Com quase 500 mil votos, candidatos da Bancada Indígena reforçam luta pela demarcação de territórios
Maioria das candidaturas são oriundas de terras homologadas, demonstrando mobilização coletiva pela retomada de processos paralisados
Com mais de 446 mil votos, as candidaturas que integram a Bancada Indígena demonstraram a força da mobilização coletiva para ocupação das Casas Legislativas estadual e federal, encabeçando, principalmente, a questão da identidade territorial por meio da retomada da demarcação de territórios, principal luta do movimento indígena.
Nos Estados, a maioria das candidaturas assumiu a defesa do território por meio da bandeira da reforma agrária agroecológica popular, unindo-se a movimentos de defesa da soberania alimentar, de luta contra a hegemonia de agrotóxicos e de direitos ao acesso à Educação e Saúde dentro de assentamentos.
Dos 30 candidatos indígenas apoiados pelo projeto Campanha Indígena, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), 21 são oriundos de terras já demarcadas e homologadas, que saíram em defesa da demarcação dos territórios.
Entre as 728 terras indígenas existentes no País, 310 ainda aguardam o reconhecimento do Estado brasileiro, segundo dados do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), procedimento que está paralisado há quatro anos.
“O território representa a atividade produtiva para sustento próprio, a identidade de um povo, além de garantir seu bem-estar, fator necessário à reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. Não é possível pensar na sobrevivência de povos sem território. Por isso esta é luta por nossa própria sobrevivência”, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Kleber Karipuna.
Ele destaca ainda que o fortalecimento dos territórios constitui a melhor estratégia do País para combater o aquecimento global: em 35 anos (1985 a 2020), as terras indígenas foram as áreas mais preservadas do Brasil com registro de desmatamento e a perda de floresta de apenas 1,6%.
“Este é o principal ganho do movimento Aldear a Política: enraizar na sociedade a ideia de os povos indígenas são parte da solução, se apresentam como alternativa viável ao modelo de exploração que nos trouxe até aqui”, completa Karipuna.
O número expressivo de candidatos indígenas nas eleições gerais deste ano – 186 -, o maior já registrado pelo Tribunal Superior Eleitoral, é fruto da indignação e mobilização dos povos originários com a política de morta contra os povos indígenas praticadas pelo Governo do presidente Jair Bolsonaro e pela bancada do agronegócio no Congresso Nacional.
Desempenho
A eleição de duas candidatas da Bancada Indígenas à Câmara Federal marca um novo momento da política nacional com maior representatividade de povos tradicionais e possibilidade de estabelecimento de novos marcos para a cultura de formulação das políticas que ditam os rumos do País.
Célia Xakriabá foi eleita por Minas Gerais com 101.154 votos e Sônia Guajajara por São Paulo, com 156.966 votos. Ambas são as primeiras indígenas a representar os respectivos estados em Brasília.
O número de mulheres candidatas indígenas nas Eleições 2022 foi o responsável pelo crescimento de parentes postulantes a um cargo eletivo desde 2014: a participação delas registrou um aumento de 189%, passando de 29 para 84 candidaturas. O crescimento dos candidatos homens nesse período foi de 78,5%.
No Norte, a candidata estreante no pleito eleitoral pelo Amazonas, Vanda Witoto (Rede) conquistou a marca de 25.382 votos para a vaga de deputada federal. Técnica de enfermagem por formação, ela ganhou destaque durante a pandemia de Covid-19 ao defender atendimento digno para indígenas nos hospitais e a construção de um hospital de campanha dentro do Parque das Tribos, território urbano em Manaus que abriga diversas etnias.
Com 11.221 votos, a primeira indígena eleita deputada federal, Joênia Wapichana, alcançou mais eleitores do que três candidatos eleitos pelo estado de Roraima e foi a mais votada da federação Psol-Rede no Estado. No entanto, acabou não ficando com a vaga por conta do sistema de escolha de deputados estaduais e federais que segue a proporcionalidade: o total de votos válidos é dividido pelo número de vagas que cada estado tem na Câmara Federal ou nas assembleias estaduais.
Em Santa Catarina, Kerexu Guarani totalizou 35.215 votos, tornando-se a mais votada da Federação Psol-Rede. Ela é a primeira cacica Guarani reconhecida no Brasil; coordenadora regional da Comissão Guarani Yvyrupa, da Apib e da Articulação Nacional de Mulheres Indígenas Guerreiras Da Ancestralidade (Anmiga), organização que ajudou a criar.
Nos estados dominados pelo Agro, os candidatos a deputado federal Almir Suruí (RO) e Lúcio Xavante (MT) demonstraram força partidária ao serem os mais votados do PDT: 3.769 e 3.191, respectivamente.
Também foi representativa a conquista de 4.768 votos que a candidata a deputada estadual pelo Psol, Val Eloy, obteve em Mato Grosso do Sul, estado que deu a maioria dos votos a Bolsonaro (52,70%) e sede eleitoral de duas candidatas a presidente com discurso favorável ao agronegócio: Simone Tebet (MDB) e Soraya Thronicke, ambas eleitas ao Senado em 2018. Além disso, o povo Guarani Kawioá paga com a vida a luta pela demarcação do território no Estado que cerca os indígenas com o agronegócio.
Ainda entre os candidatos a estadual, Chirley Pankará (Psol) conseguiu 27.802 votos para a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Foi a primeira mulher indígena a ocupar a Assembleia Legislativa de São Paulo como codeputada pela Bancada Ativista, eleita em 2018.
Fonte: APIB