Por Vênus Amália

Recentemente, temos visto um crescimento notável nos casos de violência e, principalmente, de tentativas de massacres em escolas.

O último caso aconteceu na nesta quarta-feira (05) em uma creche de Blumenau, em Santa Catarina, onde quatro crianças morreram e outras quatro ficaram feridas.

O ataque provavelmente foi inspirado pelo episódio que ocorreu na última segunda-feira (27), que vitimou uma professora de 71 anos e deixou outras três feridas em uma escola do estado de São Paulo. A tragédia só não foi maior porque uma professora conseguiu imobilizar o adolescente e autor do crime.

A brutalidade e a frequência com que esses eventos têm ocorrido chamam a atenção e levantam uma dúvida: por que estamos presenciando, de repente, tantos casos de violência no Brasil?

Esse tipo de atentado é muito comum nos Estados Unidos. De acordo com o Gun Violence Archive, o país teve 246 massacres com armas em 2022.

Esse aumento teve início após o Massacre de Columbine, ocorrido em 20 de abril de 1999, quando dois alunos da Columbine High School invadiram a escola e abriram fogo contra os colegas, resultando em 12 mortos e 24 feridos. Os autores, Eric Harris de 18 anos e Dylan Klebold de 17 anos, cometeram suicídio logo após o crime.

O ar ritualístico, as roupas, a preparação e a forma como tudo aconteceu atraiu a atenção de inúmeros jovens, que passaram a admirar a ação de Eric e Dylan.

Um dos atentados mais emblemáticos do Brasil ocorreu em 13 de março de 2019, na Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano (SP). O atentado foi planejado por dois ex-alunos da instituição. O crime vitimou dez pessoas, incluindo os autores, que tiraram as próprias vidas após os homicídios.

Assim como no massacre de Columbine, nos Estados Unidos, os assassinos brasileiros também têm ganhado admiradores. E, quase sempre, após esse tipo de crime, ocorrem novos episódios da mesma natureza ou há tentativas semelhantes.

Logo após o ocorrido em São Paulo, em março deste ano, um aluno do Rio de Janeiro entrou com uma faca em uma escola e tentou atacar os colegas, mas felizmente foi detido por funcionários do colégio.

Todos esses incidentes me fizeram pensar sobre a responsabilidade da mídia ao noticiar esses fatos. Temos o papel social de informar e a população tem o direito à informação, mas até que ponto?

Como podemos ver, essas tragédias, mesmo que não intencionalmente, acabam inspirando outras pessoas a cometer atos semelhantes.

Aqui, vamos ignorar os fatores psicológicos, sociais, crenças e vivências de cada um. Vamos focar apenas no papel dos veículos de comunicação na divulgação de crimes violentos.

De certa forma, a violência foi banalizada. É quase impossível assistir a um noticiário ou ler uma notícia que não envolva morte. É difícil acreditar que não haverá nenhuma notícia desse tipo em um noticiário.

Na faculdade, a frase que mais ouvi foi: “onde há morte, há jornalistas”, e embora trágica e fúnebre, é a realidade.

Sabemos que a morte é um dos critérios de noticiabilidade, mas até onde precisamos informar sobre isso?

Com tantos casos de massacres e violência extrema que somos expostos diariamente, urge a necessidade de um diálogo sobre qual a abordagem mais adequada e responsável que a imprensa deve adotar ao noticiar essas tragédias.

Atribuo o aumento da veiculação de conteúdos violentos ao crescimento da internet. A internet não é terra de ninguém, mas é muito mais livre do que qualquer portal de notícias. É claro que, ao dizer isso, não estou defendendo o seu fim ou algo do tipo.

Os usuários podem postar fotos ou vídeos contendo violência extrema, sangue e crueldade, e muitas vezes esses conteúdos não são retirados do ar, ficando disponíveis para serem visualizados por milhares de pessoas.

Além disso, tudo na internet acontece muito rápido. Alguma coisa acontece e em dois minutos já está nas redes.

Assim, o furo de notícia, que era algo tão cobiçado antigamente, se tornou quase impossível. Como forma de acompanhar as redes sociais, a mídia precisou se adequar de muitas formas, e uma delas foi justamente a publicação de um conteúdo mais próximo do grotesco, o que não era comum até então.

Antes da popularização da internet, era raro ver um aviso de ‘imagens fortes’, na televisão, asntes da exibição de um crime brutal.

Por dois motivos. Primeiro, não podemos esquecer que o jornalismo também é uma indústria e, portanto, precisa de patrocinadores, merchandising e investimentos de terceiros. Consequentemente, quanto mais visitas, acessos e dinheiro, melhor. Entretanto, levanto outra questão: até quando os interesses mercadológicos devem prevalecer sobre s vida das pessoas?

O segundo motivo é simples: a natureza do ser humano é visual. É preciso ‘ver para crer’. Não basta uma narrativa dos fatos, é necessário ‘ver com os próprios olhos’.

E, nesse desespero pelo visual, acontece outro fenômeno: estamos cada vez mais acostumados com imagens violentas, agressivas e sensacionalistas, chegando ao ponto em que desenvolvemos uma certa “tolerância” e precisamos nos confrontar com situações ainda mais chocantes para nos sentirmos afetados ou despertarmos empatia.

Faço uma comparação com o uso de medicamentos. Se você toma um determinado remédio por um longo período, seu corpo pode se acostumar e você precisará de uma dose mais forte para obter o mesmo efeito.

Aparentemente, isso tem acontecido com a brutalidade presente na nossa realidade. Nada mais nos choca, nos abala. E infelizmente, a mídia desempenha um papel importante nisso.

Precisamos criar medidas para frear essa resistência e começar a pensar no futuro. Que tipo de mundo queremos para nossos filhos e netos? Queremos deixar uma herança de violência ou de paz?

É necessário ter uma discussão dura e até mesmo chata sobre a regulação da mídia e sobre como iremos proceder a partir daqui, senão, aos poucos, estaremos cada vez mais perto de viver em um universo similar aos filmes sangrentos de Quentin Tarantino e sequer nos daremos conta.

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