Por: Lucía Ixchiu

Primeira semana

Com os olhos cheios de verde, entre os sons da água e da selva, inicio este relato desde o coração da flotilha. O que faz uma mulher maia K’iche no meio da selva amazônica, a caminho do Brasil? Sinto o rio e a selva, e como nos conectamos à medida que a viagem avança.

Entre as águas dos rios Napo e Yasuní, seguimos em direção a Pantoja, na fronteira entre Equador e Peru, uma região que, anos atrás, esteve em conflito.

Com a permissão e o som da avó Cayambe, o glaciar onde nasce o rio Amazonas, e com nossa oferenda recebida pela terra, iniciamos esta jornada. Já percorremos um terço deste viagem de irmanação entre territórios, de solidariedade e aprendizados compartilhados.

Para o povo K’iche, as florestas são parte essencial de sua existência. Honrar a Amazônia é também honrar todas as selvas e bosques do mundo. Nossos olhos se enchem de cores ao contemplar a biodiversidade, mas nossa alma dói ao saber que ela está ameaçada pelas petroleiras e por todo tipo de indústria extrativista que a enxerga como um recurso e um negócio lucrativo.

Foto: Cobertura Colaborativa Yaku Mam

Os cantos dos pássaros rompem o silêncio, e o som da água nos acompanha já no segundo dia rio adentro. Os povos Waorani lideram a proteção do Parque Nacional Yasuní, convivendo com ele há centenas de anos, e hoje viemos à sua casa. Este também é o lar do boto-cor-de-rosa, que vimos rapidamente se esconder nas águas da lagoa Jatuncocha, além de centenas de milhares de espécies que compõem essa grande avó que chamamos de selva amazônica.

Neste momento, navegamos rio abaixo, ao sul, para seguir com esta flotilha da esperança e da solidariedade entre os povos. Para a maioria de nós, que participamos desta viagem, este é um território que visitamos e observamos pela primeira vez.

Em Coca, realizamos um intercâmbio para conhecer as experiências dos povos e organizações que enfrentam os combustíveis fósseis. Ao final do dia, participamos de uma marcha pela Mãe Terra pelas ruas do povoado, culminando em um ato político onde cobrimos a estátua de Francisco de Orellana, a quem se atribui a conquista da Amazônia. Nomeamos os defensores da Amazônia que nos foram arrancados e encerramos com um intercâmbio de discursos antes de embarcarmos no dia seguinte.

Nesta flotilha, composta por várias embarcações pequenas, viajamos pessoas indígenas de diferentes partes do continente e do mundo. Viemos percorrer uma rota que busca amplificar as vozes dos territórios e de seus primeiros habitantes.