Por Igor Serrano, para Cobertura Colaborativa Paris 2024

Uma notícia no final de julho abalou o mundo do futebol e talvez não tenha ecoado o quanto poderia, ofuscada pelo noticiário esportivo voltado para os Jogos Olímpicos de Paris. O Girondins de Bordeaux, fundado em 1881 e um dos clubes mais tradicionais do país-sede, anunciou oficialmente o encerramento de suas atividades profissionais. Hexacampeão francês e vencedor de três Copas da França, o Bordeaux se encontrava em crise administrativa-financeira desde sua venda para Gérard López Fojaca.

O clube foi o segundo da carreira de Zidane (1992-1996) e revelou mais recentemente os vice-campeões do mundo de 2022 pela Seleção Francesa, Jules Koundé e Aurelien Tchouameni. Apesar de ser o sétimo maior campeão francês de todos os tempos (atrás apenas de Paris Saint-Germain, Olympique de Marselha, Saint-Étienne, Monaco, Nantes e Lyon), quase foi rebaixado na temporada 2020/2021 como punição por má-gestão diante dos constantes atrasos de pagamentos. Com a mudança de proprietário, havia esperança de que o cenário mudasse, ainda mais pelo fato de o empresário Gerard López ter sido dono de outro clube francês, o Lille. Entretanto, não foi o que aconteceu. Na temporada seguinte, em uma pífia campanha, com a defesa sofrendo incríveis 91 gols, aconteceu o rebaixamento em campo, em maio de 2022.

Time do Bordeaux campeão da temporada 1949/1950 | Foto: Girodins

Na temporada 2022/2023 o time terminou na terceira colocação da Segundona Francesa (Ligue 2) e não conseguiu o acesso. Na edição seguinte (2023/2024), o desempenho da equipe piorou drasticamente e resultou no décimo segundo lugar e na garantia de mais um ano longe da divisão principal. Mas o que já era ruim, ficaria ainda pior. Após o encerramento do campeonato, a Liga reprovou as contas do Bordeaux e como punição determinou seu rebaixamento da segunda para a terceira divisão.

Com a decisão, um cenário bem diferente a que estava acostumada aguardaria a equipe do sudoeste da França. A Terceirona (Championnat National) do país é jogada tanto por clubes profissionais quanto amadores. Quem é rebaixado para ela, perde o status de profissional. A intenção inicial da diretoria seria ingressar com um recurso e solicitar a suspensão da mudança de perfil por dois anos, enquanto se buscasse um novo interessado em adquirir sua propriedade e assim quitar as dívidas de cerca de 40 milhões de euros. 

Gourcuff, Cavenaghi e Chamakh comemoram gol do Bordeaux em 2009 | Foto: Getty Images

Com o insucesso nas negociações com o grupo estadunidense Fenway Sports Group (FSG), controlador do Liverpool, optou-se, no entanto, por um recomeço do zero. Antes mesmo da Direção Nacional de Controle de Gastos emitir um parecer, o clube foi mais uma vez rebaixado, chegando à quarta divisão (Championnat National 2), por não conseguir apresentar uma previsão de receitas e despesas para a temporada 2024/2025. 

Como consequência, o Bordeaux anunciou o fim de suas atividades profissionais na última semana de julho e todos os jogadores e jogadoras dos elencos masculino e feminino foram liberados de seus contratos, o centro de treinamentos fechado e os jovens das categorias de base dispensados. A situação do clube francês se assemelha à experimentada por outros tradicionais do continente europeu, como os italianos Napoli, Parma e Fiorentina e o escocês Rangers, em um passado recente. 

Na opinião de Fernando Monfardini, autor do livro “Compliance no futebol”, o desfecho do Bordeaux poderia ter sido evitado. Em entrevista ao Ninja Esporte Clube, ele lembrou que o caso é mais um em que os gastos sobem mais que a receita e a ponto de não se conseguir manter uma governança que concilie competitividade e sustentabilidade financeira. O advogado acredita que “um sistema de integridade ajudaria o clube em tomadas de decisão mais informadas e com uma visão mais ampla dos riscos que impactariam negativamente a sustentabilidade financeira”.

Equipe feminina do Bordeaux em duelo com o PSG pela temporada 2022/2023 | Foto: Girodins

Por falar em futebol francês, a seleção anfitriã feminina encerrou precocemente sua participação nos Jogos Olímpicos nas quartas de final, ao ser vencida pelo Brasil por 1×0. Já no masculino, derrota para os espanhóis por 5×3 e medalha de prata, na final disputada na última sexta-feira (09/08).