Em 2021, 80% de assassinatos por conflito no campo ocorreram na Amazônia
Relatório da CPT indica que 28 das 35 mortes registradas ocorreram na região, principalmente por conta de dois massacres: em um Rondônia e outro em Roraima
Com Bolsonaro à frente do país, houve um aumento na média histórica de conflitos por Terra nos últimos dez anos. Os números superam os do governo de Dilma Roussef e Michel Temer: foram 1.908 conflitos contra 1.349 e 1.526 dos governos de Dilma e Temer, respectivamente.
Estes são alguns dos dados apresentados na coletiva de imprensa da Comissão Pastoral da Terra que apresentou nesta segunda-feira (18), o relatório Conflitos no Campo Brasil 2021. A publicação reúne dados sobre os conflitos e violências sofridas pelos trabalhadores e trabalhadoras do campo brasileiro, bem como indígenas, quilombolas e demais povos tradicionais do campo, das águas e das florestas.
É por isso que a CPT registra os conflitos em três eixos principais: Água, Terra e Trabalhista. Foram 1.768 conflitos nos três eixos, em 2021. Ao todo 897.335 pessoas estiveram envolvidas. Com isso houve uma média de 4,84 ocorrências de conflitos no campo por dia em 2021.
De acordo com coordenador do Cedoc-CPT, Tales dos Santos Pinto, que apresentou alguns dos principais dados de 2021, a ascensão dos conflitos ocorre de maneira mais acentuada na Amazônia Legal, que registrou 641 conflitos, o que corresponde a 49,9% do total de conflitos por terra; 124 por água (40,78%) e 54 conflitos trabalhistas ou de trabalho escravo (31,95%).
Analisados os números da violência contra a ocupação e a posse, mais uma vez a região da Amazônia Legal é a mais atingida. Segundo o relatório, 77,9% das famílias foram afetadas pelo desmatamento ilegal; 87,2% pela expulsão; 81,3% das famílias afetadas por grilagem e 82,2% por invasões.
Também os assassinatos estão concentrados de forma gritante na Amazônia Legal, como aponta o documento do CPT. Em relação à violência contra a pessoa, 80% de assassinatos por conflito no campo aconteceram na Amazônia: 28 das 35 mortes ocorreram na região.
O levantamento aponta dois massacres. Um, em Rondônia e outro, em Roraima.
O primeiro deles ocorreu no Acampamento Ademar Ferreira, área vinculada à Liga dos Camponeses Pobres, onde três acampados foram assassinados pelo Batalhão de Operações Especiais de Rondônia com a Força Nacional de Segurança.
Há registros de mais cinco assassinatos a pessoas ligadas à entidade, o que demonstra uma operação de caça a essa organização.
Na apresentação do relatório também foi destacado o massacre de indígenas isolados Moxihatëtëma, na Terra Indígena Yanomami. Segundo a CPT, eles foram assassinados no enfrentamento do garimpo. A denúncia chegou ao MPF que descobriu flecha decorrente do conflito e então, houve a identificação. Ao todo, três indígenas foram assassinados. Segundo a metodologia da CPT, se três ou mais pessoas foram assassinadas no mesmo dia e na mesma ocorrência, é considerado massacre.
Aumento de assassinatos
Segundo a CPT, houve um aumento de 75% nos assassinatos, mais de 1.000% nas mortes em consequência de conflitos. Os dois massacres citados e aumento de trabalho escravo no campo marcaram o ano de 2021.
De acordo com os dados do Centro de Documentação da CPT – Dom Tomás Balduino (Cedoc-CPT), foram registrados 35 assassinatos em conflitos no campo no ano de 2021. Um aumento de 75% em relação a 2020, quando foram registrados 20 assassinatos.
Conforme tendência demonstrada nos dados parciais divulgados em dezembro passado pela CPT, em 2021 houve um aumento de 1.100% nas mortes em consequência de conflitos no campo. Das 109 mortes registradas em 2021, contra 09 registradas em 2020, 101 ocorreram no território Yanomami, em Roraima, em decorrência da ação de garimpeiros. Além disso, outras violências como Trabalho Escravo tiveram aumento em 2021. O número de resgatados dessa prática mais que dobrou no campo no último ano. Os casos aumentaram 76%.
O presidente da CPT, Dom José Ionilton destacou à ocasião da divulgação dos dados, a importância da imprensa, em “divulgar para o Brasil e para o mundo a dura, dolorida e injusta realidade da violência do campo em nosso país” e que no andar da carruagem, seria utopia, mas que sonha com o dia em que não será preciso divulgar tal relatório.
“A CPT foi criada em 1975, nascemos e existimos para cuidar da vida, nossas agentes e nossos agentes dão a vida para quem vive no campo, florestas e águas, possam ter vida, possam ser respeitados nos seus direitos de viver onde estão. A CPT atua na busca do bem comum, junto a camponeses e camponesas, tantas vezes ameaçados pelo capitalismo selvagem, agronegócio, mineradoras, madeireiras e garimpo ilegal”.
E ainda, que “impressionam os dados da violência no campo, tantas mortes, ameaças, ações judiciais injustas de despejo, de quantas pessoas sofreram algum tipo de violência”.
A CPT realiza mapeamento de dados para realizar o relatório. A metodologia trata o conflito em uma relação de disputa, pela terra, pelo território entre os agentes causadores desses conflitos, geralmente os latifundiários, mas também, ações de resistência. Essa relação entre o opressor e oprimido é que se resulta no conflito no campo. E dentro dele, é registrada a violência, seja contra as famílias como um todo, seja contra a pessoa.
“Trabalhamos com fontes primárias, oriundas dos agentes pastorais que estão nas comunidades, esses relatos são encaminhados, documentos oficias e clipagem de imprensa, que nos dá a dimensão dos conflitos por todo o país”, informa a coordenação.