Por Gustavo de Sousa

Durante a COP 30, em Belém (PA), povos de comunidades tradicionais, indígenas e ribeirinhas da região do Baixo Tapajós, localizada no estado-sede da conferência do clima, promoveram protestos contra a prática de dragagem no rio Tapajós. A denúncias figurou entre os casos de destaques do Tribunal dos Povos, uma iniciativa da COP do Povo para julgar infrações socioambientais.

Consta em síntese dos casos analisados em documento divulgado pelo Ministério Público Federal -, que a solicitação da dragagem surgiu do Departamento Nacional de Inovação e Transportes (DNIT), entre os trechos do rio que abrangem os municípios de Santarém e Itaituba, ambos no Pará. Segundo o MPF, frente a secas extremas em 2023 e 2024, o DNIT determinou a dargagem em “pontos críticos” justificando a obra em nome da “segurança da navegação” e do “estado de emregência”. Rapidamente a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas) autorizou a obra “sem Estudo de Impacto Ambiental, sem estudos dos componente indígena e quilombola e sem consulta prévia, livre e informada. A hidrovia integra um eixo logístico para o agronegócio e mineração, junto à duplicação da BR-163 e à Ferrogrão. O curso do rio foco da dragagem fica entre a Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns e a Floresta Nacional do Tapajós, berçário sagrado de peixes do povo Tupinambá”.

Presente no julgamento realizado durante a COP30, o cacique-geral das aldeias do povo Tupinambá na Amazônia, Gilson Tupinambá, testemunhou que a dragagem traz contaminação da água e afastamento de peixes, o que afeta a segurança alimentar dos povos que têm no rio, um das fontes de subsistência. “O grande capital lá fora está comprando soja com sangue, e eles tão fomentando essa desgraça pra nós”, aponta Gilson Tupinambá.

Segundo o MPF, “há décadas o rio Tapajós sofre com garimpos que, junto ao aumento do tráfego fluvial e dos portos graneleiros, movimentam sedimentos e facilitam a entrada do mercúrio nas cadeias alimentares. A operação das dragas mudou a coloração da água, danificou fauna e flora aquáticas e desrespeitou acordos de pesca homologados pela Semas”. Cerca de 1300 famílias da Floresta Nacional do Tapajós e de territórios indígenas munduruku e tupinambá” são afetadas.

À ocasião da empreitada do poder público, o MPF alertou sobre a operação, apontando os riscos para as comunidades do entorno. Mas, mesmo com a notificação, a Semas emitiu autorização para a dragagem até fevereiro de 2026, com vistas a aumentar a profundidade do rio e permitir a passagem de grandes embarcações.

A representação jurídica das comunidades afetadas pelo processo da dragagem reclamou a falta de consulta prévia, livre e informada aos grupos que vivem na beira do Tapajós. Além disso, a demarcação de territórios indígenas incluindo perímetro do rio continua sendo uma medida defendida como proteção aos povos e seus territórios, segundo Gilson Tupinambá.

Posicionamento do governo Lula

Durante o último dia da Cúpula dos Povos, 15 de novembro, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Guilherme Boulos, prometeu aos povos presentes que a consulta a eles seria prioridade nos processos que envolvem o Rio Tapajós.

“O governo federal fará, em relação ao Tapajós, a consulta livre, prévia e informada aos povos da região antes de implementar qualquer projeto no rio”, disse Guilherme Boulos.

A fala se dá depois que o presidente Lula decretou a inclusão de diversos rios, como Tapajós e Madeira, no Programa Nacional de Desestatização (PND). A decisão 12.600, de agosto deste ano, transforma os trechos fluviais em vias privadas, para uso comercial.

Após diversas manifestações realizadas durante a COP 30, os povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos esperam por respeito aos seus territórios. A fala de Guilherme Boulos marcou as discussões sobre hidrovias na Amazônia, por prometer, finalmente, o que as comunidades exigiam.