Brasil já deixou de concorrer ao Oscar por erro de tradução
Confira detalhes sobre o ano em que o Brasil perdeu sua melhor chance de vencer o Oscar por um erro de interpretação na tradução de uma palavra
Por Paulo César Silva*
O Brasil já esteve presente na premiação da Academia algumas vezes, porém, nunca como um favorito ao prêmio. Na categoria de Filme Estrangeiro, hoje chamada de Filme Internacional, foi finalista em 1963 com O Pagador de Promessas; em 1996 com O Quatrilho; em 1998 com O que é isso companheiro?; e em 1999 com Central do Brasil, talvez o que tenha conseguido maior burburinho, vencendo o Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro e conseguindo a primeira indicação ao prêmio de atriz a uma latinoamericana, Fernanda Montenegro.
Mesmo assim, nunca o status de favorito esteve ao lado de nossas produções, nem mesmo nas quatro indicações de Cidade de Deus (diretor, roteiro adaptado, montagem e fotografia) em 2004. Entretanto, no final de 1981, um filme brasileiro despontava como favorito na disputa. Só não contava com o erro de interpretação na tradução de uma palavra.
O filme Pixote – A lei do mais fraco, do argentino radicado no Brasil Hector Babenco, foi um enorme sucesso de crítica e público quando estreou em solo brasileiro em setembro de 1980, e, além da qualidade, cumpria todos requisitos para representar o país no Oscar de 1981. Porém, a Embrafilme, que escolhia o representante brasileiro na época, entendeu que seria melhor deixar o longa para o Oscar de 1982. Assim teriam mais tempo para fazer uma campanha que conseguisse chamar a atenção dos votantes da Academia. E assim foi.
O filme estreou em Nova Iorque em maio de 1981 e no restante dos Estados Unidos em setembro do mesmo ano, com uma repercussão excepcional. Babenco deu entrevistas para vários jornais, como o Los Angeles Times em que foi capa do cobiçado caderno de cultura. O filme venceu os prêmios da crítica de Los Angeles e Nova Iorque, os dois maiores centros votantes do prêmio. Além disso, o hype levou o nome de Marília Pêra diretamente para a corrida de melhor atriz. A imprensa brasileira estava eufórica e o primeiro Oscar do país parecia bem encaminhado.
Porém, dias após a submissão do filme para a premiação, os brasileiros receberam um telegrama agradecendo pelo envio, mas comunicando a desclassificação de Pixote, por infringir uma das regras de lançamento. Segundo as regras da Academia, o filme seria elegível caso tivesse sido lançado entre 1 de novembro de 1980 a 31 de outubro de 1981. A Embrafilme contestou a decisão, pois entendia que estava dentro das regras e um representante foi a uma reunião com a Academia para uma revisão. E o que havia ocorrido foi uma interpretação errada na tradução da palavra “preview”.
Nas regras, o filme poderia ter feito um “preview” que para eles é apenas como teste para convidados, exibição especial de forma promocional e sem a cobrança de ingressos. Acontece que os representantes da Embrafilme entenderam o “preview” como pré-estreia comum, que foi feita entre setembro e outubro de 1980 apenas no Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, com uma ou duas exibições, contudo, com a cobrança de ingressos.
A Embrafilme tentou justificar esse erro de interpretação dizendo que este “preview” no Brasil era diferente, uma forma de analisar o potencial de bilheteria devido à concorrência de filmes americanos, e que sempre faziam essas poucas exibições em setembro e outubro antes do lançamento oficial em novembro. Porém, o argumento foi rejeitado pela Academia.
Em uma última tentativa, elaboraram um documento onde diziam que as exibições de Pixote de setembro e outubro haviam sido promocionais, contudo, em vão. A campanha foi desmobilizada com a desclassificação do filme, mas muita gente criticou essa atitude, pois Marília Pêra ainda tinha chances de nomeação para atriz mesmo sem a categoria de filme estrangeiro.
Muito se debateu na imprensa os motivos desse erro ter acontecido, sendo o argumento mais plausível o fato das novas regras terem sido implementadas em 1980 e não terem tido uma análise mais cuidadosa. O certo mesmo é que foi assim que a única vez que o Brasil entraria na disputa do Oscar como favorito fracassou devido a um simples erro de interpretação.
Fonte: Dalenogare Críticas – Histórias do Oscar
*Texto produzido em cobertura colaborativa da Cine NINJA – Especial Oscar 2024