Em entrevista à NINJA Esporte Clube, Leandro Shimba, médico ortopedista com passagem pela da Seleção Brasileira, explica as razões pelos altos número de lesões e fala como deve ser o processo de recuperação

Walsh, da Inglaterra, deixou o jogo contra a Dinamarca sentindo dores no joelho — Foto: REUTERS/Jaimi Joy

Por Morgana Américo e Sarah Américo

As constantes lesões que tem acontecido na Copa do Mundo Feminina de 2023, tem preocupado as equipes. Antes mesmo do torneio começar, algumas jogadoras já foram cortadas por causa de trauma, que podem ser mais fáceis de solucionar, mas também podem exigir meses de recuperação.

As lesões, já acabaram com o sonho de vários atletas, que deixaram de ser convocadas por não estarem em condições e nem conseguir se recuperar. Outras, até mesmo chegaram a viajar para Austrália, como Nycole Raysla, da Seleção Brasileira, contudo, precisou ser substituída por Angelina, após sofrer uma nova entorse de tornozelo durante um jogo-treino três dias antes da competição começar e sete dias antes do Brasil estrear. Para além do Brasil, França, Inglaterra, Austrália e Alemanha também estão desfalcadas.

Esse cenário leva aos seguintes questionamentos: é possível recuperar uma jogadora a tempo dela ir para ou Mundial ou permanecer nele? O que se deve fazer para prevenir os riscos de lesões? Em entrevista à NINJA Esporte Clube, o médico ortopedista Leandro Shimba, que tem passagem na Seleção Brasileira, explica como as coisas funcionam durante as competições, o que precisa ser feito para evitar as lesões e o que provoca essas contusões de acabam ou afastam o sonhos das jogadoras de disputar a principal competição do futebol: a Copa do Mundo.

Qual o procedimento e o tratamento para recuperação de uma atleta lesionada na Copa e quais lesões são passíveis de recuperação em tão pouco tempo?

Qualquer atleta lesionada tem que ser muito bem avaliada e a lesão precisa ser muito bem compreendida. Esse entendimento pode ser feito por meio de exames de imagem. No ano passado, na Copa do Mundo sub-20, a FIFA disponibilizou no banco de reserva as imagens, então, por meio do Ipad, consigo analisar os lances e, quando tem algum com um impacto mais forte, a gente consegue voltar a gravação da TV no próprio banco para entender como foi o mecanismo de trauma. Para recuperar uma lesão, primeiro você precisa analisar a mecânica dela, depois fazer uma anamnese adequada, que é uma conversa detalhada com a atleta.

Por meio do exame físico a gente acaba conseguindo fechar o diagnóstico da grande maioria das lesões e, se necessário, um exame de imagem. A partir daí conseguimos definir o protocolo para reabilitação e recuperação daquela lesão. Aí, tudo conta, né? Desde horas dormidas, alimentação, hidratação, se precisar algo para poupar a carga daquela articulação, por exemplo, recomendar o uso de muleta, e a própria fisioterapia. O tratamento de lesão e a recuperação envolve muitas coisas, não simplesmente a fisioterapia e a própria capacidade do corpo da pessoa de se recuperar. Tenho estudado a genética e tem algumas lesões musculares, tem algumas proteínas que elas conferem uma capacidade de maior resistência
muscular às lesões.

Como funciona o treinamento e recuperação pré e pós-treino?

A preparação é exatamente as mesmas coisas do que para o tratamento da lesão, né? Então é sono, alimentação, hidratação, suplementação, atividades que tem um efeito ergogênico positivo, ou seja, que melhoram o rendimento. Aí é realmente um ciclo de treinamento e uma carga de treinamento adequada e de preferência individualizadas. Treino de preparo do seu corpo para suportar o que vai ser efetuado no jogo. Também existe o protocolo FIFA+, que contém exercícios para evitar a lesão de LCA. Já no jogo, antes da partida começar, é necessário um bom aquecimento, feito de forma adequada com ganho de amplitude de movimento, porque isso a gente sabe que vai acabar evitando a lesão e uma boa qualidade do sono antes das partidas. O treinamento de recuperação é um treino numa carga mais baixa, em que você vai estimular a circulação naquela região para promover uma vascularização aumentada, uma circulação aumentada na região para promover a recuperação tecidual.

Recuperação das atletas e alto número de lesões na Copa Feminina 2023

Existem diversas técnicas para recuperação. O alto número de lesões pode ser explicado pelo alto rendimento e busca pela performance. Então, assim, qualquer pequeno detalhe, milisegundo coisinha vai fazer a diferença. Pensando nisso, todo mundo vai ter que treinar no seu máximo, o que implica um limiar muito tênue entre o rendimento máximo do atleta e a lesão. É uma coisa muito difícil de controlar, porque está além do controle de tudo. Por isso, é muito importante que a própria atleta conheça muito bem seu corpo e, às vezes, esse conhecer o corpo demora e infelizmente, em alguns casos, o conhecer o corpo só vai acontecer depois de ter tido algumas lesões, e esse é o grande problema.

Lesões que são compatíveis com recuperação em pouco tempo, são lesões que não são muito graves, como lesões parciais de ligamento, que, dependendo do local a gente consegue fazer uma bandagem mais rígida e firme, por exemplo, do tornozelo, a gente consegue deixar a atleta à disposição. Mas lesões ligamentares de joelho, por exemplo, dificilmente eu vou conseguir fazer com que essa atleta consiga voltar a tempo, antes de pelo menos aí uns dezoito, vinte dias. Existem algumas exceções, como luxação patelar, que a pessoa só coloca no lugar e consegue voltar. Óbvio que isso não é super aconselhável, mas é aquilo, quando a gente pensa em alto rendimento, em Copa do Mundo, geralmente é uma conversa que acaba tendo com o atleta e vamos acabar fazendo de tudo para que ela consiga voltar desde que não coloque a saúde em risco elevado.

Quais as principais causas das lesões ? E tem relação ao ciclo menstrual / hormonal ?

Existem duas principais causas de lesões: sobrecarga ou trauma. Por exemplo, algumas vezes que a menina está bem no lance e por conta de um fator externo, um trauma, algum eventual problema no campo ou mal jeito, a pessoa acaba pisando errado no posicionamento corporal, não ideal para aquele lance, isso vai ocasionar uma entorse e acabando na lesão. Em relação ao ciclo menstrual, naquele período pré-ovulatório e ovulatório, a gente sabe que as mulheres acabam, por conta de alterações hormonais tendo um pouquinho mais de frouxidão ligamentar e ficam um pouco mais cansadas, e, por conta disso, acabam caindo um pouquinho o rendimento e por conta dessas alterações hormonais que são inerentes ao próprio ciclo menstrual. Isso aumenta essa frouxidão, predispondo a um maior índice de lesões nesse período, mas não indica que se limita apenas a ele, também pode ocorrer em outros momentos.

Texto produzido em cobertura colaborativa da NINJA Esporte Clube