Cientistas condenam portaria da Capes que reduz bolsas de pesquisa em plena pandemia de coronavírus
Para o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Ildeo Moreira, a medida da Capes poderá levar o sistema de pós-graduação nacional ao colapso no momento em que o país mais se precisa da pesquisa científica.
Uma portaria publicada pela Capes em 9 de março deste ano, reduz bolsas de mestrado e doutorado em várias instituições públicas de pesquisa e pode levar o sistema de pós-graduação brasileiro ao colapso, no momento em que mais se precisa da produção científica. Na portaria, a Capes informa que a medida foi tomada por “orientação central” do Ministério da Educação (MEC), redefinindo pisos e tetos das bolsas, afetando todos os programas de pós-graduação com nota 3 e 4.
O presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ildeo Moreira fez um alerta para o contrassenso da medida do governo de Jair Bolsonaro em um ofício enviado ao presidente da Capes, Benedito Aguiar Neto.
“É paradoxal que, num momento em que o Brasil vive situação de extrema dificuldade causada pela pandemia do COVID-19, cujo enfrentamento requer exatamente o fortalecimento de nossa capacidade de produzir conhecimento científico em todas as áreas, sejam feitos cortes nas cotas de bolsas de pós-graduação”, afirma o presidente da SBPC.
A Capes informou que a portaria “não implica em nenhum corte ou descontinuidade de pagamento das bolsas” e que ela “ampliou a velocidade de convergência das diretrizes para privilegiar os cursos mais bem avaliados.”
Leia o ofício na íntegra:
OFÍCIO DO PRESIDENTE DA SBPC AO PRESIDENTE DA CAPES
São Paulo, 20 de março de 2020
SBPC-038/Dir.
Excelentísimo Senhor
Presidente BENEDITO GUIMARÃES AGUIAR NETO
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
Ministério da Educação
Brasília, DF.
Senhor Presidente,
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e Sociedades Científicas Afiliadas a ela receberam com surpresa e enorme preocupação a Portaria CAPES no 34, de 9 de março de 2020, dispondo sobre fomento a cursos de pós-graduação stricto sensu.
Causa perplexidade a urgência com que a referida portaria foi editada, revogando a forma de distribuição anteriormente discutida e acordada com a comunidade científica.
A redação da referida Portaria indica que poderá haver redução significativa de bolsas de Mestrado e de Doutorado em todos os Programas de Pós-Graduação, independentemente de sua qualidade ou qualquer outro critério objetivo.
Assim, sua implementação poderá levar o sistema de pós-graduação nacional ao colapso.
Em reunião realizada no último dia 11 de março na sede da SBPC, com a presença de Vossa Senhoria e de representantes de Sociedades Científicas, buscamos estabelecer um canal de diálogo para tratar dos desafios atuais e futuros da pós-graduação brasileira.
Foi criado um Grupo de Trabalho que congrega a SBPC e dirigentes de Sociedades para acompanhar e sugerir diretrizes e políticas.
Fomos todos surpreendidos por esta Portaria que não foi discutida com representantes da comunidade científica, com atores institucionais como a ANDIFES e o FOPROP, nem mesmo no Conselho Superior da própria CAPES.
É paradoxal que, num momento em que o Brasil vive situação de extrema dificuldade causada pela pandemia do COVID-19, cujo enfrentamento requer exatamente o fortalecimento de nossa capacidade de produzir conhecimento científico em todas as áreas, sejam feitos cortes nas cotas de bolsas de pós-graduação.
A excelência da produção científica depende criticamente da qualidade da gestão elaborada pelos órgãos responsáveis.
Desta forma, a SBPC e as Sociedades Científicas reforçam as manifestações pela imediata revogação da Portaria 34 e pelo estabelecimento de prazo hábil para que possamos elaborar as demandas da comunidade científica no sentido que de resolver os graves problemas que enfrentamos no momento.
Entendemos que as ações da CAPES são de extrema importância para o desenvolvimento científico do país, ações que seguem um longo histórico de discussão e gestão conjuntas com a comunidade científica ao longo de décadas.
Ao encerrar, nos colocamos ao seu dispor para o necessário diálogo com vistas aos desafios e às políticas para o desenvolvimento da pós-graduação.
Atenciosamente,
ILDEU DE CASTRO MOREIRA
Presidente da SBPC