Ao todo, cerca de 500 mil pessoas no Amazonas, no Acre e em Rondônia foram afetadas pela seca extrema. Só no Amazonas, quase 60 municípios estão em situação de emergência decretada pelo governo estadual.

Especialistas afirmam que a seca e o calor intensos são causados pela combinação de dois fatores: o El Niño, um fenômeno climático natural que aquece as águas do Oceano Pacífico, e o aquecimento global, provocado pela ação humana. 

“Tem uma probabilidade altíssima desse El Niño continuar nos próximos meses e até para o próximo ano. Isso indica que agora ele está ganhando força e que os efeitos que normalmente acontecem quando estamos vivendo o El Niño podem piorar. Então, a tendência é que a seca piore na Amazônia”, diz Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).

Segundo dados do Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), ligado ao governo federal, que foram cedidos ao g1, oito estados das regiões Norte e Nordeste enfrentam neste ano a pior seca desde 1980 por causa da falta de chuvas: Amazonas, Pará, Acre, Amapá, Maranhão, Piauí, Bahia e Sergipe.

“As pessoas ainda estão queimando a floresta, sabemos que tudo isso tem consequências de várias maneiras” Ashaninka Benki Pyãko

Seca no rio Madeira, em Porto Velho — Foto: Tiago Frota/Rede Amazônica

Com intensa estiagem, pelo menos 17 mil pessoas já foram afetadas por desabastecimento de água em Rio Branco. As altas temperaturas e a seca do Rio Acre, que chegou a ficar abaixo dos dois metros, dificultam o abastecimento de água em bairros da zona urbana e mais ainda na zona rural, já que o abastecimento da área é feito exclusivamente pelo Rio Acre.

“Nós estamos já fechando um convênio com o Ufac e a UnB para que a gente faça um estudo de solo. A gente não pode depender somente do Rio Acre. Se depois desse estudo ficar constatado que não tem água no solo de Rio Branco, vamos ter que pensar num outro plano para acumular água para poder usar no verão”, afirmou Enoque Pereira, diretor-presidente do Serviço de Água e Esgoto de Rio Branco (Saerb).

O Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) autorizou o governo a acionar duas usinas termelétricas para garantir o fornecimento de energia no Acre e em Rondônia, onde a situação também está delicada. 

Para além da capital do Acre, às margens do rio Amônia, a mortandade dos peixes viralizou nas redes sociais e chamou a atenção para o problema das altas temperaturas das águas. 

“A gente passou três meses e alguns dias sem dar uma chuva e a água esquentou muito. A água é muito quente”, afirmou o barqueiro José Mendes, para a equipe da Amazônia Real.“Tinha muito peixe morto e morreu muito, não é só aqueles do vídeo, morreram muito mais peixes”, complementou.

Comunidade Vai quem quer, no rio Amônia, sofre com as queimadas (Foto: Reprodução redes sociais).

Além do período de seca e do El Niño, a ação humana de destruição também está prejudicando as populações da Amazônia. Desde o início do mês de setembro o líder indígena Ashaninka Benki Pyãko tem denunciado em suas redes sociais a mortandade dos peixes que se estendeu por grande parte do rio Amônia, incluindo a Terra Indígena, a Aldeia Apiwtxa.

“As pessoas ainda estão queimando a floresta, queimando as fazendas de gado. E sabemos que tudo isso tem consequências de várias maneiras”, afirma Ashaninka.

O governo do Acre divulgou uma nota informando que a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) está acompanhando a mortandade dos peixes no rio Amônia.

“Infelizmente não é um caso isolado e outros estados da Amazônia também enfrentam a mesma situação, que vem sendo debatida na Sala de Crise da Região Norte, da Agência Nacional de Águas (ANA), a qual integramos por meio da nossa Sala de Situação, com monitoramento hidrometeorológico, da qualidade do ar, queimadas e outros”, diz a nota.

Seca faz usina suspender geração de energia em Rondônia

Rio Madeira atinge a cota de 15 metros em Porto Velho. Foto: Defesa Civil/ Porto Velho

A baixa vazão do Rio Madeira levou a Usina Hidrelétrica de Santo Antônio suspender temporariamente suas atividades. A decisão foi tomada em alinhamento com o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a Agência Nacional de Águas (ANA) e o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama).

Em comunicado, a empresa disse que os níveis de vazão do rio estão 50% abaixo da média histórica.

“Vamos realizar duas dragagens emergenciais nos rios Solimões, Amazonas e Madeira, para garantir a navegabilidade e garantir a chegada de insumos”, revelou Renan Filho, Ministro dos Transportes.

Nos municípios com situação de emergência decretada, o governo federal vai antecipar para o próximo dia 19 o pagamento do Bolsa Família e do Benefício de Prestação Continuada (BPC). 

Agricultores do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) que tiveram perda de produção terão direito ao pagamento do seguro integral.

Vice-Presidente Geraldo Alckmin visita áreas atingidas pela forte estiagem na região de Catalão (AM). Foto: Cadu Gomes/VPR

Em visita às regiões que estão sofrendo por conta da seca, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, afirma que o cenário é preocupante e assustador.

“O impacto ambiental é tremendo, assustador. Ibama, ICMBio e instituições de pesquisa trabalham na região. Estamos fazendo ação emergencial em relação aos botos e tucuxis que estão sendo ferozmente atingidos”, informa.

Um levantamento feito pelas equipes que atuam na região estima que a seca “pode afetar 500 mil pessoas nos estados do Amazonas, Rondônia e no Acre”, informou Marina Silva.

O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, também visitou áreas afetadas pela seca e, acompanhado por uma comitiva de ministros, Alckmin desembarcou em Manaus. O vice-presidente garantiu que “não faltarão recursos [do governo federal]. Quem tiver necessidade vai encaminhando pra gente poder, dentro da lei, liberar os recursos o mais rápido possível e atender à população.”