Como funcionam os programas para incentivo de atletas
Saiba como o Brasil incentiva, ou não, seus atletas a alcançar condições para disputar as Olimpíadas e Paralimpíadas.
Por Yasmin Henrique, para Cobertura Colaborativa Paris 2024
Ao longo das duas últimas décadas, o Brasil investiu R$43,4 bilhões no fomento dos chamados esportes olímpicos e paralímpicos. Como resultado desse esforço, o país acumulou um total de 351 medalhas em Olimpíadas e Paralimpíadas desde a edição de 2004, sendo 112 delas de ouro. Este montante não abrange os fundos destinados à infraestrutura dos Jogos Pan-Americanos de 2007 e das Olimpíadas de 2016, que ocorreram no Brasil.
A pesquisa da consultoria em imagem e reputação Ponto MAP destaca esses dados, atualizados pelo IPCA até dezembro de 2023. As informações têm como base os registros do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), do Ministério do Esporte, e do portal Transparência no Esporte da Universidade de Brasília (UnB).
Dos recursos totais investidos, R$6,5 bilhões foram obtidos por meio de renúncias fiscais de marcas, sendo possível a partir do programa de incentivo ao esporte do governo federal. A partir de 2021, houve um aumento notável investimento do setor privado, impulsionado sobretudo pelo crescente interesse do público. Entre 2021 e 2023, o investimento privado atingiu R$1,9 bilhão, marcando um crescimento de 48% em relação ao período anterior às Olimpíadas de Londres em 2012.
“Os grandes eventos, além de entreter, são manifestações culturais que envolvem o público”, destaca Marília Stábile, fundadora da Ponto MAP. “Essas interações podem ser positivas ou negativas e afetam as marcas patrocinadoras. Por isso, é crucial medir o impacto social das Olimpíadas e as expectativas em relação às marcas, que vão além de meramente exibir um logotipo”, acrescenta.
BOLSA ATLETA
Para os Jogos Olímpicos de Paris 2024, o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) enviou uma delegação de 277 atletas que estão competindo em 39 modalidades diferentes. Destes, 247 atletas fazem parte do programa Bolsa Atleta, administrado pelo Ministério do Esporte, representando 89,17% da equipe brasileira na competição.
Entre os atletas de destaque beneficiados pelo programa, estão Rebeca Andrade (ginástica), Rayssa Leal (skate), Rafaela Silva (judô), Caio Bonfim (marcha atlética), Marta (futebol) e Beatriz Haddad (tênis).
Comemorando seu 20º aniversário, o programa Bolsa Atleta foi elogiado pelo ministro do Esporte, André Fufuca, em entrevista à Voz do Brasil. Ele destacou o programa como uma política pública de sucesso, cujos resultados concretos são evidentes a cada ciclo olímpico.
Fufuca também mencionou que o Ministério está avaliando a possibilidade de diminuir a idade mínima para a participação de atletas em certas modalidades. No momento, a idade mínima estabelecida é de 14 anos para diversas categorias.
Em julho deste ano, o Governo Federal assinou um decreto que reajusta a bolsa para os atletas em 10,8% após 14 anos sem alterações. À época da assinatura do referido decreto, o presidente Lula destacou que, antes de alcançarem reconhecimento e obterem patrocínios privados a partir do Bolsa Atleta, muitos atletas enfrentavam dificuldades para arcar com os custos básicos de treinamento.
“Embora o setor privado não tenha a obrigação de apoiar atletas que ainda não conquistaram medalhas, o Estado brasileiro tem o dever de apoiar todos, especialmente aqueles com potencial para alcançar o sucesso,” afirmou Lula. O presidente também destacou a importância de proporcionar oportunidades para que atletas, mesmo em pequenas cidades, tenham acesso às condições necessárias para treinar e competir.
Atualmente, o Bolsa Atleta apoia mais de nove mil esportistas, com valores que vão de R$370 a R$15 mil. Os reajustes começaram a ser implementados em agosto para todas as categorias do programa. Esse ajuste também abrange a Bolsa Pódio, a categoria mais alta do programa, destinada a atletas que estão entre os 20 melhores do ranking mundial e têm potencial para conquistar medalhas em grandes competições internacionais.
EXISTE DE FATO INCENTIVO?
Além do Bolsa Atleta, existem outros programas que oferecem suporte aos atletas em Paris. Desde 2015, Adriana Samuel, ex-atleta e atual gestora do Time Petrobras – programa voltado a contribuir para o desenvolvimento de talentos promissores que carecem de patrocínio para alcançar índice olímpico -, tem servido como embaixadora para um grupo de 55 atletas. Durante quase uma década, esse projeto acumulou um total de 157 medalhas em competições como os Jogos Pan-Americanos, Olimpíadas e Paralimpíadas. Entre os atletas do Time Petrobras estão:
- Ana Sátila: canoagem slalom: 4º lugar na categoria K1 e 5º lugar na categoria C1.
- Beatriz Souza: judô: ouro na categoria +78kg.
- Ana Patrícia e Duda, Carol Solberg e Bárbara Seixas (duplas de vôlei de praia).
- Flávia Saraiva, ginástica artística: bronze por equipe e finalista no individual geral.
- Hugo Calderano: tênis de mesa: 4º lugar.
Em entrevista ao Correio Braziliense, Adriana Samuel destacou a importância do apoio financeiro aos atletas, observando que muitos deles dependem desse tipo de suporte para se dedicar integralmente ao esporte. “Os atletas enfrentam desafios e responsabilidades financeiras; o patrocínio direto é crucial, especialmente para as modalidades que recebem menos investimento”, disse ela.
Essa visão é corroborada por uma pesquisa realizada pelo Serasa em parceria com o Opinion Box, na qual apontou que 74% dos atletas brasileiros não receberam apoio financeiro durante a infância. A pesquisa também revelou que 74% dos atletas não recebiam incentivos ou bolsas, e apenas 3% tinham algum tipo de apoio governamental.
O estudo sugere que a situação financeira das famílias frequentemente impede que talentos esportivos atinjam seu máximo potencial. Embora 42% dos brasileiros tenham o desejo de se tornar atletas profissionais, apenas 10% conseguem concretizar esse sonho, e somente 20% conseguem sustentar suas carreiras esportivas.
Entre os principais desafios para a profissionalização, a pesquisa mencionada ouviu atletas amadores e profissionais que listaram: a necessidade de priorizar os estudos (42%), a exigência de trabalhar (39%), a falta de apoio financeiro (32%) e a escassez de recursos (27%). Cerca de 70% dos atletas arcam com despesas de roupas, equipamentos esportivos e transporte, que podem representar até 10% da renda familiar.