por Izabella Mota

Com os olhos voltados à COP 30, a floresta pode ser inspiração para mudança no mundo da moda. É que em tempos de emergência climática, a hiperprodução da fast-fashion e consumo em excesso dos padrões capitalistas têm gerado sérios danos ambientais. Por trás das tendências há um sistema de produção que consome recursos naturais em escala alarmante e que provoca ainda, poluição de rios, contaminação de solos e toneladas de resíduos têxteis – a maior parte sem destino sustentável, como o imenso depósito de roupas descartadas que se formou no Deserto do Atacama, no Chile.

A United Nations Alliance for Sustainable Fashion, em dados publicados pelo Banco Mundial (2019), estima que a indústria do vestuário e têxtil consuma por volta de 215 trilhões de litros de água anualmente. Calcula-se que 87% das fibras têxteis utilizadas na indústria do vestuário sejam incineradas ou enviadas para aterros sanitários, enquanto o setor é responsável por entre 2% e 8% das emissões globais anuais de carbono. Além disso, cerca de meio milhão de toneladas de microfibras plásticas são lançadas nos oceanos anualmente. Conforme o PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), as microfibras liberadas não podem ser filtradas na água e se difundem pela cadeia alimentar, constituindo uma ameaça ambiental e de saúde pública de longo alcance.

E mesmo assim, nos últimos anos, esse setor tem se apropriado de maneira expressiva do discurso “verde” para incitar mais vendas. O greenwashing se veste de expressões como “ético”, “responsável”, “sustentável”, “ecofriendly”, repetidas à exaustão para convencer consumidores. No Brasil, ainda vemos marcas que se apropriam da Amazônia como repertório estético, mas ignoram quem vive nela e suas reais cadeias de produção. A floresta se torna assim um palco-alvo de exploração visual, simbólica e econômica. Mas afinal, é possível vestir a “floresta” sem explorá-la? Eu tenho um palpite: “A moda precisa aprender com os modos tradicionais. Aprender com os territorios. E principalmente, com os povos que ela habitam têm a ensinar se realmente deseja ter comprometimento com o futuro.

Saberes e teceduras

Os ensinamentos vão muito além do consumo consciente: precisamos estar atentos à origem e processos de produção do que vestimos e voltar nossas atenções para práticas culturais. Quais são as mãos que as fazem e preservam e o destino final de cada material. Há no prisma destes, o tempo, a tecedura e o significado: feitos de memória viva da extensão de cada corpo, a floresta. 

Por exemplo, há, entre os povos indígenas, uma relação com o que virá a ser vestimenta, que nasce antes de cada etapa de criação – antes do material, existe o território. Sabe-se o momento certo de colher e também o momento de não colher; em uma ética silenciosa, só se retira da mata quando não se prejudica sua regeneração. Os materiais naturais entram também como uma forma de escuta, as mãos trançam, tecem, raspam e colorem respeitando as curvas e as resistências de cada fibra. Não há excedente, pois tudo encontra destino – sementes viram biojoias, cascas viram cores e ferramentas, o fio menor vira detalhe, a sobra volta à terra, de onde poderá renascer.

Os povos originários apontam uma lente em que podemos desaprender o consumo para reaprender a relação. O forte valor simbólico opera como respeito, para trançar, fiar e tecer – tururi, buriti, tucum, algodão nativo. Para tingir naturalmente, no tempo da natureza – urucum, jenipapo, carvão vegetal, argilas coloridas e plantas diversas. A floresta sendo vista como um sujeito e gesto criativo – não como um recurso. 

A construção de futuros possíveis sustentáveis exige mais do que metas e acordos formais. Demanda a incorporação de saberes praticados há tempos, no cotidiano. Os povos indígenas mostram que sensibilidade, medida e vínculo com o território não são valores abstratos – mas fundamentos concretos de sustentabilidade.