanha conflitos territoriais e ambientais no Paraná que foram motivados pelo desmatamento da Mata Atlântica e pelo avanço do agronegócio. “Somos um dos estados que mais produz soja, com exportação no Porto de Paranaguá, e com isso também houve grandes violações e violências contra os povos e comunidades tradicionais, os povos indígenas e quilombolas que vivem aqui”, explica.
Outra questão apontada por Andrade diz respeito aos problemas causados pela construção da Usina Itaipu, que expropriou grande parte das terras indígenas e alagou aldeias. “Até hoje esses indígenas reivindicam a demarcação dos seus territórios”, lembra a advogada. Andrade destaca ainda a importante luta de Keno na região de Foz do Iguaçu. Valmir Mota de Oliveira, conhecido como Keno, denunciou e enfrentou a produção de sementes transgênicas dentro do Parque Nacional pela grande empresa transnacional Syngenta, e foi violentamente assassinado em 2007.
Na avaliação de Carlos Eduardo Leite, integrante do núcleo executivo da ANA, estar no Sul tem um significado muito importante para a caminhada regional na agroecologia. “A prioridade do 5° ENA é partir de nossas experiências. E se o protagonismo dessas experiências é de agricultoras/es, esses são os sujeitos da nossa construção política”, afirmou Leite.
Já Paulo Petersen, que também integra o núcleo executivo da ANA, ressaltou que as experiências agroecológicas são formas, dentro do capitalismo, de fazer uma economia não-capitalista. “Foz do Iguaçu agora é nosso chão comum, e estamos falando de um território de alta densidade histórica e lutas sociais. O 5° ENA em Foz do Iguaçu será um ENA de integração e resistência”, concluiu.
Para Sandra Rocha Rodrigues, do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) e integrante da comissão organizadora local do V ENA, a diversidade de povos presente na tríplice fronteira entre o Brasil, Paraguai e Argentina é outro ponto a ser destacado. “A região tem dois quilombos, uma Terra Indígena (TI), um novo processo de aquilombamento, inúmeras cooperativas e uma grande trajetória de resistência numa área de conflitos históricos pela terra e preservação ambiental. Em Foz do Iguaçu, há a presença de povos indígenas que incluem os Avá Guarani, em áreas próximas à cidade, e o território da Terra Indígena (TI) Tekoha Guasu Guavira”.
Segundo Jhony Alex Luchmann, integrante da Rede Ecovida, da FLD e também da comissão local de organização do ENA, além da possibilidade de articulação dos sujeitos que constroem cotidianamente a agroecologia no território, há na região uma relação muito positiva com o Movimento Agroecológico da América Latina e Caribe (MAELA). Luchmann acrescenta que o fato de a cidade estar situada na tríplice fronteira facilita ainda a participação de caravanas internacionais, ampliando o alcance e a representatividade do evento.