Por Nicole Grell Macias Dalmiglio

Em um momento crucial para a transição energética global, a conferência CNECC: AI Empowerment and Digital Innovation in the Field of Renewable Energy, realizada em 15 de novembro de 2024 em Baku, Azerbaijão, trouxe otimismo e questionamentos. Líderes do setor e especialistas em inteligência artificial (IA) apresentaram soluções inovadoras para os desafios das energias renováveis, mas o evento também revelou as limitações e contradições dessa relação tecnológica.

Yubo Zhai, diretor de sustentabilidade da NaaS Technology, abriu o evento enfatizando a centralidade da IA no avanço das energias limpas. Segundo ele, a tecnologia não só melhora a eficiência, mas também fortalece a colaboração entre indústria, academia e governos. “A IA é crucial para a transição global rumo à sustentabilidade”, declarou. No entanto, declarações como essa soam ambiciosas diante das realidades práticas de implementação, especialmente em regiões economicamente vulneráveis.

Entre os destaques da conferência, Zhengyu Chu, fundador e CEO da Circ, uma das líderes globais em soluções energéticas baseadas em inteligência artificial, apresentou o modelo de IA PerTo. A tecnologia, segundo ele, é capaz de prever falhas em baterias com até 50 dias de antecedência, além de otimizar operações em usinas de energia. “Acreditamos que, no futuro, sistemas de energia serão tão autônomos quanto os veículos elétricos”, declarou. No entanto, especialistas alertam que modelos como o PerTo dependem de uma infraestrutura tecnológica robusta e altos investimentos, o que limita sua aplicação em larga escala.

Já a executiva da ACWA Power, Sarah Alharthey, trouxe um exemplo concreto de como a IA está sendo usada para reduzir custos em plantas de dessalinização e hidrogênio verde. “Nosso algoritmo interno reduziu em 12% os custos químicos em plantas de dessalinização, demonstrando que sustentabilidade e lucratividade podem caminhar juntas”, destacou. Ainda assim, há dúvidas sobre o alcance real dessas soluções em cenários onde os custos de implementação ainda são proibitivos.

Foto: Reprodução / Youtube

A cooperação global foi outro tema central, especialmente no discurso de Qaiser Nawab, presidente da Belt and Road Initiative for Sustainable Development (BRISD). Ele ressaltou a importância da IA para integrar fontes renováveis em países do Sul Global, mas admitiu que desigualdades estruturais dificultam o acesso às tecnologias mais avançadas. “A IA pode ser um catalisador, mas precisamos de mais esforços para garantir que ninguém fique para trás na transição energética”, alertou.

Um dos destaques do evento foi o conceito do Passaporte da Bateria, apresentado pela CEO da Botree Recycling Technologies, Xue Wang. A solução digital rastreia o ciclo de vida das baterias, desde a extração de materiais até a reciclagem, garantindo maior eficiência e segurança. “Com o Passaporte da Bateria, podemos monitorar materiais críticos e reduzir riscos ambientais como incêndios e explosões”, explicou. No entanto, críticos observam que a dependência de tecnologias digitais ainda exclui comunidades e mercados com pouca infraestrutura tecnológica.

A conferência culminou no lançamento da Iniciativa de Desenvolvimento Integrado de IA e Novas Energias, um esforço liderado pela China New Energy Chamber of Commerce. O projeto busca promover a integração da IA na produção de energia renovável, reduzir emissões de carbono e incentivar colaborações globais. Embora a iniciativa pareça promissora, ela enfrenta desafios significativos, desde barreiras políticas até o impacto ambiental do próprio uso da IA.

A CNECC 2024 reforçou que a inteligência artificial pode ser uma aliada poderosa na luta por um futuro sustentável, mas também destacou as contradições dessa aposta tecnológica. Entre promessas de eficiência e barreiras estruturais, a transição energética ainda exige mais do que avanços tecnológicos: demanda um compromisso global com equidade e sustentabilidade, para que seus benefícios realmente alcancem a todos.