Com a votação do PL 410, governo Doria quer privatizar a reforma agrária
Governo Doria se compromete a não regularizar a grilagem de terras, mas ainda mantém privatização, a votação ocorre na Alesp nesta terça (8)
Texto via MST
Por meio da votação do Projeto de Lei (PL) 410/2021 na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), o Governo Doria pretende manter a proposta de regulamentar medidas que favorecem a privatização das terras públicas estaduais através da titulação de domínio aos lotes em assentamentos rurais, mas diz comprometer se com a não regularização da grilagem de terras públicas de São Paulo. A votação ocorre nesta terça-feira (8) em sessão extraordinária realizada de maneira virtual, dificultando a mobilização popular por parte de interessados(as).
Desde que foi apresentado em 26 de junho de 2021, diversos(as) pesquisadores(as) e entidades vêm denunciando a gravidade da implementação do PL 410/2021. Entre estas organizações, se manifestam contra a medida: o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Associação dos Funcionários da Fundação ITESP (AFITESP), a Comissão de Direitos Humanos da OAB, o Ministério Público do Estado de São Paulo, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CONDEPE).
De acordo com as entidades citadas, a obrigatoriedade do processo de titulação, conforme prevê o PL, impõe ao assentado uma dívida compulsória com o Estado, estando assim em nítido desacordo com o previsto na Constituição Federal, que garante ao beneficiário, em seu Artigo 189, o direito de livre escolha entre o Título de Domínio (TD) ou a Concessão de Direito Real de Uso (CDRU). A proposta também contraria a Constituição Estadual, que prevê, em seu Artigo 187, que “a concessão real de uso de terras públicas far-se-á por meio de contrato”, não havendo previsão legal para o Título de Domínio, conforme proposto pelo governo do Estado.
Considera-se que, frente à conjuntura atual, com crescente redução de recursos destinados ao fomento da agricultura familiar, desemprego estrutural e conjuntural, e crises econômica, política e institucional, uma equivocada titulação dos assentamentos estaduais poderá contribuir para o agravamento do cenário descrito, com empobrecimento da população rural e urbana de inúmeros municípios no Estado, desconfiguração dos assentamentos enquanto comunidades de direitos, trabalho e vida, “inchaço” das periferias das cidades, redução da produção e encarecimento dos alimentos, ameaçando, também, a segurança alimentar e nutricional da população paulista.
As entidades expõem ainda que, como não bastassem os riscos contidos no PL em sua redação original, somaram-se, também, os riscos advindos de parecer emitido pelo relator especial do PL na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP).
Por meio de emenda, foi proposta a modificação da ementa do Projeto de Lei, acrescentando-lhe artigo 4º que, conforme sua redação, possibilitaria “a alienação, onerosa, a pessoa natural, de terras devolutas ou presumivelmente devolutas, mediante pagamento de preço fixado […]”.
Tal proposta, caso acatada, possibilitaria a regularização da grilagem de terras públicas no estado de São Paulo, transferindo para as mãos dos grileiros em torno de 1 milhão de hectares de terras públicas, permitindo aos ocupantes irregulares (grileiros de terras) regularizar as áreas ilegalmente ocupadas mediante pagamento, acabando com qualquer possibilidade de arrecadação de terras devolutas para a implantação de novos assentamentos rurais.
Frente a ampla mobilização popular, às denúncias apresentadas por diversas entidades, à repercussão na imprensa e à polêmica resultante, após acordo entre as lideranças das bancadas na ALESP, o Projeto de Lei foi retirado de pauta no mês de dezembro de 2021, com o compromisso, por parte do Governo do Estado, de que seria criada uma comissão para melhor discutir e aprimorar o PL, superando os pontos de maior gravidade e divergências.