Conheça Afonso Segreto, cineasta italiano que fez o primeiro filme no Brasil, há 126 anos
Em 19 de junho de 1898, ele filmou cenas da Baía de Guanabara ao chegar ao Rio de Janeiro, evento que marca o início da cinematografia brasileira
Por Laura Süssekind
O Dia do Cinema Brasileiro é celebrado em 19 de junho, em homenagem a um evento bastante importante ocorrido em 1898. Nesta data, Afonso Segreto (1875 – 1919) chegava ao Brasil, a bordo do navio Paquebot Brésil, com desembarque no Rio de Janeiro. Segreto retornava de uma viagem que fez a Nova York, para adquirir novos equipamentos e aprimorar suas habilidades como cinematógrafo, e Paris, onde participou de curso na Pathé Films.
Antes de desembarcar no Rio de Janeiro, porém, ele filmou com uma câmara Lumière a entrada da enseada da Baía de Guanabara, capturando imagens das fortalezas e dos navios de guerra ancorados – informação que consta na Gazeta de Notícias de 20 de junho de 1898, na segunda coluna (imagem abaixo). Este registro, “Uma vista da Baía de Guanabara” (1898), é considerado a primeira fita de cinema realizada no Brasil e deu origem ao Dia do Cinema Brasileiro. Posteriormente, Afonso Segreto filmou outros diversos aspectos do Rio de Janeiro, incluindo cerimônias e seus arredores.
Essa breve nota é considerada a “certidão de nascimento” do cinema nacional, sendo o único relato oficial do ocorrido. “O sr. Afonso Segreto há sete meses que fora buscar o aparelho fotográfico para preparo de vistas destinadas ao cinematógrafo e agora volta habilitado a montar aqui uma verdadeira novidade, que é a exibição de vistas movimentadas do Brasil. Já ao entrar à barra, fotografou ele as fortalezas e navios de guerra. Teremos para dentro em pouco verdadeiras surpresas”, destaca a publicação.
De acordo com relato de Domingos Segreto, filho de Gaetano Segreto, em depoimento publicado no livro “Palácios e Poeiras”, de Alice Gonzaga, Afonso Segreto ainda era inexperiente com o equipamento e cometeu um erro durante a sessão marcada para a exibição das imagens no Salão Pariz, primeira sala de cinema fixa do Brasil e propriedade do irmão de Afonso. A sessão deveria ocorrer dia 20 de junho de 1898, mesma data da nota da Gazeta, mas, ao abrir erroneamente a câmara, Afonso danificou o filme e, por isso, precisou exibir vistas estrangeiras para o público. Diversas figuras de destaque haviam sido convidadas para o evento, incluindo o presidente da República, Prudente de Morais (1841 – 1902), e o jurista Rui Barbosa (1849 – 1923). Um convite para a sessão faz parte do acervo da Fundação Casa de Rui Barbosa.
Hernani Heffner, Gerente da Cinemateca do MAM-RJ, diz: “A data de 19 de junho é simbólica da dificuldade que se tem de fazer cinema no Brasil, porque marca um filme que não existiu. E, além da dificuldade, retrata a perseverança e força de fazer cinema contra todas as expectativas. É o marco inicial de uma história que tem muitos percalços, mas que segue sempre em frente, com muita persistência até hoje”. Apesar da dificuldade inicial, Afonso se tornou o primeiro realizador cinematográfico do país.
Suas primeiras filmagens completas ocorreram menos de um mês depois, no dia 5 de julho, quando Afonso registrou o desfile fúnebre do marechal Floriano Peixoto e a visita de Prudente de Morais ao cruzador Benjamin Constant, no Arsenal de Marinha. Entre 1898 e 1903, Afonso registrou mais de 100 filmes mas, infelizmente, todos se perderam com o tempo, assim como todo o restante do cinema brasileiro anterior a 1909.
Afonso Segreto tinha dois irmãos que também tiveram papel importante como pioneiros da indústria do entretenimento no Brasil. Paschoal (1868 – 1920) e Gaetano Segreto (1866 – 1908) eram empresários italianos que vieram para o Brasil em 1883. Paschoal tornou-se o “ministro das diversões” do Rio e principal exibidor e produtor do Brasil até 1907, enquanto Gaetano foi o distribuidor exclusivo do jornal A Notícia e fundou o jornal da comunidade italiana Il Bersagliere. Os irmãos Segreto foram figuras em destaque da Belle Époque do Rio de Janeiro, mas a única herança viva da família Segreto no Rio, hoje, é o Teatro Carlos Gomes, no Centro.