
Conheça Laura Barker, produtora que faz uma ponte entre o cinema brasileiro e o mundo
Fundadora do New York Brazilian Film Festival, ela amplia o espaço do audiovisual brasileiro nos Estados Unidos
Por Christina Gonçalves
Nascida em São Paulo, filha de mãe cearense e pai baiano, Laura Barker se mudou para Nova York aos 22 anos de idade. Graças a uma bolsa de estudos, conseguiu estudar cinema e permanecer na cidade. Como muitas pessoas no meio do audiovisual, começou como assistente de produção em projetos de cinema, teatro e televisão nos Estados Unidos. O talento de Laura se destacou dentro das equipes de produção, o que a levou a receber novos convites de trabalho e a assumir posições com mais responsabilidade, como direção de casting para a Broadway e outras companhias, onde se tornou produtora executiva.
“Esses trabalhos também me permitiram investir cada vez mais nos meus projetos pessoais, que envolviam o nosso cinema brasileiro, e em criações que foram fundamentais para a construção da minha trajetória artística”, conta Laura.
Laura Barker é considerada uma das vozes mais atuantes na promoção do audiovisual brasileiro nos Estados Unidos. Em 2023, fundou o New York Brazilian Film Festival (NYBRFF), um festival de cinema independente que celebra e promove a cinematografia brasileira em Nova York.
“Nos meus dois primeiros anos morando aqui (Nova York), eu já sentia o ‘vazio’ na representação do cinema na cidade. De vez em quando, alguma produção nossa, depois de muita luta, conseguia chegar a um festival por aqui. Eu sentia um orgulho imenso de assistir a um filme brasileiro em telas estrangeiras”, compartilha.
Ao longo dos anos, ela percebeu que muitos filmes brasileiros de grande qualidade não recebiam a visibilidade internacional compatível com sua potência artística. Motivada por essa constatação, passou a estudar formas de criar pontes para o cinema brasileiro no exterior. Entrou em contato com festivais dedicados à cinematografia nacional em diferentes cidades dos Estados Unidos, mapeou o cenário e observou os caminhos de distribuição e circulação dos filmes brasileiros.
O interesse se intensificou quando produções como Bacurau, A Vida Invisível e Divino Amor estrearam em um dos festivais mais importantes de Nova York. Na ocasião, foi convidada pela distribuidora para acompanhar os lançamentos, entrevistar os diretores e escrever sobre as obras. A partir dessa experiência, ficou ainda mais claro para Laura a ausência de um espaço que tratasse o cinema brasileiro com a legitimidade artística que ele merece — e não apenas como um recorte étnico ou “exótico”.
“Promover o audiovisual brasileiro fora do país exige atravessar barreiras estruturais, de idioma, de mercado e, sobretudo, do imaginário americano. É um trabalho que vai além da exibição de filmes: envolve mediação cultural, articulação com instituições e um cuidado profundo com a maneira como o Brasil é representado aqui fora”, diz.
Laura compartilha que não apenas assumiu a concepção artística do projeto, como também a produção executiva e o investimento financeiro. Ao longo desses dois anos de NYBRFF, mais de 60 mil dólares foram investidos em estrutura e operação — e tudo isso foi possível porque ela acreditou na urgência e na potência desse espaço. Também criou, dentro do festival, projetos sociais que levam a arte para além das salas de exibição, como uma ação em parceria com um instituto em São Paulo que oferece oficinas e acesso cultural para jovens em situação de vulnerabilidade.
“Esse papel tem algo de ponte entre nossos artistas e o público internacional, então eu sigo firme nesse caminho porque acredito que o nosso cinema é, acima de tudo, uma das ferramentas de transformação política que estamos tendo nos últimos anos”, continua.
A produtora compartilha os desafios de manter e expandir o festival ao longo dos anos. Para ela, o maior desafio é encontrar os investimentos necessários para que o festival continue existindo com estrutura, qualidade e visão de longo prazo. Para que o festival se mantenha e cresça, é fundamental contar com parceiros e apoiadores que compreendam o alcance cultural e simbólico do que está sendo construído em Nova York, uma das principais capitais culturais do mundo. Mais do que patrocínios, trata-se de uma responsabilidade compartilhada com a arte e a cultura brasileiras.
“Manter uma iniciativa como essa fora do Brasil, em um país com uma indústria audiovisual tão dominante como a dos Estados Unidos, exige constância, articulação e recursos”, conta.
Segundo Laura, um dos grandes desafios é formar e fidelizar um público internacional para o cinema nacional — um público que não apenas assista, mas que se engaje, discuta e queira retornar a cada edição. A curadoria busca constantemente o equilíbrio entre trazer as grandes vozes que já representam o cinema brasileiro no exterior e abrir espaço para novos talentos que estão surgindo. O objetivo é fortalecer a presença do Brasil no circuito internacional, sem comprometer a integridade do olhar artístico que define a produção nacional.
A versatilidade como essência artística
Transitando com fluidez entre o teatro, o cinema, a televisão e, mais recentemente, a fotografia, a trajetória artística de Laura Barker é marcada por uma constante busca por novas formas de expressão. Essas linguagens, embora distintas, sempre estiveram presentes de maneira complementar em sua carreira.
O teatro, especialmente após os anos de formação, foi a base inicial onde desenvolveu noções fundamentais de direção, presença cênica e trabalho em equipe. Em seguida, o cinema e a televisão ampliaram esse repertório, permitindo o domínio de estruturas técnicas mais complexas e a operação em escalas maiores de produção e impacto. Já a fotografia, incorporada à sua prática mais recentemente, surgiu como uma nova linguagem — mas também como uma continuidade natural de seu olhar artístico.
Entre os muitos projetos dos quais participou, três se destacam como marcos significativos em sua jornada profissional: O primeiro é a criação do New York Brazilian Film Festival, um projeto que representa mais do que um evento cultural — trata-se de uma decisão estratégica de ocupar espaço e construir uma estrutura sólida para o cinema brasileiro fora do país.
Outro momento decisivo foi sua atuação na produção de espetáculos e performances teatrais, inclusive na Broadway. Trabalhar em produções dessa magnitude proporcionou uma base técnica robusta e um entendimento aprofundado sobre linguagem cênica em contextos internacionais.
Mais recentemente, destaca-se a sessão fotográfica com a atriz Priscila Reis, que não apenas marcou o início de uma nova fase profissional, como também simbolizou um movimento de retorno e reconexão com o Brasil.
Para finalizar, a produtora deixa uma mensagem para os jovens artistas brasileiros que sonham em construir uma carreira internacional no audiovisual: “Construir uma trajetória internacional não significa apagar as nossas origens e a nossa cultura. É preciso manter a escuta ativa para que você amplifique, sem se diluir totalmente em uma nova língua e cultura. O mundo está cheio de artistas talentosos, mas o que realmente sustenta uma carreira é a coerência interna entre o que se vive, o que se escolhe criar e como se sustenta isso com dignidade. É fundamental desenvolver não só técnica, mas também visão de mundo, clareza ética e autonomia para atravessar os desafios e a exposição que fazem parte da vida artística.”