Consumo de ultraprocessados pode ser fator de risco para depressão
Pesquisas pelo mundo inteiro constataram a ligação entre o consumo de produtos ultraprocessados com doenças como câncer, diabetes, pressão alta e depressão
Pesquisas pelo mundo inteiro constataram a ligação entre o consumo de produtos ultraprocessados com doenças como câncer, diabetes, pressão alta e depressão
Por Maria Vitória Moura
Nos últimos anos, os ultraprocessados passaram a ser objeto de análise dos cientistas por vários fatores. Pesquisas pelo mundo inteiro já analisaram a alimentação da população e constataram a ligação entre o consumo de produtos ultraprocessados com doenças como câncer, diabetes, pressão alta e depressão. Nesse campo científico estão cada vez mais claros os malefícios desses produtos para a saúde humana.
A respeito das consequências do alto consumo de ultraprocessados na saúde mental, a epidemiologista francesa Tasnime Akbaraly, do Instituto de Pesquisas Médicas da França (Inserm), aponta que as substâncias químicas presentes nos ultrprocessados agravam as causas da depressão, uma vez que essas podem causar falhas na transmissão das informações de um neurônio para outro no cérebro, afetando a produção e a captura de três neurotransmissores envolvidos no aparecimento da depressão: a serotonina, a noradrenalina e a dopamina. O mau funcionamento desse mecanismo cerebral pode atrapalhar a regulação das emoções, o controle cognitivo e a construção da autoimagem, fatores que caracterizam a depressão.
“Existem fatores de risco para a depressão, como os genéticos, que já estão bem estabelecidos e documentados na literatura científica. Mas, no meu estudo, o importante era focar naquilo que pode ser controlado, como o modo de vida. Este é o caso da alimentação”, explica a pesquisadora.
Para chegar a tais conclusões, a epidemiologista utilizou um banco de dados público de saúde britânico, conhecido como Whitehall II, através do qual ela obteve informações alimentares e de saúde de 4.554 pacientes entre 35 e 55 anos, que são acompanhados por uma equipe médica desde o início dos anos 1990. Após cruzar os dados referentes ao estilo de vida e possíveis episódios depressivos, assim como a necessidade de usar remédios para tratar a doença, ela constatou que os pacientes que consumiam menos legumes e frutas e mais produtos com altos teores de gordura saturada apresentaram maiores probabilidades de desenvolver quadros depressivos.
Em uma pesquisa mais recente, publicada no Journal of Affective Disorders, os pesquisadores analisaram os dados de 24.674 participantes que responderam questionários sobre o que comeram e também sobre seu estado emocional. Os pesquisadores calcularam a quantidade média diária de alimentos ultraprocessados consumidos pelos participantes em termos de calorias, peso e gênero.
Os resultados reforçam que comer alimentos altamente processados pode proporcionar prazer imediato, mas também podem causar depressão e angústia psicológica. Esse segundo estudo analisa menos a parte química da reação dos ultraprocessados no organismo, focando mais diretamente no perfil social dos participantes. Assim, a pesquisa conclui que pessoas que consomem mais produtos ultraprocessados são mais solitárias e menos propensas a atividades físicas, importantes para o corpo e a mente.
Também se faz necessário relembrar que o estilo de vida e alimentação está diretamente ligado ao poder de compra da população, assim como à oferta de alimentos saudáveis, in natura e agroecológicos, que são consumidos majoritariamente por pessoas com maior poder aquisitivo. No documentário “Food Inc”, que investiga a cadeia de produção dos alimentos nos Estados Unidos, desde a manipulação e o monopólio de grãos e cereais à criação e abate de animais para consumo, as famílias entrevistadas apontam para a diferença de preço dos alimentos in natura nos supermercados e uma refeição com ultraprocessados.
O objetivo do documentário é denunciar justamente os incentivos, dentre eles por parte dos próprios governos, que acabam tornando produtos pouco saudáveis mais atrativos economicamente para a população. No Brasil, por exemplo, os alimentos agroecológicos pagam impostos durante toda a sua cadeia de produção e transporte, enquanto que os ultraprocessados recebem incentivos fiscais que barateiam seus custos. Nesse cenário, os principais afetados pela má alimentação involuntária é a população mais pobre, que acaba por substituir a carne, o arroz e o feijão por produtos cheios de aditivos químicos, como a salsicha.