Em campanha durante o segundo turno das eleições, Jair Bolsonaro (PL) anunciou que distribuiu 420 mil títulos de terras para assentados da Reforma Agrária. Porém, o próprio Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) anunciou que durante o atual governo foram entregues um total de 370 mil títulos de terras provisórios e definitivos.

Segundo o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra), além de mentir sobre os números de titulações, Bolsonaro esconde que a maioria dos títulos de terra entregues por seu governo são registros provisórios, chamados de Contrato de Concessão de Uso (CCU) – que antecede a titulação definitiva – e são expedidos obrigatoriamente pelo Incra de 5 em 5 anos decorrente de uma atualização das famílias já registradas como beneficiárias da Reforma Agrária de governos anteriores.

“Como se não bastasse o sucateamento das políticas de desconcentração fundiária, o atual governo faz propaganda enganosa de entrega de títulos de terras que em sua maioria são provisórios, sem fazer desapropriações de terras para a Reforma Agrária e sem ter criado novos assentamentos”, informa o MST.

A coordenadora nacional do MST, Kelli Mafort, diz que dos títulos entregues de reforma agrária em todo o país, só 12% são títulos definitivos. O resto é contrato de concessão de uso, obrigação básica do Incra. Assim, dos 370 mil títulos entregues de 2019 até este último mês de setembro de 2022, 326.745 são provisórios, expedidos como Contrato de Concessão de Uso (CCU), o que se refere a 88% da totalidade dos títulos de terra entregues por Bolsonaro.

“Bolsonaro não titula em nenhum assentamento que ele próprio criou. Qual é o assentamento de Reforma Agrária criado no governo Bolsonaro? Zero. Ele não cria assentamento. Todos os títulos são entregues em assentamentos do governo Lula e Dilma”, denuncia.

“Muita gente tem sido enganada, e só descobre isso [que a maior parte dos títulos entregues são provisórios] quando vai ao cartório de registro de imóveis e não consegue averbar o documento que o Incra entrega”, completa a dirigente.

Contra-reforma agrária

Kelli Mafort explica que quando assentadas as famílias podem escolher qual tipo de titulação definitiva será feita. Porém, na gestão federal atual, tem sido estimulado a distribuição dos Títulos de Domínios, muitas vezes até mesmo escondendo que as famílias podem escolher qual categoria de titulação será feita. Tanto é que nos últimos 4 anos menos de 1% dos títulos entregues pelo governo Bolsonaro são Contrato de Direito Real de Uso.

A diferença principal entre ambas categorias de titulação definitiva é que o Título de Domínio concede direito à família assentada mediante pagamento do lote, que pode ser vendido após a quitação do mesmo; já o Contrato de Direito Real de Uso é gratuito e dá direito ao usufruto da terra à família assentada, porém não permite que a terra seja vendida, garantindo o lote enquanto herança as/os filhas/os e herdeiras/os.

A coordenadora do MST alerta que tal iniciativa configura uma das manobras da contra-reforma agrária, com o intuito de avançar na privatização da Reforma Agrária.

“O incentivo aos Títulos de Domínio enquanto facilitador para que as terras possam ser vendidas, aliado ao sucateamento das políticas de Reforma Agrária – deixando as famílias assentadas sem investimentos nos assentamentos – estimula a reconcentração fundiária. Uma vez que sem infraestrutura de um projeto de desenvolvimento rural coletivo, nenhuma família sobrevive no campo, estando cada vez mais passíveis de venderem seus lotes aos fazendeiros vizinhos, ampliando as margens da reconcentração fundiária”, explica.

O MST defende a titulação de Contrato de Direito Real de Uso, pela garantia de que as terras permaneçam nas mãos das famílias assentadas em suscetíveis gerações, evitando assim a especulação imobiliária, ou mesmo o endividamento dessas famílias sobre a quitação do lote – já que se trata de um título gratuito, onde a terra não pode ser vendida enquanto mera mercadoria.