Chile 2025: o que está em jogo entre Jeannette Jara e a (não tão) nova direita
Chile vive um dia decisivo: o primeiro turno começa com expectativa, tensão e disputa pelo futuro político do país
Por Camila Modanez*
O Chile vive um dia decisivo. As urnas do primeiro turno se abrem em meio a expectativa e tensão, em uma disputa que pode redefinir o futuro político do país.
As pesquisas apontam Jeannette Jara — candidata da coalizão Unidad por Chile e ex-ministra do Trabalho — como favorita para liderar a votação, à frente de José Antonio Kast, principal nome da ultradireita. No entanto, o campo conservador chega fragmentado por diversas candidaturas, como Kaiser, Parisi e Matthei.
Essa divisão enfraquece a direita no primeiro turno, mas tende a unificá-la na segunda etapa. O cenário mantém o resultado em aberto e impõe desafios significativos à candidatura de Jara, que representa o campo popular e progressista.
Ainda assim, o desempenho de sua campanha marca um ponto de inflexão na política chilena e sinaliza para toda a América Latina a vitalidade da esquerda num momento de avanço das agendas autoritárias e neoliberais.
Jeannette Jara encarna um projeto de governo enraizado na experiência popular, construído pela escuta e pelo diálogo social. Seu programa, Un Chile que Cumple, propõe um Estado social e democrático de direito que recupere o sentido mais concreto da política: melhorar a vida das pessoas.
A agenda está organizada em quatro eixos centrais: crescimento econômico justo e sustentável; segurança e combate ao crime organizado; fortalecimento do Estado Social em saúde, educação e habitação; e democracia com participação e direitos.
Jara combina firmeza e experiência com uma liderança serena, próxima da população, capaz de construir acordos amplos sem abrir mão de princípios. Seu projeto não promete milagres — promete soluções concretas, governabilidade e justiça social.
Defende uma economia produtiva, trabalho decente, soberania e protagonismo regional. Em resumo: oferece ao Chile estabilidade com transformação — um país que cresce, mas que também cumpre com sua gente.
Do outro lado, José Antonio Kast representa a tentativa de reunificar a direita chilena em torno de um projeto autoritário e ultraliberal, que promete “ordem” às custas de direitos. Seu discurso resgata o legado pinochetista e aposta na criminalização da política e dos movimentos sociais.
A seu redor orbitam figuras como Franco Parisi, com seu populismo antipolítica e visão de mercado; Evelyn Matthei, que busca resgatar uma direita tradicional hoje fragmentada; e Johannes Kaiser, expoente do neopinochetismo mais radical, articulado nas redes com discurso de ódio contra a esquerda.
Embora disputem espaço entre si no primeiro turno, esses setores compartilham um mesmo horizonte: reduzir o papel do Estado, desmontar o Estado Social e naturalizar a desigualdade.
A tendência é que, no segundo turno, essas forças se aglutinem em torno de Kast, o que impõe ainda mais desafios à candidatura de Jara.
O que acontece hoje no Chile ultrapassa suas fronteiras. A disputa entre Jara e a ultradireita sintetiza um embate que atravessa toda a América Latina: de um lado, projetos de democracia social que buscam reconstruir Estados fortes, garantir direitos e enfrentar desigualdades; de outro, forças que pretendem reinstalar o neoliberalismo autoritário e a política do medo.
O Chile — laboratório histórico do neoliberalismo e símbolo das lutas por dignidade — volta ao centro da disputa continental. O avanço de Jara expressa uma esquerda que aprendeu a governar com responsabilidade, sem abrir mão da transformação.
Mesmo diante das dificuldades previstas para o segundo turno, sua candidatura já recoloca o Chile no mapa das esperanças progressistas da região. O resultado desta eleição dirá muito não apenas sobre o futuro chileno, mas sobre o rumo de toda a América Latina, definindo se seguimos pela via das políticas de exclusão ou pela construção de um continente que, enfim, cumpre com sua gente.
*Camila Modanez é especialista em mobilização digital e integrante do conselho do Barão de Itararé. Escreve sobre eleições, comunicação, tecnologia e América Latina.



