Minas Gerais enfrenta um colapso socioambiental provocado pelo avanço da mineração de lítio no Vale do Jequitinhonha. Diante de um cenário que combina destruição ambiental, exploração de recursos hídricos, doenças e exclusão das populações tradicionais, foi protocolada no Supremo Tribunal Federal (STF) a ADPF 1279.

A ação, apresentada pelo PSOL, em articulação com a deputada federal Célia Xakriabá, Mídia NINJA, Clímax e movimentos territoriais, nasce da mobilização construída durante o Clímax Vale do Jequitinhonha, realizado em Diamantina neste ano. No encontro, lideranças, pesquisadores e comunidades afetadas organizaram a denúncia e exigiram uma intervenção urgente da Corte.

Os efeitos diretos de uma política que acelerou licenças, reduziu controles e enfraqueceu a participação social permitiram que o setor mineral atuasse sem freios. A ADPF 1279 questiona os decretos 10.657/2021 e 10.965/2022, editados durante o governo Bolsonaro, que instituíram a chamada Política Pró-Minerais Estratégicos — um pacote que abriu caminho para a exploração acelerada e para a redução da fiscalização. A ação também contesta resoluções da Agência Nacional de Mineração (ANM) que diminuíram o controle socioambiental e facilitaram a aprovação de projetos altamente impactantes.

O Vale do Jequitinhonha está sendo esvaziado pela mineração

Em Araçuaí e Itinga, a mineradora Sigma Lithium se apresenta como “verde” e sustentável, mas a realidade nos territórios revela o oposto. A empresa consome até 3,6 milhões de litros de água por dia, enquanto famílias da região — afetadas pela seca e pela contaminação — precisam dividir apenas 5 litros por pessoa.

Para agravar o cenário, a expansão da Sigma é financiada com recursos do Fundo Clima do BNDES: R$ 486 milhões de dinheiro público estão sendo usados para ampliar o colapso socioambiental que já atinge comunidades indígenas, quilombolas e núcleos rurais.

O Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), por meio do Guia dos Bancos Responsáveis, publicou um relatório que aponta contradições entre as políticas institucionais divulgadas pelo BNDES e suas práticas de financiamento a projetos de extração de lítio na região. O documento revela um possível conflito entre o discurso de sustentabilidade e as práticas efetivas da Sigma Lithium.

Enquanto a empresa se apresenta como pioneira na produção de “lítio verde” e associa sua imagem aos princípios ASG (Ambiental, Social e Governança), as comunidades locais denunciam violações de direitos humanos, degradação ambiental e falta de transparência.

Sem controle, a mineração intensiva acelera a desertificação e o aquecimento extremo. Segundo dados do Cemaden, 27 das 30 cidades mais quentes do Brasil estão em Minas Gerais — a maioria no Vale do Jequitinhonha. A combinação entre devastação ambiental, uso abusivo de água e multiplicação de barragens transformou o território em uma zona de sacrifício.

Comunidades pagam a conta com doença, fome e exclusão

Em meio à crise climática global, o semiárido mineiro — e o Vale do Jequitinhonha em particular — enfrenta desafios sem precedentes. Ondas de calor extremo, seca e escassez hídrica agravam a vulnerabilidade da região, ameaçando o modo de vida e a cultura de seu povo.

Dezoito das vinte cidades brasileiras que registraram os maiores aumentos de temperatura estão no Vale, o que atesta a gravidade da situação.

As normas contestadas na ADPF retiram da sociedade a possibilidade de participação e consulta — especialmente de povos indígenas, quilombolas e agricultores, que são os mais afetados pelo colapso ambiental. Enquanto grandes corporações lucram, as populações locais enfrentam contaminação da água, dificuldade para plantar, desnutrição, insegurança hídrica e doenças.

Imagens enviadas por moradores mostram rios antes potáveis agora tomados por lama e sedimentos. Em várias comunidades, crianças e idosos adoecem por falta d’água e pela exposição à poeira tóxica gerada pelos projetos minerários.

O que pedimos ao STF

A ADPF exige que o Supremo:

reconheça o estado de exceção ambiental instalado no Brasil;

determine intervenção imediata para proteger comunidades e territórios;

reafirme o direito constitucional ao meio ambiente equilibrado.

A Constituição garante a proteção da vida, da água, das florestas e das populações tradicionais — princípios hoje frontalmente violados.

Da dor ao enfrentamento

O argumento central da ação é que, ao permitir que esses territórios se tornem zonas de sacrifício, o Estado viola direitos fundamentais e obrigações constitucionais.

O Vale do Jequitinhonha reage — e não em silêncio. A mobilização transforma indignação em estratégia política e jurídica. A defesa do clima, da água e da vida passa agora pelo Supremo Tribunal Federal, onde as comunidades exigem o reconhecimento de seu direito de existir com dignidade. Jequitinhonha reage, e não silenciosamente: a mobilização transforma indignação em estratégia política e jurídica. A defesa do clima, da água e da vida passa, agora, pelo Supremo Tribunal Federal, onde as comunidades exigem o reconhecimento de seu direito de existir com dignidade.

Confira o relatório completo do Clímax Vale do Jequitinhonha e a Carta-Manifesto.

Saiba mais sobre a resistência climática do Jequitinhonha no Instituto YÉKIT.