Indicações da semana #3
Quer entender melhor a conjuntura? Saber o que é a pós verdade? Analisar os padrões da sociedade atual? Algumas séries e filmes ajudam nessa relfexão e hoje Cláudio Prado, Bernardo Boechat e Liana Cirne Lins dão as dicas para o final de semana. Confira!
Liana Cirne Lins
Sense8 – Netflix
A série trata de uma outra espécie humana, distinta dos homo sapiens: os homo sensorium, pessoas com elevada capacidade de empatia e que conseguem vivenciar as experiências das outras como se fossem suas. Naturalmente, por suas capacidades extraordinárias, os Sense8 são perseguidos pelo governo americano, que quer encontrar uma forma de usá-los como armas.
O que é interessante em Sense8 é justamente o que normalmente detestamos em séries e filmes: seus clichês.
O personagem mexicano é um clichê dos tipos latinos, machão e histriônico. A indiana é pudica e recatada, em busca do amor verdadeiro e, adivinhem?, se apaixona pelo bad boy da série. A descolada é descolada, com piercings, tattoos, mechas azuis no cabelo, mas o que mais incomoda nela é aquela postura etérea, calada e misteriosa (que eu particularmente acho um saco). O policial obstinado. E por aí vai.
Mas, ao mesmo tempo, esses clichês mudaram. Mudaram porque a heroína é uma mulher trans e lésbica. A homossexualidade é uma bandeira, sim, ao mesmo tempo em que se incorpora com naturalidade nas relações cotidianas travadas na série. É delicioso ver a interação entre os oito personagens tão diferentes entre si e como eles se apoiam, se ajudam e se complementam em suas diferenças.
E, de quebra, temos uma cena dos Sense8 na Parada do Orgulho Gay de São Paulo. Fiquem atentos a essa cena. Cartazes contra o golpe e Fora Temer estão no meio da multidão da Parada.
Em tempos em que a empatia e a capacidade de nos colocarmos no lugar dos outros tem sido tão necessárias, Sense8 traz uma bela metáfora sobre acolhimento e tolerância.
Cláudio Prado
Lincon – Steven Spielberg
O filme de Steven Spielberg é essencial para entender os bastidores da política de regimes presidencialistas.
O longa descreve a Guerra Civil dos Estados Unidos, travada entre 1861 e 1865 nos Estados Unidos e a vitória de Abraham Lincoln nas eleições de 1860. Com a bandeira anti escravagista, Lincon constrói sua campanha tendo de lidar com vários estados do sul que declararam radicalmente contra a liberação dos escravos. A real causa dessa sangrenta guerra.
Analisando os dias de hoje, o filme possibilita uma comparação dos bastidores podres do nosso Congresso com as manobras que foram necessárias para a libertação dos escravos nos Estados Unidos.
Bernardo Boechat
Get Me Roger Stone – Netflix
A vitória de Donald Trump ao cargo de presidência norte americana é mais do que um caso inusitado e controverso. É a validação de duas vertentes filosóficas importantes para o cenário político mundial. A primeira já colheu frutos também no Brasil: o nascimento da figura do “gestor/empresário” como solução para uma suposta “limpeza moral” na máquina política, falida na percepção da população. A segunda sempre existiu, mas ganhou novos ares na campanha de Trump: o jogo sujo, que perdeu qualquer pudor em ser explícito, mas também se desvinculou definitivamente de qualquer compromisso com a verdade.
Nessa fase de “pós-verdade”, uma mentira que se torna verdade quando repetida o suficiente, pessoas como Roger Stone ganham destaque por sua habilidade em usar a violência e a desonestidade como arma política. O documentário “Get Me Roger Stone” mostra com detalhes a vida política do conhecido lobista americano, responsável pelo direcionamento da campanha que levou Trump ao poder. Mas também mostra a influência de Stone na vitória de Bush sobre Al Gore e sua participação na criação do lobby nos Estados Unidos. Tudo isso, por mais incrível que pareça, narrado pelo próprio Roger Stone.
Se ainda te choca ver políticos que mentem, manipulam ou que votam por “Deus” ou pela “família”, assistir “Get Me Roger Stone” no Netflix pode te dar uma noção mais ampla não só de que jogo estamos jogando, mas também de que tipo de jogadores podemos estar lidando também aqui em terras brasileiras.
