Torcida quilombola e torcida cigana: um Brasil que se encontra na Copa do Mundo
Uma visita ao quilombo do Achado de Cima, na zona rural de Santana do Paraíso (MG), em tempos de Copa do Mundo
Por Levina Gramelick
Eu fui até o quilombo do Achado de Cima, pertencente à zona rural do município de Santana do Paraíso, no leste de Minas Gerais. Conversei com duas mulheres uma quilombola e outra descendente de quilombolas sobre como elas torcem para o Brasil na copa.
Segundo o Licenciado em História e Especialista em Turismo e Patrimônio Histórico de São João do Meriti, na Baixada Fluminense, Inácio Antônio Ferreira, Quilombo é o local onde os escravizados iam quando conseguiam fugir do seu senhores, ora nas fazendas, ou no meio urbano.” Ele conta também, que a palavra Quilombo é originária do banto (língua africana). Kilombo significa, acampamento ou fortaleza e foi usado pelos portugueses para denominar as povoações construídas por escravos fugidos.
A primeira mulher que conversei é descendente de quilombolas, artista independente, poeta, mc, capoeirista, percussionista e taróloga, Preta Lua, ( @preta_lua_ ) que mora na cidade de Ipatinga também no Leste de Minas. Preta Lua se descreve como torcedora do Atlético Mineiro, mas que é uma torcedora passiva e gosta de acompanhar o jogo socialmente sem entrar em conflitos com pessoas do time rival.
Ela conta que na cidade ela chama os amigos, define um local para comer, beber, além de levar uma caixa de som alta para o pós-jogo. E disse ainda: ‘E é só felicidade!” E completa : “Este ano vem o hexa”.
Preta Lua, não foge de perguntas. Ela responde sem pestanejar sobre o fato do Brasil, nunca ter tido um técnico da seleção negro, em todos os seus anos de copa do mundo. “Para o que deveria valer é a competência do técnico e não se ele é preto ou branco. Mas, infelizmente o preconceito enraizado ainda exclui nosso povo ao direito de estar. A imagem de um branco patrão, na percepção deles, pode trazer uma formalidade para a imagem do time ou clube. Afinal, isso é triste demais no mundo com tanta diversidade, ainda acontecer essas concessões”, afirma.
Quilombo do Achado
Outra quilombola que conversei é a dona de casa Fabiana, de 36 anos. Ela é moradora do Quilombo do Achado, em Santana do Paraíso, MG. Fabiana conta que torcer mesmo é para o Atlético mineiro, mas quando tem Copa do Mundo, a torcida dela é sem dúvidas para o Brasil. Mas que no quilombo em que ela vive, não existe essa paixão por futebol e, portanto, as pessoas não se juntam para ver os jogos. Não é comum as pessoas comprarem camisa e bandeira para torcer. E, que na verdade, quem quer assistir o jogo de futebol vê em casa. Sobre o fato do Brasil em 22 edições da Copa do Mundo, nunca ter mandado um técnico negro Fabiana foi enfática: “Racismo!”
Você, assim como eu, sabe que o Brasil é um país riquíssimo em diversidade. Outro grupo étnico muito próximo a nós são os ciganos. Entre as etnicidade dos ciganos, a que mais conhecemos são os ciganos Calon, aqueles que acampam bem próximo à cidades e que as mulheres têm vestidos e saias bem brilhantes, fazem leitura de mãos e muitas têm os dentes de ouro, assim como os homens que usam chapéu no estilo Country e muitas vezes vendem panelas e colchas.
Foi com uma Calin, como as ciganas se reconhecem do Clã Calon, sub-clã mineiro, que conversei. Hátila é criadora de conteúdo e ativista da etnia cigana. Ela nasceu em Governador Valadares, Minas Gerais e atualmente mora no Sul da Bahia. Ainda que a vida nômade já foi parte da vida dela mesmo assim ela nunca morou em um acampamento. Já que seu pai depois do casamento com sua mãe, optou pela vida sedentária. A adolescente de 16 anos é dona da conta @hatilacigana e de um perfil do Tik-Tok que conta com 40K de seguidores. Ela é muito consciente para idade dela e responde qualquer pergunta com muita fluidez.
Hátila é torcedora do Corinthians, mas conta que se considera uma torcedora razoável. Ela disse: “Não sou tão fanática, e para ciganos realmente não é como por exemplo um assunto viral no momento. O futebol não é tão comum nem mesmo entre os homens. Em tempo de jogo principalmente a Copa, algumas famílias se juntam e fazem aquela confraternização com churrasco e bebidas”, aponta.
Ela contou que assiste o jogo quando está com tempo, já que estuda. Apesar disso, como qualquer adolescente brasileira, Hátila se arruma com um lindo vestido cigano, verde e branco com um bordado riquíssimo e com um lindo brinco azul. E se juntou à sua família para gritar gol para o Brasil. Na opinião dela, não há nenhuma diferença na comemoração dos não ciganos, a quem eles chamam de gadjos.
Texto produzido em cobertura colaborativa da NINJA Esporte Clube.