
Centro de Referência em Justiça Reprodutiva DIJURE apoia mulheres no acesso ao aborto legal em todo o Brasil
O centro oferece acolhimento, orientação, encaminhamento e acompanhamento responsável de casos no âmbito da justiça reprodutiva
Por Bruna Moreira para Planeta ELLA
O Centro de Referência em Justiça Reprodutiva DIJURE oferece acolhimento, orientação, encaminhamento e acompanhamento responsável de casos no âmbito da justiça reprodutiva, com ênfase na promoção e defesa do direito ao acesso à interrupção da gravidez nas situações previstas em lei. O atendimento ocorre de forma virtual, através do WhatsApp ou email, e não é necessário que a pessoa atendida se identifique, o que garante sigilo e segurança para quem procura ajuda. O Centro de Referência atende pessoas de todas as regiões do Brasil.
Em quais situações o Centro de Referência pode ser acionado?
O Centro de Referência DIJURE presta informações e faz o encaminhamento responsável de:
– Casos relacionados ao acesso à saúde reprodutiva, especialmente nas situações que envolvem o acesso à interrupção da gravidez prevista em lei ou que possam ser autorizadas judicialmente. Essas hipóteses ocorrem:
quando a gravidez decorre de violência sexual;
– Quando a gravidez representa risco para a vida da pessoa gestante;
em caso de anencefalia fetal e de outros diagnósticos que confirmem a incompatibilidade com a vida extrauterina.
Demandas motivadas por violências obstétricas e institucionais sofridas em
contextos de perda gestacional e de abortamento previsto em lei;
– Pedidos de apoio de profissionais da saúde e do direito que estejam enfrentando criminalização ou assédio pela assistência prestada a pessoas em situação de interrupção da gravidez prevista em lei;
– Propostas de apoio e articulação por parte de organizações e instituições que tenham interesse em fortalecer suas intervenções em casos concretos ou queiram elaborar estratégias jurídicas no campo da justiça reprodutiva;
Solicitações de informações sobre estudos e pesquisas no campo da justiça
reprodutiva.
O Centro de Referência em Justiça Reprodutiva nasce a partir do projeto Diálogos sobre Justiça Reprodutiva: Normas Jurídicas, Políticas Públicas e Práticas de Litígio (DIJURE), um projeto de extensão, ensino, pesquisa e inovação da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). O Centro de Referência DIJURE surge da demanda dos movimentos sociais que procuravam a equipe do projeto para orientação em casos no campo da justiça reprodutiva. Além disso, o diálogo do DIJURE com as Defensorias Públicas de diferentes estados fez com que as pesquisadoras do projeto percebessem que não havia um núcleo especializado e com atendimento imediato sobre o tema do aborto. Por isso, as pessoas não sabiam onde procurar essa orientação.
Como o Centro de Referência atua: a articulação em rede.
O diálogo com diferentes frentes da sociedade está no centro da atuação do DIJURE e é o modo como o Centro de Referência opera nos atendimentos. O Centro de Referência DIJURE funciona como um hub de informações e de articulação da rede necessária para garantia de direitos reprodutivos, em que as orientações e encaminhamentos durante os atendimentos irão convocar a interação entre o sistema de justiça, os serviços de saúde e os movimentos sociais. A pessoa atendida será orientada a procurar uma unidade de saúde ou hospital de referência para o aborto legal na sua região e, em caso de barreiras, dificuldades ou a ocorrência de violências no acesso ao serviço, serão indicados órgãos que prestam assistência jurídica gratuita, como a Defensoria Pública.
“A gente manda uma mensagem pra alguém de um serviço que a gente conheça. A gente tenta articular essa rede. Então, o centro de referência é esse lugar de referência mesmo pra gente referenciar e fazer esses encaminhamentos responsáveis que não são ficar mandando a mulher de um lugar pro outro. Não adianta uma mulher dizer pra gente ‘tô precisando do serviço’. A primeira coisa que a gente vai dizer, ‘olha, na sua cidade a gente sabe que existem esses serviços. Você já tentou ir lá? Tentou? Tentou e não conseguiu? Peraí que nós vamos ver como é que a gente pode articular.’ A gente vai pedir um ofício para a defensoria? A gente vai pedir pra um defensor te atender?”, Integrante da equipe DIJURE
Mas como esse diálogo intersetorial ocorre na prática? Como o Centro de Referência assegura que a mulher será atendida com dignidade e a sua demanda será suprida?
Levando em consideração as falhas existentes nos sistemas de justiça e de saúde, o DIJURE busca mitigar que as atendidas tenham seus direitos violados através de uma estratégia de relacionamento e comunicação com diferentes profissionais da rede de atendimento. A equipe do DIJURE possui ampla articulação com profissionais que atuam nos diferentes dispositivos da justiça e da saúde e que estão comprometidos em garantir os direitos das mulheres que os procuram. Na prática, diante de um caso que chega ao Centro de Referência, é identificado quais locais e profissionais podem ser acionados, podendo a eles ser passado o caso, deixando a instituição ou profissional ciente das particularidades da situação e pronto para receber e/ou entrar em contato com a pessoa que precisa de auxílio. Esse mecanismo busca assegurar a garantia de direitos e evitar a revitimização da pessoa atendida.
Graças às articulações do DIJURE em diferentes Estados e a presença em fóruns nacionais (como o Fórum das Defensorias Públicas e o Fórum do Aborto Legal), o Centro Referência é capaz atender pessoas do Brasil todo.
“A gente está no Fórum das Defensorias, por exemplo, ou no Fórum de Aborto Legal, a gente fala, ‘alguém tem alguém aí do Acre que possa ajudar a gente? Alguém tem alguém de Rio Branco, de alguma cidade?’ Então, é um pouco nessa rede de relacionamentos que a gente está trabalhando no momento.”
“A gente é uma rede de relacionamento. A gente criou uma rede de relacionamento capaz de tentar enfrentar essas barreiras, a gente criou uma rede de acolhimento também e de relacionamento, eu acho que de relacionamento mesmo com os profissionais, tanto da justiça quanto da saúde”, afirmam desde DIJURE
Uma visão ampliada da justiça reprodutiva
O trabalho que o Centro de Referência desempenha leva em consideração que a justiça reprodutiva é ampla e pode ser assegurada não só pela resolução de demandas vinculadas diretamente ao direito ao aborto, mas sim levando em consideração outros fatores que possam promover o bem-estar da pessoa que procura por ajuda. Um exemplo desse olhar ampliado, foi um caso atendido antes mesmo da criação do DIJURE, em que uma mulher foi violentada por um colega de faculdade e engravidou e, após realizar o abortamento, procurou ajuda para transferência de instituição, já que naquele ambiente não era mais possível conviver devido ao trauma, e com ajuda e olhar sensível, foi possível a reparação de danos indiretos da violência. O caso inspirou a criação do Centro de Referência com uma atuação pautada não apenas no atendimento ao aborto em si, mas também no encaminhamento responsável e no acionamento de toda a rede necessária para garantir direitos relacionados.
Olhar interseccional e escuta atenta
Escuta atenta e sensível à demanda daquela pessoa que está pedindo ajuda. O que aquela mulher, que está ali do outro lado da linha, está necessitando? Quais os serviços disponíveis no território em que ela mora? Esse olhar interseccional, ou seja, atento aos marcadores sociais (como raça, gênero, classe e território) e às violências advindas deles, para fornecer ajuda levando em consideração as especificidades de cada caso. Não se trata de oferecer soluções prontas para determinada demanda, mas sim auxiliar no que for possível levando em consideração as condições da pessoa atendida e, principalmente, o quê essa pessoa gostaria de fazer diante da situação – por exemplo, em casos de violência sexual é possível realizar o boletim de ocorrência, mas a essa vítima pode não desejar fazer a denúncia e isso deve ser respeitado.
A metodologia: protocolo de atendimento
O atendimento é mediado por um protocolo desenvolvido pelas pesquisadoras do DIJURE e visa padronizar as orientações, garantindo que todas as pessoas recebam informações consistentes e um atendimento humanizado. Cabe ressaltar que o atendimento não é feito por inteligência artificial, mas sim todo atendimento é realizado por profissionais da equipe, devidamente capacitados para atender os casos.
“A gente não é uma coisa aberta, né? Não é um serviço de aconselhamento. A gente tem que seguir uma metodologia e procurar falar mais ou menos as mesmas coisas pra todas as pessoas. Mas entendendo caso a caso. E sendo esse lugar, assim, de desatar os nós.”, afirmam desde DIJURE
Mapeamento dos serviços e o constante aprimoramento do protocolo
O contato com diferentes casos possibilita o mapeamento dos serviços disponíveis para a garantia dos direitos reprodutivos, identificando como eles funcionam e quais são as suas falhas e potencialidades. Através das dificuldades relatadas pelas pessoas atendidas, é possível mapear os possíveis obstáculos institucionais que a pessoa pode vir a enfrentar e implementá-los no protocolo de atendimento, a fim de prever e mitigar esse possível impedimento ao acesso pleno dos direitos. Esse mapeamento é fundamental para planejar encaminhamentos responsáveis e seguros e demonstra um protocolo de atendimento que está em constante atualização e aprimoramento para melhor atender quem procura o Centro de Referência.
Amizade crítica feminista
Essa atuação da equipe se ampara em um referencial ético, conceituado pela advogada e professora titular da USP Fabiana Severi, chamado amizade crítica feminista. A amizade crítica feminista é um modelo de interação ética que vai além do relacionamento informal, marcado pela abertura à pesquisa e pela produção de críticas construtivas, sem intenção de deslegitimar os serviços. O objetivo é fortalecer e aperfeiçoar as instituições, garantindo sua continuidade e protegendo quem atua nelas. No Centro de Referência, esse princípio orienta a forma de analisar as falhas e as barreiras dos serviços: a crítica não busca fragilizar o atendimento, mas sim contribuir para transformá-lo e potencializar sua eficácia no enfrentamento à violência e violação dos direitos.
O acolhimento em um momento de vulnerabilidade: sobre não deixar essa mulher sozinha e desamparada
O atendimento prestado pelo Centro de Referência vai muito além de orientações práticas para a resolução de demandas. A equipe oferece uma companhia para essa caminhada árdua, um colo, um abraço para aquela mulher que, muitas vezes, se encontra sozinha diante de uma situação traumática. O Centro de Referência se preocupa em amparar essa mulher, mesmo que de longe, garantindo que ela acesse os seus direitos e não se sinta sozinha durante essa jornada.
“O nosso caso que a gente teve até agora, exemplar, digamos assim, porque ela conseguiu realizar o procedimento, nós ficamos acompanhando ela o tempo todo e a gente teve sucesso, a gente estava preparado para acionar as redes que fossem necessárias e o depoimento dela depois para a pessoa que acompanhou esse caso, foi de que ela não se sentiu sozinha, de que mesmo ela estando sem nenhum familiar, foi fundamental ela ter aquele WhatsApp ali para poder trocar e para dizer ‘já cheguei no hospital, é aqui que eu estou, eu vou ter como voltar, não vou ter’.”reflexionam desde DIJURE
O cuidado que transborda nos detalhes: um pequeno relato de campo
Eu e minha colega do Planeta ELLA fomos recebidas com muito carinho por toda a equipe do DIJURE. Fomos recebidas para a entrevista com uma linda mesa de café da tarde, água gelada e com muito entusiasmo de toda equipe, que já nos esperava em uma mesa redonda. Antes mesmo de iniciar as perguntas, já percebi que estava diante de pessoas apaixonadas pelo trabalho que era construído ali naquele espaço. A entrevista mobilizou afetos, emoções, rememorou histórias e relembrou a todas da equipe o porquê estavam ali ocupando aquele espaço, pesquisando sobre o tema e desempenhando aquele serviço, muitas vezes árduo. O brilho no olho, o arrepio e emoção ao lembrar de uma história, o cuidado com cada detalhe da recepção e o afeto que pairava naquela sala são a materialização do comprometimento e cuidado do DIJURE. Que sorte a nossa, que sorte a de todas as mulheres terem essa equipe lutando pelo direito de todas nós!
Como entrar em contato com o Centro de Referência?
O Centro de Referência DIJURE funciona online de segunda à sexta, em dias úteis, das 13h às 17h.
Você pode entrar em contato por email ou mensagem de texto ou de áudio pelo WhatsApp.
Pelo WhatsApp:
(21) 3858-9138
Ou pelo e-mail:
[email protected]